A segunda maior economia mundial sofreu prejuízos e ainda deve viver nos próximos anos os impactos negativos da política Covid Zero, imposta pelo ditador chinês, Xi Jinping. Há mais de dois anos, a China cerca bairros e até cidades inteiras quando surtos de Covid-19 são detectados.
Os confinamentos exagerados prejudicaram diretamente a economia de 45 grandes cidades chinesas, entre elas Xangai. Trezentos e setenta e três milhões de habitantes foram impactados, o que equivale a um quarto da população do país e 40% do PIB nacional, segundo a holding financeira japonesa Nomura.
Como consequência, o crescimento da economia chinesa deve cair para 3% em 2022, conforme preveem as pesquisas do americano Rhodium Group. Em 2019, o percentual era de 6%. “Aumentaram os riscos, a complexidade e a incerteza sobre o desenvolvimento econômico da China”, publicou o grupo em uma nota.
Um estudo publicado pelo banco francês Natixis apresenta a estimativa de que, no terceiro trimestre deste ano, o crescimento da economia chinesa seja próximo de zero. A causa, segundo o banco, são as medidas restritivas diante da pandemia. E a tendência é que a desaceleração continue, porque a Covid Zero foi anunciada pela ditadura chinesa como uma política que deve perdurar até 2027.
Impactos negativos na indústria e no setor imobiliário
Nos longos períodos de lockdown, conforme anunciou o Escritório nacional de estatísticas, dezenas de empresas precisaram reduzir ou parar a produção. “O funcionamento delas foi fortemente prejudicado”, apontou o analista-chefe da organização, Zhao Qinghe, no comunicado.
Em abril, o valor agregado na indústria caiu 2,9% em um ano. O varejo teve queda de 11% e as vendas de automóveis tiveram impacto negativo de 47%.
Já o setor imobiliário, que pesa em mais de um quarto do crescimento do PIB do país, é um dos maiores problemas enfrentados hoje pela economia chinesa. Segundo o E-House, Instituto de Pesquisa e desenvolvimento da China, as vendas caíram 52% nos primeiros meses de 2022, em comparação com o ano passado.
A crise levou ao risco de falência do gigante imobiliário chinês, Evergrande, em 2021. Vinte e cinco anos após a fundação, a vida financeira da empresa começou a ruir em 2020 com a redução do acesso ao crédito. Hoje, a dívida é de 300 bilhões de dólares.
Depois de alguns embates entre a ditadura chinesa e a grande empresa, as autoridades de Pequim decidiram interferir na reestruturação dessa dívida, para evitar maiores impactos financeiros e sociais no país.
Fuga de capital
A China alcançou a maior fuga de capital da última década no começo deste ano segundo o Instituto Internacional de Finanças (IIF), registrando a desconfiança dos investidores diante do posicionamento chinês nas políticas anti-Covid e em relação à guerra na Ucrânia, devido à afinidade com a Rússia.
Mais da metade dos membros da Câmara de Comércio da União Europeia na China chamaram o momento chinês de “veneno da incerteza”. Segundo o periódico internacional Bloomberg, cerca de 180 multinacionais declararam que consideram que os confinamentos em Xangai terão impacto negativo em seus resultados.
“A partir de agora, a China é vista sobretudo como um risco pelos ocidentais e o confinamento está provocando novos debates nas empresas”, analisou em maio a diretora do programa Ásia think tank do Conselho Europeu de Relações Exteriores, Janka Oertel, ao Le Monde.
Impactos gerados pela testagem excessiva
Além do fechamento do comércio e do afastamento de profissionais, a Covid Zero exige um alto investimento do país. É custoso colocar em prática a política de detecção precoce da doença na China. Conforme a norma nacional, todos os habitantes precisam ter um posto de testes disponível a até, no máximo, 15 minutos a pé. Nos pequenos quiosques de testagem, há pelo menos quatro profissionais.
As cidades chinesas precisam disponibilizar para esse serviço 30% dos funcionários da saúde pública e normalmente é necessário contratar outros profissionais para a força-tarefa. O orçamento para realizar essas testagens frequentes costuma passar do limite destinado para a área de saúde.
A plataforma chinesa Sixth Tone fez um cálculo de quanto custa ao país a estrutura para a testagem da população das 45 maiores cidades. O resultado foi 12 bilhões de dólares por ano. A conta não inclui os custos de laboratório (que não são divulgados pelas autoridades), apenas as contratações de funcionários, os materiais e a montagem dos quiosques.
Fronteiras fechadas
Para dar conta de tamanho controle da doença, desde 2020, 98% dos voos para o país foram cancelados e não há previsão de reabertura antes de 2024. No ano passado, a Autoridade Nacional de Imigração registrou o equivalente a 4,6% das entradas e saídas de estrangeiros que circularam pelo país em 2019.
Os poucos que têm permissão para entrar ou voltar à China passam por pelo menos duas semanas de quarentena restrita, que pode ser estendida para um mês pelas autoridades locais, com possível condição de observação domiciliar.
Tradicionalmente, os imigrantes já representavam uma parcela muito pequena da população em 2019 (0,01%, conforme a ONU). Segundo a Câmara de Comércio da União Europeia na China, a quantidade de estrangeiros caiu pela metade em 2021 e tende a cair mais uma vez este ano devido às fortes restrições anti-Covid.
Apesar de grande parte das relações comerciais acontecerem de forma virtual, o fechamento das fronteiras compromete o fluxo de negócios, de trocas acadêmicas e experiências turísticas, deixando o país, literalmente, cada vez mais fechado.
É só o começo
A promessa – depois censurada pelo próprio Partido Comunista Chinês – de que as medidas da Covid Zero vão durar mais cinco anos aponta para o fato de que a China seguirá com as portas fechadas. A ditadura chinesa também não deve se preocupar, nos próximos anos, em reconquistar a confiança de empresas estrangeiras ou evitar maiores perdas para as nacionais.
Mesmo diante dos números preocupantes que sinalizam a desaceleração econômica, o ditador chinês, Xi Jinping, declarou no mês passado que a estratégia de controle da Covid “resistirá ao tempo”. “Devemos lutar contra os discursos e os atos que deformam, questionam ou rejeitam as diretivas e a política de nosso país”, acrescentou.
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