Prefeitos deixam os cargos por infrações à Lei de Responsabilidade Fiscal e pelo uso da máquina pública em benefício próprio. As ações têm crescido, segundo o MPCE
Nos últimos três anos, o Ceará afastou 25 gestores públicos das administrações municipais. Em oito casos, o Tribunal Regional Eleitoral cassou os mandatos dos titulares e/ou da chapa majoritária. As denúncias, que motivaram as decisões judiciais de afastamento, são da Procuradoria de Justiça dos Crimes contra a Administração Pública (Procap). Em praticamente todos os casos, elas indicam o crime de improbidade administrativa, que é a utilização irregular do dinheiro público.
As informações têm como base relatórios do MPCE e do TRE-CE solicitados pelo Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares. O índice de afastamento foi maior no ano de 2016 – período eleitoral. Na quase totalidade dos casos, gestores infringem regras estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e utilizam a máquina pública em benefício eleitoral próprio na disputa pela reeleição. A contratação de servidores, por exemplo, é uma das irregularidades mais frequentes pelo Interior cearense.
São os casos envolvendo os municípios de Mauriti, Paramoti, Parambu, Santana do Cariri e Cascavel. A aquisição excessiva de funcionários terceirizados, além de infringir o que rege a LRF, causa transtorno ao gestor e prejuízo aos profissionais que deixam de receber os pagamentos, em meio à crise financeira. Foram casos assim que contribuíram no afastamento dos gestores de Canindé e Missão Velha.
Em muitas situações, o prefeito afastado conseguiu voltar ao cargo após recorrer judicialmente. Os casos são julgados na primeira instância e encaminhados para o TRE-CE, mas podem parar ainda no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), caso não haja entendimento local quanto à denúncia.
Exemplo emblemático é o do ex-prefeito de Baturité, João Bosco Pinto Saraiva (Pros), que chegou a ser afastado judicialmente do posto três vezes no mandato passado. A então vice-prefeita do Município, Cristiane Braga, rompida com o titular, assumia a Prefeitura nessas situações.
O Ministério Público Estadual denunciou, à época, indícios de fraudes em licitações, apropriação de bens, desvios de verbas públicas e uso político da administração municipal. A população sentia, na rotina, as consequências da mudança dos gestores em período curto de tempo, com a paralisação de diversos serviços públicos.
Em praticamente todas as cassações firmadas pelo Tribunal, gestores confundiram o cargo público e agiram como se as prefeituras fossem de propriedade particular. O diagnóstico de abuso de poder econômico foi a motivação para as cassações dos gestores de Aracoiaba e Tianguá. Em Tianguá, as contas chegaram a ser rejeitadas. Em Umari, a compra de votos resultou na mudança de gestor.
Investigações
De acordo com a coordenadora da Procap, a procuradora de Justiça Vanja Fontenele, o processo de investigação é iniciado por diversas frentes. “Pode ser por demanda, por observação do portal da transparência e pode ser também através da mídia”, explica.
A provocação ao Ministério Público pode ser feita por qualquer cidadão, e de forma anônima. Fontenele lamenta que o número de afastamentos de gestores tenha ganhado uma curva ascendente nos últimos anos. Enquanto as técnicas de investigação avançam, o modelo de corrupção também ganha novos contornos. “Exemplo disso é uma Prefeitura que criou uma licitação muito genérica às portas da eleição com um contrato para serviços diversos no valor de R$ 10 milhões”, pontuou.
De acordo com a coordenadora, porém, as licitações não são mais fatores de irregularidades, mas sim a execução do serviço. “Vou fazer uma hipótese: tantos quilômetros de estrada estão na licitação para ser construída, sempre é entregue uma quilometragem menor. A execução do serviço não é integral. São acordos feitos antes da licitação. A gente tem que detectar qual é a carta marcada. São sofisticações. Quanto mais sofisticada é a fiscalização, mais sofisticada é a ilicitude”, afirma.
Além das investigações com caráter punitivo, porém, órgãos como a Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) promovem ações de esclarecimento e formação de gestores para o uso do recurso público.
Iniciativas
Nos casos que não têm relação direta com a corrupção, as irregularidades podem surgir por desconhecimento do uso da máquina pública. A diretora executiva do Instituto Plácido Castelo (IPC), da Corte de Contas, Hilária Barreto, explica que “o Tribunal não é apenas um órgão punitivo, é também orientador e pedagógico para melhor os gestores exercerem as suas funções”.
O presidente da Aprece, Nilson Diniz, lamenta o alto índice de irregularidades e pontua que a entidade tem trabalhado para mostrar outros caminhos de administração pública. “A gente lamenta e tem procurado trabalhar mostrando o caminho que é possível dentro das gestões públicas”, diz. Diniz argumenta que um dos maiores problemas nas administrações é a pouca capacitação dos servidores.
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