A soltura de André do Rap — como é conhecido o criminoso André Oliveira Macedo — é uma vitória para o PCC (Primeiro Comando da Capital), a maior facção criminosa do país. Ele é, hoje, o principal responsável da organização pelo tráfico internacional de cocaína para Europa, a partir do porto de Santos. Sua posição central dentro da facção, os recursos financeiros que movimenta e as relações que ele mantém em outros países tornam a recaptura do traficante uma missão difícil, explica ao UOL o promotor do Ministério Público de São Paulo Lincoln Gakiya, que investiga a organização desde 2005.
“Ele em liberdade é um ganho muito grande para a organização. Mesmo que não esteja em São Paulo, mesmo que esteja em países vizinhos. Ele tem outros comparsas em liberdade que têm posição de cumprir as ordens dele”, comenta Gakiya.
“Quando o indivíduo não tem capacidade financeira, é muito difícil ficar muito tempo escondido. Mas um acusado do porte do André do Rap, a condição para recapturá-lo é muito difícil. Ele tem conexões dentro da facção e inclusive em outros países, já morou na Europa, ficou cinco anos foragido. Ele dispõe de muito dinheiro”.
No sábado de manhã (10), o traficante deixou a penitenciária de Presidente Venceslau pela porta da frente. Ele foi beneficiado por uma decisão liminar do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello, que entendeu que sua detenção era ilegal com base no no artigo 316 do pacote anticrime (Lei 13.964), aprovado em dezembro do ano passado pelo Congresso. O texto diz que prisões preventivas devem revisadas a cada 90 dias.
Horas depois, o presidente da corte, Luiz Fux, suspendeu a liminar de Marco Aurélio e determinou a volta de André do Rap à prisão. Quando isso aconteceu, ele já estava fora do país, segundo investigadores afirmaram ao colunista do UOL Josmar Jozino.
Nesta segunda (12), o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), disse que o traficante está no Paraguai ou na Bolívia. “Não tenho [informações sobre isso] e acredito que ninguém tenha. São suposições. É normal que esses indivíduos fujam para um desses dois países, onde tem uma maior quantidade de integrantes [da facção] em liberdade para dar apoio a eles”, diz Gakiya.
Recaptura difícil
Localizar o traficante será ainda mais complicado se ele estiver na Bolívia. “O relacionamento da Bolívia com o Brasil, em termos de cooperação, é precário. A gente vê com muita preocupação, a captura dele é realmente muito difícil”, ressalta o promotor.
Lincoln Gakiya não é o promotor responsável pelos processos que levaram ao pedido de prisão de André do Rap. As ações, por tráfico internacional são de competência do Ministério Público Federal.
“Posso falar do André do Rap como quem investiga o PCC e promotor de execução criminal da penitenciária 2 de Presidente Venceslau, onde ele estava”, diz.Promotor Lincoln Gakiya investiga narcotraficantes ligados ao PCC desde 2005Imagem: Arquivo Pessoal
De dentro da prisão, a dificuldade do traficante para coordenar os negócios da facção era maior. As visitas estavam suspensas por conta da pandemia e os contatos de André com as ruas estavam restritos aos advogados e a correspondências.
Ao determinar a liberação de André do Rap, o ministro Marco Aurélio afirmou que caberia à Polícia Civil ou ao Ministério Público solicitar a reavaliação da prisão preventiva. Em entrevista à GloboNews no domingo (11), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), adotou discurso semelhante —- disse que o Ministério Público deveria ter explicado por que precisava manter a precisão preventiva.
“Da mesma forma que o ministro Marco Aurélio fez interpretação meramente literal da lei, talvez o Rodrigo Maia desconhecesse detalhes do processo. Ele [André] já foi denunciado e julgado, inclusive em segunda instância. O último julgamento dele ocorreu em julho de 2020, foi mantida a prisão de 10 anos de reclusão. A partir desse momento, o desembargador relator reviu a possibilidade e a necessidade da preventiva”, diz Gakiya.
O promotor diz que o artigo do pacote anticrime, em que o ministro Marco Aurélio se baseou, “sequer prevê a manifestação do Ministério Público”.
“Que se libertem todos os presos provisórios que não têm decisão tramitada em julgado e não tiveram prisão reavaliada. É um precedente muito perigoso”, afirma.
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