Ataques à Lava Jato e decisões pró-Bolsonaro: como foi o 1º ano de Augusto Aras na PGR

O procurador-geral da República, Augusto Aras, completa na sexta-feira (2) um ano no cargo — metade do mandato para o qual foi nomeado. Nesse período, o PGR se destacou pela atuação cautelosa em torno de questões envolvendo o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados e pelos ataques à Lava Jato. Aras também pressiona o Conselho Superior do Ministério Público Federal (MPF) para a centralização das grandes investigações de casos de corrupção em Brasília.

Aras é visto com desconfiança dentro do Ministério Público Federal (MPF). Entre os principais motivos para isso está a forma pela qual foi escolhido para o cargo. Embora a indicação seja uma prerrogativa do presidente da República, tradicionalmente a escolha era feita com base em uma lista tríplice elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

Neste caso, porém, Bolsonaro ignorou a lista tríplice elaborada pela categoria ao escolher Augusto Aras. Na posse do novo PGR, no ano passado, Bolsonaro desejou que ele “interfira onde tem que interferir”, aumentando ainda mais a desconfiança em torno do novo procurador-geral.

“Peço a Deus que, neste momento, ilumine o doutor Aras, que ele tome boas decisões, interfira onde tem que interferir e colabore, também, como sei que é da da tradição dele, a um bom andamento das políticas de interesse do nosso querido Brasil. Todos nós ganhamos com essa indicação”, afirmou o presidente.

Veja abaixo um balanço da atuação de Aras em diferentes frentes na PGR:

Embate com a Lava Jato

O que mais chama a atenção no primeiro ano de mandato de Aras são os ataques da PGR à Lava Jato, principalmente à força-tarefa de Curitiba. O cerco à operação ficou mais claro a partir do final de junho deste ano, com a visita da subprocuradora Lindôra Araújo, aliada de Aras, ao grupo do Paraná, mas os sinais de desgaste com a operação já estavam presentes desde o início do ano.

Em janeiro, o subprocurador José Adônis Callou de Araújo Sá, coordenador do grupo da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República, pediu demissão do cargo por causa de divergências com a gestão do procurador-geral Augusto Aras. Adônis estaria descontente com a falta de autonomia e com interferências de Aras, que estariam mantendo lento o ritmo das investigações.

Em junho, os procuradores Hebert Reis Mesquita, Luana Vargas de Macedo e Victor Riccely, que atuavam na Lava Jato na PGR também pediram demissão. Com isso, o grupo da Lava Jato que investiga políticos com foro no Supremo Tribunal Federal (STF) ficou sem nenhum integrante além da coordenadora Lindôra Araújo, principal aliada de Aras na PGR.

A saída coincidiu com a visita de Lindôra à força-tarefa da Lava Jato no Paraná, em busca de dados sigilosos das investigações. O caso foi parar na Corregedoria Nacional do Ministério Público Federal. O grupo de Curitiba questiona a tentativa de obtenção do banco de dados das investigações pela PGR sem um objeto definido.

Há um temor por parte dos procuradores de que as informações pudessem ser usadas politicamente para favorecer o presidente Jair Bolsonaro. Os procuradores ressaltam que Lindôra é a procuradora “mais bolsonarista” da PGR, além de ter um vínculo próximo com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho de Jair Bolsonaro.

A PGR cutucou a Lava Jato em notas distribuídas à imprensa. “A Lava Jato, com êxitos obtidos e reconhecidos pela sociedade, não é um órgão autônomo e distinto do Ministério Público Federal (MPF), mas sim uma frente de investigação que deve obedecer a todos os princípios e normas internos da instituição”, disse a PGR em meio à disputa pelo banco de dados das investigações.

“Para ser órgão legalmente atuante, seria preciso integrar a estrutura e organização institucional estabelecidas na Lei Complementar 75 de 1993. Fora disso, a atuação passa para a ilegalidade, porque clandestina, torna-se perigoso instrumento de aparelhamento, com riscos ao dever de impessoalidade, e, assim, alheia aos controles e fiscalizações inerentes ao Estado de Direito e à República, com seus sistemas de freios e contrapesos”, completou.

