Juiz considerou “inacreditável” o religamento do aparelho. De acordo com ele, o equipamento fere a preservação de um meio ambiente urbano saudável
O enorme painel publicitário irregular instalado no Setor Bancário Sul terá que ser desligado imediatamente, sob pena de multa de até R$ 500 milhões. A determinação é da Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário, que deferiu liminar a pedido do Ministério Público do DF. Na decisão, o juiz Carlos Frederico Maroja de Medeiros destacou que os valores da penalidade podem aumentar ainda mais, “caso se revelem insuficientes para estimular a ré a respeitar o Judiciário”.
O imbróglio começou em junho do ano passado, quando o equipamento de 253 metros quadrados foi retirado da fachada do prédio por determinação do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. A empresa Metrópoles Mídia e Comunicação, do ex-senador Luiz Estevão, recorreu e, em fevereiro deste ano, a 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) acatou parcialmente um recurso do grupo empresarial. A Justiça determinou a devolução das peças eletrônicas, que estavam sob poder do governo. A decisão, entretanto, negou um pedido de religamento do engenho publicitário.
“Não há amparo legal para analisar o conteúdo a ser disposto no painel no presente recurso, sob pena de supressão de jurisdição da instância a quo”, frisou o desembargador Silva Lemos. Os magistrados da 5ª Turma entenderam que caberá à Vara do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano do DF determinar o que pode ser veiculado no painel luminoso, no âmbito de uma ação judicial ainda em tramitação. Há cerca de duas semanas, entretanto, o aparelho publicitário foi religado. Na última sexta-feira, o Ministério Público do Distrito Federal entrou com um agravo de instrumento, pedindo à Justiça o desligamento do engenho.
“Engodo”
No mesmo dia, o juiz concedeu liminar determinando a interrupção de propaganda no local. Na decisão, Maroja criticou duramente a atitude da empresa Metrópoles Mídia de religar o painel, em contrariedade a uma decisão judicial. “O funcionamento desconforme do painel luminoso discutido implica poluição visual e ofensa à integridade visual da cidade tombada como Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, o que não pode ser admitido sequer provisoriamente”.
O magistrado classificou como “inacreditável” a atitude da empresa de religar o painel em contrariedade a decisões anteriores e indicou que houve “ato temerário e malicioso”, além de “manipulação do Judiciário” na atitude do grupo empresarial do ex-senador Luiz Estevão. O aparelho publicitário foi religado na mesma semana em que o empresário deixou a cadeia para cumprir a pena em regime semiaberto.
O juiz Carlos Maroja indicou que há risco de “lesão irreparável à integridade urbanística e ambiental de Brasília, já ocorrente pelo inacreditável religamento do painel, a despeito de qualquer autorização administrativa ou judicial”. No começo de 2018, o grupo empresarial obteve licenciamento junto à Administração de Brasília para instalar a estrutura, desde que o painel exibisse apenas os nomes do edifício e dos órgãos nele instalados, como determina o Plano Diretor de Publicidade de Brasília. Mas a empresa descumpriu as regras e passou a exibir propaganda na empena do prédio.
Ao conceder a liminar determinando o desligamento do painel, o juiz Carlos Maroja indicou ter havido no caso “litigância de má-fé”. “A propósito, a conduta da empresa ré afigura-se, em princípio, ato temerário e malicioso, posto que se aproveitou de uma decisão que simplesmente previu a manutenção das placas luminosas até a resolução das lides discutindo a legalidade do ato fiscalizatório, numa conduta que revela engodo e manipulação do Judiciário”.
Poluição
O magistrado refutou a argumentação da empresa de que o desligamento do painel de publicidade representaria um cerceamento à liberdade de expressão. “Não se pode admitir que, em nome da liberdade de expressão, o direito difuso a uma cidade organizada e livre da poluição visual seja agredido. Nenhum direito é absoluto. Na ponderação entre o interesse de informar e o de preservação de um meio ambiente urbano saudável, este prevalece, posto que é interesse difuso e essencial à manutenção da qualidade de vida de todos os cidadãos, mormente quando se sabe que há inúmeros outros meios adequados, legítimos e sustentáveis para a veiculação de informações”, afirmou Carlos Maroja.
Outro aspecto da questão foi destacado pelo magistrado: a concorrência desleal com outras empresas do ramo que agem de acordo com a lei. “A permissão para a permanência de veiculação da publicidade aparentemente desconforme pela empresa ré não beneficia outras empresas congêneres, ou seja, a permissão para a permanência do painel implica privilégio e concorrência desleal, situações repudiadas pela ordem jurídica”.
A reportagem não localizou ontem o advogado Marcelo Bessa, que representa a empresa Metrópoles e Estevão. Na semana passada, ele afirmou não haver “nenhuma irregularidade no painel”.
O magistrado classificou o religamento da estrutura como “inacreditável”. Há duas semanas, o painel voltou a exibir propaganda, contrariando decisões judiciais e administrativas que proibiram a veiculação. A legislação urbanística veda expressamente qualquer tipo de publicidade no local.
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