O traficante recebeu a sentença, da qual ainda pode recorrer, nesta quarta-feira (17) em um tribunal em Nova York. Ex-chefe da maior organização de tráfico de drogas do mundo, Joaquín ‘Chapo’ Guzmán estava preso desde 2016.
O traficante de drogas mexicano Joaquín “Chapo” Guzmán, conhecido como “El Chapo”, foi sentenciado nesta quarta-feira (17) à prisão perpétua, por um tribunal federal em Nova York, nos Estados Unidos. Ele deverá recorrer da sentença, segundo informou seu advogado.
Além da prisão perpétua, Chapo, um dos fundadores do cartel de Sinaloa, considerado o maior do mundo, foi sentenciado a mais 30 anos de prisão por porte de armas de fogo e a entregar US$ 12,6 bilhões (R$ 47,4 bilhões), disseram os procuradores.
O traficante tinha sido preso em 2016 e extraditado do México para os Estados Unidos em 2017. Desde então, ele ficou praticamente isolado do mundo exterior, em prisão solitária, por ter um histórico de fugas de cadeias mexicanas.
A sentença dada nesta quarta-feira ocorre cinco meses após o júri popular que, em fevereiro deste ano, considerou o traficante culpado por dez acusações feitas pelos procuradores norte-americanos (leia mais abaixo).
“É justiça não só para o governo mexicano, mas para todas as vítimas de Guzmán [Chapo] no México”, disse Raymond P. Donovan, agente encarregado do escritório de Nova York da Administração de Repressão às Drogas, que teve papel fundamental em duas prisões do traficante, segundo o “The New York Times”.
Momentos antes de a sentença ser anunciada, El Chapo falou, por meio de um tradutor, sobre os dois anos e meio que passou em uma prisão americana. Ele não havia se pronunciado durante o júri de fevereiro.
“Foi uma tortura mental, emocional e psicológica 24 horas por dia”, declarou nesta quarta. Ele afirmou ter sido submetido a tratamento “cruel e desumano” , segundo a agência de notícia Reuters.
Chapo também declarou que um julgamento justo lhe tinha sido negado.
Penitenciária de segurança máxima
A expectativa, segundo a imprensa americana, é de que o traficante cumpra a sentença na Instalação Máxima Administrativa Penitenciária dos Estados Unidos, no Colorado, que é conhecida como ADX, a mais restritiva no país. Ninguém conseguiu escapar de lá desde que foi inaugurada, em 1994.
Se ficar preso na ADX, conhecida como a “Alcatraz dos Estados Montanhosos”, El Chapo estará no mesmo lugar que o “Unabomber” e autores de diversos atentados, como o 11 de setembro e o da maratona de Boston, em 2013.
Os presos desta penitenciária ficam confinados cerca de 23 horas por dia em celas solitárias, cada uma com uma janela estreita de cerca de 107 centímetros de altura e anguladas para cima, de modo que apenas o céu é visível.
Os prisioneiros não podem se movimentar sem serem escoltados, e contagens de cabeça são feitas pelo menos seis vezes por dia.
Tráfico para os EUA por 25 anos
Em fevereiro, quando o júri declarou El Chapo culpado, uma das dez acusações às quais ele respondia era traficar ou tentar traficar mais de 1.250 toneladas de drogas aos Estados Unidos, principalmente cocaína.
À época do julgamento, ele também foi condenado por conspiração — para lavagem de dinheiro e tráfico de drogas —, uso de armas de fogo e por liderar empreendimento criminoso. Esta última condenação inclui 26 violações relacionadas a drogas e uma conspiração para assassinato.
Restava, no entanto, que fosse anunciada a duração da sentença.
As provas do processo contra ele, coletadas desde a década de 80, mostraram que, sob suas ordens, o cartel de Sinaloa contrabandeou drogas para os EUA durante os 25 anos em que Chapo esteve ativo.
Além disso, afirmaram os procuradores, seu “exército de sicários” — termo usado em cartéis latino-americanos para matadores de aluguel — tinha ordens de ordens de sequestrar, torturar e assassinar qualquer um que ficasse em seu caminho.
Nesta quarta, antes do anúncio da sentença, uma ex-sócia do traficante descreveu como ele pagou US$ 1 milhão (R$ 3,76 milhões) a uma gangue para que ela fosse executada.
26 pessoas ou grupos mortos por Chapo
O julgamento de fevereiro durou 11 semanas, e a identidade dos jurados foi mantida em segredo. A acusação se baseou, principalmente, em depoimentos de testemunhas. Os jurados ouviram 200 horas de declarações de 56 testemunhas, incluindo 14 testemunhas cooperantes, em sua maioria traficantes e sócios no cartel de Sinaloa.
