Carlos Newton
Houve uma época em que os donos dos jornais conseguiam manter uma linha editorial em seus veículos, e isso acontecia porque eles frequentavam as redações e davam ordens expressas aos jornalistas. Este tempo já se foi. Hoje, os donos só mandam nos editoriais, as redações estão cada dia mais livres. Por isso, não se deve estranhar quando a mesma fake news pode ser repetida em veículos diferentes. O melhor exemplo é a cobertura que se dá ao próximo julgamento da prisão após condenação em segunda instância, no Supremo.
Todos os jornais repetem a mesma fake news, anunciando que o resultado do julgamento pode servir para libertar Lula da Silva, caso o STF decida permitir cumprimento da pena somente após julgamento em terceira instância (Superior Tribunal de Justiça). Mas a notícia não é verdadeira.
TERCEIRA INSTÂNCIA – Essa decisão do Supremo em nada afetará a situação carcerária do ex-presidente, porque, no dia 23 de abril, em decisão unânime, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a prisão de Lula no caso do tríplex, e assim ele passou a ter condenação em terceira instância. Ou seja, não pode mais se beneficiar, caso o Supremo passe a aceitar a tese de que réu tem direito de aguardar em liberdade até a confirmação da pena pelo STJ, em julgamento de recurso especial, o que já aconteceu, no caso de Lula.
É claro que os jornalistas têm conhecimento desse fato, mas continuam propagando a fake news, para animar a galera petista. Na verdade, a maior chance de Lula ser libertado é outra – a progressão da pena para regime semi-aberto, possibilidade aberta pelo próprio STJ, que reduziu para 8 anos e 10 meses a condenação de Lula, que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região fixara em 12 anos e um mês.
HÁ OBSTÁCULOS – Os procuradores da Lava Jato desta vez funcionaram como advogados de defesa de Lula e se apressaram a pedir a progressão para semi-aberto ou até mesmo aberto (liberdade condicional), caso não haja instalações para alojá-lo à noite, quando voltar do suposto trabalho. E é aí que mora o perigo.
Os agora prestativos procuradores se adiantaram em facilitar a soltura de Lula, mas ainda há alguns obstáculos. Um deles é que o regime aberto só pode ser concedido se não houver nenhum lugar para alojar o apenado em São José dos Campos. E não há problemas quanto a isso, é só mandá-lo dormir no regimento da PM.
Outra dificuldade é o pagamento da multa fixada na condenação, cujo valor foi atualizado para R$ 4,9 milhões, em setembro.
FALSAS GARANTIAS – No surpreendente pedido de progressão, os solícitos procuradores da Lava Jato chegaram a afirmar que existiam “garantias” para o pagamento da multa, porém era mais uma fake news. Não havia garantia formalizada e nesta segunda-feira, dia 7, o advogado de Lula, Cristiano Zanin, teve de pedir a suspensão da cobrança da multa e da reparação de danos até o trânsito em julgado da ação – quando não há mais possibilidade de recursos.
A garantia – citada pelo advogado – seria o fato de os bens de Lula estarem bloqueados, mas o procedimento correto seria ele pedir o desbloqueio do valor correspondente e promover o pagamento. Aliás, na execução penal do ex-presidente, essa discussão sobre o depósito do valor cobrado em multa e reparação de danos é até anterior ao pedido de progressão para o regime semiaberto feito pelo Ministério Público Federal (MPF).
Em seu mais recente despacho, a juíza Carolina Lebbos, da 12ª Vara da Justiça Federal, em Curitiba, responsável pela execução penal do ex-presidente, reafirmou que a Justiça tem intimado os condenados ao pagamento de multa, reparação de danos e custas processuais.
P.S. 1 – A situação carcerária de Lula está nessa situação. Depende da decisão da juíza Carolina Lebbos, que vai responder à petição do advogado Zanin. Deve-se notar que a magistrada está favorecendo Lula, porque não levantou o fato de o apenado ser reincidente específico, o que impediria, na forma da lei, que houvesse progressão da pena no momento atual.
P.S. 2 – Mesmo se conseguir superar todos os obstáculos, a libertação de Lula será apenas provisória. O TRF-4 prepara-se para julgar sua apelação no caso do sítio de Atibaia, as provas são mais abundantes do que no caso do tríplex e Lula será condenado novamente. As penas serão somadas e ele voltará ao regime fechado, em Curitiba ou São Bernardo. (C.N.)
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