A ofensiva pelos bancos de dados das forças-tarefas também foi parar no STF. O ministro Dias Toffoli chegou a conceder uma liminar, durante o recesso judiciário, para que os dados fossem compartilhados, mas a decisão foi revista por Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte.

Na ocasião, ao mencionar a batalha judicial pelas informações, Aras chegou a dizer que a Lava Jato é uma “caixa de segredos” e que é preciso uma “correção de rumos” no MPF para que o “lavajatismo não perdure”.

Os desgastes entre a PGR e procuradores do MPF também levaram à uma debandada de integrantes de forças-tarefas da Lava Jato e da Greenfield, no início de setembro.

Além disso, o Conselho Nacional do  Ministério Público (CNMP), que é presidido por Aras, tem imposto uma série de derrotas à Lava Jato, com a punição aos procuradores da força-tarefa de Curitiba.

Aras quer centralizar investigações de corrupção

Em setembro, o prazo para funcionamento da Lava Jato em Curitiba venceu, mas a PGR decidiu renovar a autorização para que a força-tarefa possa funcionar somente até 31 de janeiro de 2021. A prorrogação, porém, veio com uma “pegadinha” que pode levar à punição de integrantes do grupo ao não lotar os procuradores em Curitiba.

Ao prorrogar a atuação da força-tarefa, a PGR fez uma série de críticas ao modelo de investigações e voltou a cobrar do Conselho Superior do MPF a institucionalização do combate à corrupção no país.

O uso de forças-tarefas para investigações complexas tem sido alvo de críticas da PGR. Em manifestação assinada no final de junho, o vice-PGR, Humberto Jacques Medeiros, afirmou que o modelo está esgotado, é desagregador e incompatível com a instituição.

Com isso, as forças-tarefas da Lava Jato em São Paulo e da Greenfield, em Brasília, já vinham sofrendo baixas desde o início do ano.

Nos bastidores, a interpretação é de que Aras tenta pressionar o Conselho Superior do MPF a criar a Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Unac). A unidade centralizaria em Brasília as principais investigações de corrupção no país, inclusive as conduzidas pelas forças-tarefas da Lava Jato em São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, e da Greenfield.

A interpretação dos procuradores que fazem parte desses grupos é de que a PGR atua politicamente para que o nome da Lava Jato não seja carregado para as próximas eleições, em 2022. Isso porque um dos possíveis candidatos à presidência é o ex-juiz da operação Sergio Moro, ex-ministro da Justiça que rompeu com Bolsonaro acusando o presidente de tentar interferir politicamente na Polícia Federal.

O anteprojeto da criação da Unac prevê que a unidade será coordenada por uma pessoa escolhida por Aras. Os procuradores ouvidos pela Gazeta do Povo sobre o assunto destacam que esse não é o modelo ideal, embora a ideia de criação de um órgão para institucionalizar o combate à corrupção não seja ruim.

Investigação de governadores

A PGR, sob comando de Aras, acelerou as investigações contra governadores. Estão na mira das investigações os chefes do Executivo do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC); do Pará, Helder Barbalho (MDB); do Amazonas, Wilson Lima (PSC); de São Paulo, João Doria (PSDB), entre outros. O pedido para investigação dos governadores se baseia em suspeitas de irregularidades em compras emergenciais realizadas no enfrentamento à pandemia de coronavírus.

No início de setembro, após uma decisão que afastou Witzel do cargo, Aras defendeu a medida perante o STF. No parecer, Aras classifica o afastamento (determinado por decisão monocrática e confirmada pela Corte Especial do STJ) como “imprescindível” para a continuidade das investigações.

Há uma percepção entre procuradores do MPF de que a força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro só não vai sofrer uma asfixia parecida com a dos outros estados enquanto tiver Witzel entre seus principais investigados. Ele é um dos principais adversários políticos de Bolsonaro.

