O procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI), Karim Khan, deu início na sexta-feira (29) a uma visita à Venezuela, onde o seu escritório abriu um exame preliminar em 2018, por supostos crimes contra a humanidade cometidos por forças da ditadura chavista. O procurador deve decidir se inicia uma investigação sobre esses crimes.
Nas vésperas da visita, o regime do ditador Nicolás Maduro procurou melhorar a sua imagem, com reformas em leis de direitos humanos e “maquiando” a situação de um presídio militar, em tentativa de evitar o seguimento do processo no tribunal de Haia.
O giro de Khan pela América do Sul começou pela Colômbia, onde o procurador anunciou, ao lado do presidente Iván Duque na quinta-feira, o encerramento do caso aberto em 2004 sobre supostos crimes de guerra e de lesa humanidade cometidos durante o conflito armado no país sul-americano, que envolveu o Exército colombiano, a extinta guerrilha das Farc e grupos paramilitares.
Até a quarta-feira (4), o procurador terá reuniões com autoridades, poder judicial, diplomatas, representantes da sociedade civil e organizações não governamentais na Venezuela. Vítimas e familiares também esperam ser ouvidos. Durante a sua visita, Khan deve avaliar se o Estado venezuelano está disposto a cooperar com as investigações e se o seu sistema de justiça é capaz de julgar os crimes.VEJA TAMBÉM:
Maduro tenta “maquiar” situação no país
Desde que começou a circular a notícia de uma possível visita do procurador do TPI, a ditadura de Nicolás Maduro tem tentado melhorar a sua imagem, libertando alguns presos políticos, fazendo reformas judiciais e tentando melhorar a aparência de um presídio militar.
A Venezuela tem atualmente 254 presos políticos, segundo o balanço mais recente da ONG Foro Penal. Na semana passada, dois ativistas da ONG Fundaredes, acusados de “traição à pátria”, foram libertados. No entanto, o diretor da ONG, Javie Tarrazona, continua detido.VEJA TAMBÉM:
O chavismo se apressou em realizar ações para “maquiar” a situação de um cárcere para militares no estado de Miranda, segundo reportagem do Infobae.
Vários presos foram retirados do presídio de Ramo Verde, que fica a poucos quilômetros da capital Caracas, e os presos que permaneceram receberam sapatos e barbeadores, para ficarem “apresentáveis”.
Segundo o Infobae, que ouviu parentes dos militares detidos no presídio, os presos foram surpreendidos com a chegada de tintas, pincéis e outros instrumentos para dar ao local uma aparência muito diferente do que o que se vê há anos. Além disso, os presos mais “problemáticos” foram transferidos a outras penitenciárias.
Antes da visita, o Instituto Casla enviou ao procurador uma extensa carta em que detalha os 10 centros de detenção e tortura que ele deveria visitar para comprovar os crimes da ditadura chavista.
A Assembleia Nacional, de maioria chavista, aprovou na quinta-feira duas leis sobre direitos humanos na Venezuela. O plenário sancionou a reforma da “Lei para o Respeito dos Direitos Humanos no Exercício da Função Pública” e aprovou em primeira discussão a “Lei para a Atenção Integral e Reparação de Vítimas de Direitos Humanos”, que prevê um fundo para reparação a vítimas.VEJA TAMBÉM:
Quais são as acusações ao regime de Maduro
Em agosto passado, a procuradoria-geral do TPI tornou público o documento que afirma que os supostos crimes contra a humanidade do regime chavista deveriam ser investigados.
As acusações de uso excessivo das forças, detenções arbitrárias, execuções extrajudiciais, tortura, violência sexual e perseguição estão relacionadas a casos ocorridos durante protestos populares em 2017. A repressão do regime aos protestos da oposição deixaram pelo menos 125 mortos entre abril e julho daquele ano.
“A procuradora concluiu que as informações disponíveis proporcionam uma base razoável para crer que, desde pelo menos abril de 2017, autoridades civis, membros das forças armadas e indivíduos pró-governo cometeram crimes contra a humanidade de encarceramento ou outras severas privações de liberdade física em violação às normas fundamentais do direito internacional”, relata o informe redigido em junho sobre o exame preliminar que Fatou Bensouda, procuradora da Corte até junho passado, deixou ao seu sucessor, Karim Khan.
Entre os delitos cometidos pelas forças da ditadura de Maduro, o informe cita casos de tortura, violência sexual e perseguição por motivos políticos.
O relatório cita como responsáveis por esses supostos crimes a Polícia Nacional Bolivariana (PNB); o Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin); a Direção Geral de Contrainteligência Militar (DGCIM); as Forças de Ações Especiais (Faes); o Corpo de Investigações Científicas, Penais e Criminalísticas (CICPC); a Guarda Nacional Bolivariana (GNB); o Comando Nacional Antiextorsão e Sequestro (Conas); e outras unidades da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB).
Com o relatório, Bensouda deixou nas mãos do seu sucessor a decisão de definir se há motivos suficientes para avançar o caso da Venezuela para a próxima fase, de investigação, que pode envolver Maduro, alguns de seus ministros e membros das forças de segurança.
O regime nega todas as acusações.
O pedido de investigação sobre os crimes contra a humanidade cometidos pelo regime de Maduro foi enviado em 2018 ao tribunal de Haia por seis países: Argentina, Chile, Colômbia, Peru, Paraguai e Canadá. Em maio deste ano, a Argentina, sob o governo de Alberto Fernández, retirou o apoio ao processo contra a Venezuela no TPI, no momento em que o país deixou o Grupo de Lima (formado por países da América que buscam uma saída para a crise da Venezuela).
O Tribunal Penal Internacional, que tem sede em Haia, nos Países Baixos, é uma corte de “última instância” para o julgamento de crimes de genocídio, de guerra e contra a humanidade. A corte investiga indivíduos acusados desses crimes (e não Estados). Após a etapa de exames preliminares e de investigação, os casos avaliados pelo TPI passam pelas fases de pré-julgamento e, por fim, julgamento. Posteriormente, ocorrem as apelações e o cumprimento das sentenças decididas pelos juízes.
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