Dinheiro entre as nádegas: o ponto mais baixo a que um homem pode chegar

De ontem para hoje, foram muitas as piadinhas envolvendo o senador Chico Rodrigues (DEM) e uma parte remota da anatomia humana. Só porque, durante uma ação de busca e apreensão, os policiais teriam encontrado dinheiro entre as nádegas (sim, lá mesmo!) do senador de 69 anos. Algumas das notas estariam até sujas, o que torna o episódio todo ainda mais risível e deplorável.

Não sei se são as nuvens baixas, o friozinho ou uma conjunção qualquer de planetas e constelações, mas não consegui ver graça na imagem de um senhor quase septuagenário escondendo dinheiro lá onde não bate o Sol. Só consegui pensar no tamanho da humilhação e na sujeição extrema de uma pessoa como essa ao dinheiro, a ponto de, na correria que imagino ser uma ação de busca e apreensão, não encontrar lugar melhor para esconder um trocado do que o próprio ânus.

Me considero uma pessoa de alguma imaginação e, aqui no mundo real, já tive contato com escroques em maior ou menor grau que vendem até a mãe em troca de uns mirréis a mais no banco. Mas ainda assim tenho dificuldades para fechar os olhos e imaginar um homem, um avô, um senador da República inserindo cédulas no forévis. Quanto ele conseguiria esconder dos policiais com essa tática? E para quê?

Uma questão de espírito
Aliás, há algum tempo escrevi aqui que tenho uma opinião impopular sobre a Operação Lava Jato. Bom, o caso do senador Chico Rodrigues e sua poupança estufada de dinheiro sujo me faz pensar que talvez eu tenha mais de uma opinião impopular sobre a Operação Lava Jato. E, se naquele texto tentei me fazer compreendido nas entrelinhas, aqui não cometerei o mesmo erro de novo e serei mais explícito.

A Operação Lava Jato é louvável em sua tentativa de acabar com a corrupção no Brasil. Afinal, ninguém aguenta trabalhar tanto para pagar tantos impostos e ver tanto dinheiro desviado por tantos bandidos. E é bom saber que existe gente por aí disposta a enfrentar todo um sistema que parece incentivar a corrupção. Tudo muito nobre, lindo, aplausos.

O problema é que os envolvidos nesse grande esforço para eliminar os maus que se aproveitam das muitas rachaduras na caixa-forte do Estado acreditam que a solução para a corrupção está na elaboração de leis e na aplicação de penas duras que supostamente fariam com que o corrupto em potencial pensasse duas vezes antes de surrupiar dinheiro público. Como se o espírito corrompido dessa gente que acredita que o Paraíso é ter uma adega cheia de Romanée-Conti num sítio em Atibaia fosse capaz de se regenerar depois de passar uma temporada na cadeia e de ouvir um sermão cheio de outrossins, latinórios e referências ao Código Penal.

O fato de o senador Chico Rodrigues, depois de todas as espetaculares, quando não espetaculosas, etapas da operação Lava Jato e similares, ter seu nome citado num escândalo de corrupção que envolve recursos destinados à contenção da Covid-19 e se dar ao trabalho de esconder um punhado de reais lá mesmo onde você está pensando, só mostra que o problema da corrupção vai muito, muito, muito além do que nossos códigos e Moros e Deltans são capazes de enfrentar.

A corrupção, ainda mais quando praticada por septuagenários de esfíncter frouxo, é uma degeneração grave e, suponho, incurável do espírito. Uma incapacidade de perceber que a honra vale mais do que um luxozinho qualquer em Roraima. Uma cegueira que impede que se busque a virtude e todas as recompensas de longo prazo, inclusive materiais, que podem ou não acompanhá-la. Um vício no hoje, no agora, na descarga de dopamina de se considerar mais esperto do que os outros.

Chico Rodrigues é motivo de zombaria, quando não de humilhação, por ter tentado (e fracassado, ainda por cima!) esconder algumas centenas de reais no canal retal. E sou capaz de apostar que ele não está nem aí para isso. Porque até à masmorra enlameada da vergonha os corruptos se acostumam. E, infelizmente, não há Moro, Lava Jato ou prisão capazes de mudar isso.

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