País deve ter maior crescimento do PIB em 11 anos com retomada desigual entre os setores

CONSTRUÇÃO CIVIL - OBRAS PREDIOS - EDIFICIO

A economia brasileira deve ter, em 2021, o maior crescimento dos últimos onze anos. A projeção do relatório Focus, uma pesquisa feita semanalmente pelo Banco Central junto a instituições financeiras, sinaliza para uma alta próxima de 5,2% no Produto Interno Bruto (PIB).

Mas esse avanço não deve ser homogêneo, principalmente na indústria, por causa dos efeitos da crise da Covid-19. Assim, alguns segmentos exibem crescimento exuberante e ajudam a impulsionar o PIB, enquanto outras áreas ainda estão em retração – caso de algumas atividades industriais e também do setor de serviços, mais prejudicados pela pandemia.

“Foi, ao mesmo tempo, um choque de oferta e de demanda”, diz o economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso.

Uma série de fatores contribui para o bom desempenho da economia brasileira neste ano. Ela surpreende desde o primeiro trimestre, quando o PIB cresceu 1,2% na comparação com os três últimos meses de 2020.

É verdade que o crescimento ocorre sobre uma base de comparação muito fraca: em 2020, o PIB encolheu 4,1%, no pior desempenho desde 1990. Mesmo assim, a expansão de 2021 vai além do que era esperado meses atrás.

A diretora de macroeconomia da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro, aponta algumas razões para o avanço do primeiro trimestre:

  • a boa demanda externa, que favoreceu o segmento de commodities agropecuárias e minerais;
  • a maior mobilidade das pessoas nos primeiros meses do ano;
  • a adaptação das empresas e das famílias à nova realidade; e
  • a não confirmação dos temores em relação à falta do auxílio emergencial no primeiro trimestre.

“Ela [a falta do auxílio emergencial no início do ano] foi compensada, em parte, pela poupança que foi feita nos meses anteriores e pelo aumento de gastos da população de maior renda.”

Mas o cenário do crescimento econômico deve sofrer uma transformação neste segundo semestre. Depois de a indústria ser o carro-chefe na primeira metade do ano, a tendência é de que, com o avanço da vacinação contra a Covid-19, esse posto passe a ser ocupado pelos serviços, que respondem por cerca de 60% da economia brasileira.

“Estamos assistindo a um crescimento que deveria ter acontecido lá atrás, se não fosse a pandemia”, explica Lisandra Barbero, economista do banco Original.

Quem está crescendo

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos cinco primeiros meses do ano a indústria acumula um crescimento de 13,1% no comparativo com o mesmo período de 2020, quando começaram a ser sentidos mais fortemente os impactos da pandemia. “A demanda nacional e internacional segue aquecida”, destaca Lisandra.

Nos acumulado de 12 meses até maio, o setor acumula um crescimento de 4,9% em relação a igual período anterior. O destaque são segmentos ligados à construção civil, itens de uso doméstico e às máquinas e equipamentos.

A fabricação de cimento teve uma expansão de 20,2%; a de tubos e acessórios de material plástico para uso na construção, 24,5%; e a de tintas, vernizes, esmaltes e lacas, 18,1%. Do lado dos itens de uso doméstico, houve um crescimento de 29,9% na fabricação de eletrodomésticos. A produção de máquinas e equipamentos de uso geral, por sua vez, apresentou um incremento de 17,0%, ao passo que a de tratores, máquinas e equipamentos para a agropecuária subiu 34,7%.

As vendas de equipamentos para o campo foram favorecidas pelo crescimento do agronegócio, que teve uma expansão de 5,35% no primeiro trimestre em comparação ao mesmo período de 2020, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-Esalq/USP) e da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA).

A desvalorização do real frente ao dólar, que ganhou força ao longo do ano passado e no primeiro trimestre, pressionou a inflação, mas pode ter dado uma “ajudinha” ao segmento de máquinas e equipamentos e ao de insumos industriais.

