Aviões do Forró: Disputa milionária no forró

Aviões do Forró (Foto: Divulgação)

Briga por patrimônio da banda está na Justiça. Solange Almeida pede R$ 5 milhões após ter sido “expulsa” do grupo

Juras de amizade eterna, declarações de amores e promessas de reencontros entre Solange Almeida e Xand Avião marcaram a despedida da cantora para 15 mil fãs em Luís Correia, no Piauí. Era março de 2017 e o último compromisso da vocalista no dueto que fez a banda prosperar nos negócios do forró eletrônico. Mas nem tudo era festa e sinceridade no palco daquele Carnaval. A multidão, presente na maior parte dos shows durante os 14 anos de existência da dupla até então, mal sabia que nos bastidores um conflito de interesses rebentaria numa peleja judicial em 2019. Na disputa, o patrimônio milionário acumulado pela banda Aviões do Forró. Em fevereiro deste ano, Solange Almeida reclamou na Justiça R$ 5 milhões dos ex-sócios. E, enquanto o levantamento de bens não é feito, o pagamento mensal de R$ 100 mil.

“Todo mundo acha que tudo foi um mar de rosa. Nunca foi um mar de rosas. A gente não tinha nada e a gente dividia nada”, brincava ou ironizava Solange Almeida em sua derradeira apresentação no palco sobre a empresa que em 11 anos havia rendido para os cinco sócios da Aviões do Forró Gravações e Edições Musicais Ltda a venda de pelo menos três milhões de CDs, a abertura de mais de uma dezena de outros negócios, imóveis, estúdios de gravação, rádios, ônibus, carros de luxo e uma fortuna em dinheiro que chamou atenção da Receita e Polícia Federal (PF).

Em outubro de 2016, a Operação For All surpreendeu os forrozeiros mais prósperos do Brasil. Auditores e policiais investigavam a sonegação de mais de R$ 500 milhões em impostos federais, somente entre os anos de 2012 a 2014. Cifra vultuosa que, segundo a delegada Doraliça Oliveira Souza, teria deixado de ser declarada pela A3 Entretenimentos – empresa que administra a Aviões do Forró e mais 25 empreendimentos do grupo. Os principais alvos do fisco, na ocasião, eram os empresários Isaías Duarte (Isaías CDs), Carlinhos Aristides, Francisco Cláudio de Lima e a dupla José Alexandre da Silva (Xand Avião) e Solange Almeida.

Do total de tributos sonegados, R$ 121 milhões seriam referentes apenas às bandas. Aviões e Solteirões do Forró, por exemplo. O esquema, segundo relatório da Receita e da PF, consistia na manipulação do valor declarado nos cachês dos artistas. Eles informavam oficialmente cerca de 20% do valor sobre o qual incidiam os impostos. Em média, R$ 30 mil eram depositados em conta bancária. Porém, os outros 80% (cerca de R$ 120 mil) eram pagos em dinheiro, instantes antes de as bandas subirem aos palcos.

De acordo com uma fonte, a saída de Solange Almeida estaria também ligada a revelações da Operação For All sobre a dinheirama movimentada, supostamente, sem o conhecimento da sócia. A cantora, mesmo sendo dona de 25% das cotas da sociedade, receberia menos do que teria direito. Como era responsável pela produção artística da banda, ela não se interessaria pela parte contábil da sociedade nem tinha alguém que auditasse e organizasse as receitas e as despesas dela. As buscas, apreensões, bloqueios de bens e o recolhimento de R$ 830 mil dos cofres dos sócios teriam alertado para algo desequilibrado entre os parceiros.

Os advogados da vocalista, Livelton Lopes e Olga Muniz, descrevem em uma ação que tramita desde fevereiro deste ano na 3ª Vara Cível de Fortaleza, que a For All “atingiu profundamente a honra (de Solange) tendo em vista que foi alvo de uma operação policial que apurava uma sonegação fiscal ao qual não deu causa, já que nunca foi administradora da empresa. Infortúnio que também foi utilizado como instrumento de “convencimento” pelos demais sócios para que deixasse a sociedade”.