Um ex-matador de Chapo, Isaías “Memín” Valdez Ríos, garantiu que viu o próprio chefe torturar e executar três traficantes rivais. Um deles foi enterrado vivo depois de ser baleado pelo líder criminoso, outros dois foram espancados a pauladas antes de serem executados e lançados numa fogueira.
A procuradoria garante que el Chapo mandou matar ou torturou e assassinou com as próprias mãos pelo menos 26 pessoas ou grupos de pessoas.
Túnel para levar drogas e subornos
Segundo as provas obtidas pelos procuradores, Chapo levava as drogas para os EUA através de túneis ou escondidas em caminhões-tanque, na parte inferior de carros ou embaladas em vagões de trem que passavam por pontos de entrada legítimos. Além de cocaína, o mexicano também levava heroína, metanfetamina e maconha para os EUA.
Dois ex-sócios do Chapo contaram como subornaram com milhões de dólares em dinheiro funcionários do alto escalão do governo mexicano para encontrar rivais, expandir o negócio e fugir das autoridades, bem como da polícia judiciária, federal e municipal, militares e até da Interpol.
Uma testemunha disse, inclusive, que El Chapo pagou US$ 100 milhões de propina ao ex-presidente do México Penã Nieto. Segundo outro depoimento, o narcotraficante drogava e estuprava meninas de 13 anos.
Durante o julgamento, a argumentação da defesa durou apenas meia hora, quando os advogados afirmaram que as testemunhas eram apenas mentirosos tentando reduzir as próprias sentenças. O próprio Chapo não argumentou em defesa própria.
Negócio aos 15 anos
Joaquín Archivaldo Guzmán Loera nasceu em 4 de abril de 1957 em uma família humilde em La Tuna, pequeno povoado rural de Badiraguato, no pobre e violento estado mexicano de Sinaloa. O apelido “El Chapo” significa “o baixinho”, em português.
Em um encontro clandestino em outubro de 2015, ele contou ao ator americano Sean Penn (veja vídeo abaixo) que, quando criança, vendia laranjas, refrigerantes e doces para ajudar sua família, que era “muito pobre”.
Aos 15 anos, ele cultivava e vendia maconha e papoula, um negócio que florescia em seu povoado agrícola. Adolescente, El Chapo foi recrutado pelo chefe do cartel de Guadalajara, Miguel Angel Félix Gallardo. Quando Gallardo foi preso, em 1989, Chapo fundou com três sócios o cartel de Sinaloa, que cresceu de forma meteórica até se tornar o maior do mundo.
Com o passar do tempo, o mexicano se tornou o traficante de drogas mais procurado do mundo, acusado de enviar entorpecentes da América Latina para Estados Unidos, Europa e Ásia.
Lista de bilionários da Forbes
Até 2013, a revista “Forbes” o colocava em sua famosa lista de bilionários, estimando sua fortuna em US$ 1 bilhão (cerca de R$ 3,76 bilhões). Ele permaneceu no ranking por vários anos seguidos.
Embora o estado de Sinaloa tenha criado uma imagem de Robin Hood para o traficante, atribuindo a ele muitas obras sociais para a população local, El Chapo era considerado impiedoso com rivais e traidores.
Mesmo com a queda de Chapo, o cartel de Sinaloa tinha, no ano passado, a maior distribuição nos Estados Unidos, de acordo com o órgão de repressão às drogas americano.
Prisões e fugas
A partir de 1993, a situação começou a se complicar e, em junho daquele ano, El Chapo foi detido pela primeira vez, na Guatemala, e levado para uma prisão mexicana.
Ele fugiu oito anos depois, em 2001, dentro de um carrinho de roupa suja. Passou a viver de esconderijo em esconderijo nas montanhas de Sinaloa, protegido por um exército privado.
Voltou a ser preso em fevereiro de 2014, quando estava com sua esposa e filhas em Mazatlán, Sinaloa. Mas, 14 meses depois, fugiu novamente, desta vez por um túnel de 1,5 km cavado sob o ralo do chuveiro de sua cela.
As autoridades dizem que sua queda pela atriz mexicana Kate del Castillo, com quem trocou mensagens sugestivas e que conseguiu o encontro entre El Chapo e Penn, levou à sua localização e prisão final em janeiro de 2016, até a sua extradição aos Estados Unidos um ano depois.
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