“O aumento nos custos para trazer esses itens de fora favoreceu uma substituição de importações”, explica a diretora e macroeconomia da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro.

Fernando Ribeiro Leite, professor do Insper, destaca um dos reflexos positivos dessa conjuntura: a recuperação da taxa de investimento da economia. No ano passado, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que mede os gastos com máquinas, equipamentos e construção, correspondeu a 16,43% do PIB. Foi o maior índice em cinco ano, e o terceiro crescimento seguido.

“As companhias estão aproveitando esta oportunidade. Imóveis também estão mais em conta e as empresas mais baratas, o que favorece fusões e aquisições”, diz Leite.

Quem está encolhendo

Apesar da recuperação robusta esperada para a economia neste ano, ainda há segmentos em baixa.

A produção de artigos do vestuário e acessórios, por exemplo, caiu 1,4%. “Esta situação está relacionada às restrições de mobilidade e ao incremento no home office, que demandou menos esses itens”, explica Alessandra Ribeiro, da Tendências. Eles foram afetados também pela retração no emprego e na renda dos trabalhadores.

Outro segmento que ainda recua é o automotivo. A fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias caiu 2,5% nos 12 meses encerrados em maio, comparativamente a igual período anterior, aponta o IBGE. “A perda da confiança do consumidor, por causa da pandemia, também impactou negativamente este setor”, afirma Leite.

Um dos fatores que impedem uma aceleração na produção é o desarranjo na cadeia de suprimentos de microchips, que pode causar perdas de US$ 100 bilhões a essa indústria no mundo todo, de acordo com a KPMG.

Os serviços apresentam uma retração de 5,4% nos 12 meses encerrados em abril, puxados pelos serviços prestados às famílias, que tiveram um encolhimento de 34,3%, por causa da menor mobilidade das pessoas e das restrições estabelecidas pelas autoridades sanitárias. “Muitas famílias substituíram o consumo de serviços pelo de bens”, complementa Lisandra, do Original.

Perspectivas para o crescimento em 2022

As perspectivas para os próximos meses e para 2022 são de um crescimento menor – o ponto médio das projeções do Relatório Focus, do BC, sinaliza para 2,1% – e mais homogêneo entre as diferentes atividades econômicas.

Segundo Alessandra Ribeiro, da Tendências, com o avanço na vacinação vai haver uma reação no setor de serviços. Este também deve ser beneficiado por uma acomodação na demanda por bens. “Este setor [serviços] vem de dois anos difíceis e já vem esboçando uma reação”, complementa Lisandra Barbero, do Original.

crise hídrica também deve funcionar como um limitador ao crescimento nos próximos meses, por causa do aumento nos gastos com energia, motivado pelo acionamento das termelétricas. A diretora da Tendências destaca que a produção tende a ficar mais cara.

Outros gargalos que também devem pressionar o crescimento, segundo Lisandra, são a lenta recuperação do mercado de trabalho – apesar da criação de 1,2 milhão de postos de trabalho formais nos cinco primeiros meses do ano, o desemprego ainda é de 14,7% – e as incertezas e fragilidades na cadeia global de suprimentos.

“Neste cenário, o comércio e a indústria devem sentir a retirada dos estímulos monetários e fiscais. O auxílio emergencial não deve se sustentar”, diz a economista do Original.

Leite, do Insper, também lembra que, no próximo ano, haverá eleições. “Em um cenário bastante polarizado, a política é um elemento forte no ambiente econômico. Isto contribui para travar investimentos e contribuir para que os investimentos percam ritmo.”

Esta é a primeira reportagem da série “O Brasil que cresce”, que apresenta alguns dos setores que mais avançam no país. Acompanhe a série neste link.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

Be the first to comment on "País deve ter maior crescimento do PIB em 11 anos com retomada desigual entre os setores"

Leave a comment

Your email address will not be published.


*