Antes da For All, no entanto, o desentendimento entre Solange e os empresários já vinha se desenhando. A origem do conflito estaria em 2015, quando a principal voz da banda foi convidada para gravar fora do grupo Aviões uma versão de uma música de Jani e Herondy e outra de Tim Maia. Dali em diante, segundo a cantora em vídeos enviados ao O POVO, a relação teria azedado.

Em setembro de 2016, de acordo com a ação judicial e declarações de Solange, “os sócios Carlinhos Aristides e Isaias CDs, sem qualquer justificativa, comunicaram à cantora que a banda não tinha mais interesse em sua permanência. A vocalista “só era bem-vinda até o término do carnaval de 2017, o que de fato se concretizou”.

A sócia poderia ter se insurgido contra a “decisão tomada unilateralmente pelos administradores da empresa”, disseram os advogados. Uma vez que detinha 25% do capital social, mas não o fez “por ter medo de que a discordância trouxesse ainda mais prejuízo do que os já suportados”.

Prejuízos, descreve a ação judicial, que não eram apenas de ordem material, mas também moral. “Inúmeras foram as situações em que Solange Almeida teve que quedar silente para não se ver expurgada da banda. Situações delicadíssimas como a enfrentada com um funcionário e com um dos sócios, sendo certo de que as providências legais serão tomadas”, descreve a ação sem especificar o ocorrido.

No mês passado, o juiz Fabiano Damasceno Maia negou pedidos feitos pela defesa da cantora. Entre as reivindicações, bloqueio de contas e proibição da venda de qualquer imóvel ou marca da empresa (veja quadro). O processo segue em andamento na 3ª Vara Cível de Fortaleza.

No último dia 7/6, o advogado Livelton Lopes enviou nota ao O POVO informando que “antes de ingressar com processo judicial, Solange Almeida tentou de todas as maneiras resolver as questões existentes com seus ex-sócios através do diálogo. Ocorre que, passados mais de dois anos de sua saída da banda, a mesma não encontrou reciprocidade nas tratativas amistosas que fez” para a divisão de bens.

O único objetivo da ação judicial, afirma o advogado, “é a de ver reconhecidos os direitos da artista e que até agora não foram pagos pelos administradores da empresa e demais sócios que permaneceram” na Aviões do Forró.

Dívida inicial da banda Aviões do Forró com a Receita Federal é de R$ 14 milhões
Após a deflagração da Operação For All, em outubro de 2016, os sócios da A3 Entretenimento – empresa que administra os negócios Aviões do Forró Gravações e Edições Musicais Ltda – foram obrigados pela Receita Federal a pagar, inicialmente, R$ 14.018.820,65 de impostos sonegados durante anos.

Até agora, Isaías Duarte, Carlinhos Aristides, Xand Avião e Cláudio Melo (ex-sócio) pagaram R$ 2.111.184,92. Segundo escreveram os advogados da banda Aviões do Forró na contestação judicial, parte dessa obrigação, mais precisamente 25%, compete à Solange Almeida que ainda fazia parte da sociedade na época da batida do fisco e da Polícia Federal nas empresas ligadas à banda Aviões do Forró.

“Frise-se, mais, que a sociedade se encontra, ainda, em processo de fiscalização por parte da Receita Federal, pendente de autuação, independentemente da consolidação do refinanciamento fiscal, estando sujeito a resultados tributários ainda mais impactantes”, relataram os advogados Carlos Efrem, Rubens Martins e Davi Aragão na ação que está tramitando na 3ª Vara Cível de Fortaleza.

Segundo os advogados, o processo de Haveres (divisão de patrimônio) deve levar em conta também as obrigações tributárias de cada. Na ação judicial, Isaías CD contesta a afirmação da ex-sócia de que receberia desproporcional às suas cotas (25%). Somente entre os anos de 2012 a 2017, a então vocalista da banda teria recebido R$ R$ 10.012.856,86.

