A privatização da Eletrobrás e os jabutis

Os senadores, com razão, não quiseram votar a privatização da Eletrobrás na quarta-feira, sem conhecer em detalhes o parecer do relator Marcos Rogério (DEM-RO), que só foi protocolado no fim da tarde. O presidente da casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), concordou em seguir com as discussões e deixar a votação para esta quinta-feira. A questão, no entanto, não se resume apenas a votar ou não a MP, que caduca na próxima semana, mas como conseguir que a privatização ocorra da melhor maneira possível.

Na Câmara, o relator Elmar Nascimento (DEM-BA) incluiu no texto original da medida provisória uma série de itens que não constavam da proposta do governo. Foi o caso, por exemplo, da obrigação de contratação de usinas termelétricas a gás nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, além de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs); de compensações oferecidas a funcionários e ex-funcionários da Eletrobrás; do engessamento dos lucros da Itaipu; e de uma série de subsídios. Os acréscimos, considerados “jabutis” por não terem relação direta com a privatização, foram tantos que mesmo defensores da redução do tamanho do Estado, como os deputados do Partido Novo, votaram contra o parecer de Nascimento na tentativa de derrubá-lo e conseguir que a Câmara votasse o texto original da MP. No entanto, eles acabaram derrotados: o texto passou com 313 votos e o apoio da base aliada do governo.

Os jabutis têm tudo para permanecer, infelizmente, deixando os senadores que defendem a tão necessária privatização da Eletrobrás diante de um dilema difícil de resolver

Para a frustração dos senadores que discursaram ao longo da tarde de quarta – ainda sem conhecer o parecer de Marcos Rogério, portanto – e defenderam a privatização ao mesmo tempo em que criticaram as inclusões indevidas, o relator manteve os acréscimos vindos da Câmara. Todas as emendas que pretendiam eliminar os jabutis foram rejeitadas, e o texto ainda recebeu novidades, como a obrigatoriedade de a União aproveitar funcionários da Eletrobrás demitidos nos primeiros 12 meses após a privatização.

Apesar dos apelos de alguns senadores contrários ao texto – seja por convicções estatistas, seja por discordar dos jabutis –, Pacheco não demonstrou intenção nenhuma de deixar a MP caducar. E, mesmo que os senadores consigam derrubar no plenário alguns dos acréscimos de Nascimento, o relator na Câmara já deixou claro que eles serão restabelecidos assim que o texto voltar às mãos dos deputados. Neste cenário, em que os jabutis têm tudo para permanecer, de uma forma ou de outra, os senadores que defendem essa tão necessária privatização ficam diante de um dilema difícil de resolver.

Derrubar a MP significará devolver todo o processo à estaca zero, recolocando as esperanças de privatização em um projeto de lei apresentado em 2019 e que está parado. Aprová-la significa aceitar as inclusões, até porque não existe nenhum indício de que o presidente Jair Bolsonaro vetaria os itens que tanto desagradaram os parlamentares liberais. Aqui, entra em jogo um cálculo nada simples, pois as estimativas de custos e benefícios variam enormemente. Em seu relatório, Marcos Rogério repete informação do Ministério de Minas e Energia e alega que a privatização reduzirá as tarifas de energia elétrica em algo entre 5,1% e 7,365%. No entanto, outras estimativas apontam para uma elevação da tarifa e indicam que os jabutis custarão até R$ 41 bilhões ao consumidor “cativo” (residências, indústrias e comércio que não têm como escolher o fornecedor), um aumento de 10% em relação ao que se paga hoje pela energia. Este valor equivale a cerca de dois terços do que seria arrecadado com a emissão de ações, e seria maior que os recursos destinados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo que tem o objetivo de baratear as contas de energia. Neste caso, é evidente que os custos não compensariam os benefícios da privatização. Sem mais tempo para aprofundamento das discussões, caberá aos senadores analisar em poucas horas os argumentos de ambos os lados e tomar a melhor decisão.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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