Ex-sócios cobram mais de R$ 17 milhões da cantora Solange Almeida
A versão sobre a saída de Solange Almeida da banda Aviões do Forró soa em outros tons para Isaías Duarte. De acordo com Isaías CD, como é conhecido no cotidiano dos negócios da música no Brasil, a ex-sócia teria uma dívida com o grupo de R$ 17.414.587,06. A cobrança da quantia milionária está no documento de contestação feito pelo administrador da empresa Aviões do Forró Gravações e Edições Musicais Ltda no processo que corre da 3ª Vara Cível de Fortaleza.

A dívida, de acordo com os argumentos de Isaías, seria resultado de uma cadeia de prejuízos que se avolumaram com a saída “abrupta” da cantora da banda. Segundo relatos do ex-sócio na Justiça, ainda no início do ano de 2015, o meio musical foi invadido pelo “sertanejo feminino”. Um movimento encabeçado por nomes como Marília Mendonça, Mayara e Maraísa, Simone e Simaria e que teria motivado a Solange Almeida decidir por uma carreira solo.

Na época, segundo Isaías CD, para tentar segurar a vocalista na banda, os sócios concordaram em aumentar de 15% para 25% as cotas de Solange na sociedade. “Não satisfeita, ao final do mês de setembro de 2016, a demandante avisou que estava em negociação com um empresário em São Paulo. Ele se propunha a investir na gravação de um CD e um DVD em caráter “solo”. E, mesmo tendo sido abonada com 10% do capital social, insistia em abandonar a banda Aviões do Forró de modo absolutamente abrupto, comprometendo, gravemente, todo o planejamento societário”.

Após nova conversa entre os sócios, teria ficado acordado que Solange só deixaria a sociedade após os festejos do São João de 2017 por causa de uma agenda lotada da Aviões do Forró. No entanto, depois da deflagração da Operação For All (18/10/2016), a vocalista teria antecipado a saída para depois do Carnaval de 2017. “Simplesmente ignorando os inúmeros eventos que já haviam sido contratados entre a empresa e os tomadores dos serviços (shows), entes públicos e privados”. O que teria forçado a revisão de vários contratos com perdas.

De acordo com Isaías CD, antes da “batida em retirada” de Solange Almeida, a banda Aviões do Forró realizava em média 26 shows por mês. Porém, o número teria caído para 16 “afetando mortalmente o cronograma artístico e financeiro” do grupo. Além disso, a ex-sócia teria “cooptado 70% dos músicos deixando para trás a banda”.

Investigação sobre lavagem de dinheiro e sonegação estão em andamento
Atualmente, os sócios da A3 Entretenimento estão sendo investigados “exclusivamente em relação aos crimes de lavagem de dinheiro (em razão de ocultação de patrimônio) e sonegação fiscal”. A informação é do procurador da República Rômulo Conrado, do Núcleo Criminal do Ministério Público Federal no Ceará.

Em entrevista ao O POVO, Rômulo Conrado afirmou que “não foram encontradas quaisquer evidências ou indícios mínimos do cometimento de delitos como tráfico de drogas ou homicídios”. Denúncia que circulou na Internet há duas semanas e que incluía também o suposto crime de estupro contra Solange Almeida.

A apuração sobre supostos crimes de tráfico de drogas e homicídios foi motivada por uma denúncia de uma pessoa que teria sido ligada à banda Aviões do Forró. “As investigações ganharam reforço a partir de busca e apreensão de documentos. Nada tendo sido colhido que apontasse para os crimes inicialmente reportados, além daqueles aos quais me referi acima”, afirmou o procurador.

Quanto a situação fiscal da A3 Entretenimento, Rômulo Conrado explica que “não houve exatamente pagamento do que deviam, mas sim o parcelamento de débitos e a retificação de declarações anteriormente prestadas, contemplando novos valores omitidos ao Fisco”.

O POVO entrou em contato com todos os atuais sócios da banda Aviões do Forró e com Solange Almeida. Enviou perguntas para cada um dos envolvidos na ação judicial. Além de fazer contatos, também, com advogados das pessoas citadas aqui. Até o fechamento desta edição não houve retorno.

Polícia
O POVO fez contato com a Polícia Federal no Ceará para saber do inquérito sobre lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. Em nota, a Comunicação Social disse que o órgão não fala sobre casos em andamento.

Confira matéria do site O Povo.

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