Ex-integrante da Lava Jato em Curitiba, o procurador aposentado Carlos Lima resumiu a percepção entre os procuradores do MPF que integram as forças-tarefas de combate à corrupção no Brasil.

“Num momento em que vemos as diversas ações contra diversos governadores, não estou dizendo corretas ou incorretas, mas ações extremamente rápidas… Eu conheço investigações há mais de 30 anos e pouquíssimas vezes eu vi investigações tão rápidas atingir poderosos de uma maneira tão significativa como agora”, disse em entrevista à Gazeta do Povo.

Aras quer ter controle de delações premiadas

Ainda no âmbito do controle das investigações do MPF, recentemente, Aras sugeriu ao STF que altere as regras que permitem à Polícia Federal (PF) negociar acordos de colaboração premiada. Segundo a proposta de Aras, delações só poderiam ser homologadas com a concordância do Ministério Público Federal (MPF). Na prática, isso limitaria a autonomia da PF, que até poderia negociar o acordo, mas ficaria submetida à decisão final do MPF.

A possibilidade de a PF fechar delações com investigados, sem participação do Ministério Público, foi motivo de controvérsia entre as duas instituições até que, em 2018, o Supremo decidiu autorizar os acordos firmados pela polícia.

Mas a sugestão de Aras, passados apenas dois anos dessa decisão do STF, levantou suspeitas mesmo entre procuradores que são contra as delações fechadas pela PF, que desconfiam do timing da proposta do PGR.

Em fevereiro, Aras já tinha questionado no STF a homologação da delação premiada do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral (MDB). Para a PGR, Cabral não apresentou fatos novos e se comprometeu a devolver valores que estão bloqueados pela Justiça.

Aras ficou de fora de cooperação sobre acordos de leniência

Em agosto, STF, governo federal e Tribunal de Contas da União (TCU) assinaram um termo de cooperação técnica que altera as regras para negociação dos acordos de leniência – uma espécie de delação premiada para empresas envolvidas em casos de corrupção. O conjunto de novas regras para esse tipo de acordo tira o Ministério Público Federal (MPF) das negociações.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, que inicialmente era favorável ao termo, não compareceu à solenidade. Aras decidiu não participar do acordo de cooperação técnica com os outros órgãos por enquanto, por discordâncias internas no MPF em relação ao texto.

Aras pediu inquérito para apurar interferência na PF

Em abril, quando o ex-ministro Sergio Moro anunciou sua saída do governo, Aras pediu ao STF a abertura de um inquérito para apurar as acusações de que Bolsonaro teria tentado interferir politicamente na PF. Ele pediu, inclusive, que Moro fosse ouvido durante as investigações.

Em entrevista à revista Veja, Moro disse ver um caráter intimidatório na abertura do inquérito. “Entendi que a requisição de abertura desse inquérito que me aponta como possível responsável por calúnia e denunciação caluniosa foi intimidatória. Dito isso, quero afirmar que estou à disposição das autoridades”, disse. Aras negou intimidação e afirmou que seu dever é “averiguar os fatos” em busca da verdade.

Depois do depoimento de Moro, Aras também pediu que a PF ouvisse ministros, delegados e outros citados pelo ex-ministro em seu depoimento.

Ao se manifestar sobre a possibilidade de divulgação do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, Aras defendeu que apenas trechos referentes ao inquérito fossem tornados públicos. O PGR também se posicionou contra a apreensão do celular do presidente Jair Bolsonaro e de seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) no inquérito.

Ao se manifestar sobre o depoimento do presidente no âmbito das investigações, Aras indicou três possibilidades: que Bolsonaro decida pelo direito constitucional do silêncio; que responda às questões a serem formuladas por escrito (conforme precedente já existente no STF, quando da oitiva do ex-presidente Michel Temer) ou a possibilidade de o próprio Jair Bolsonaro indicar data e local para ser ouvido presencialmente pela autoridade policial.

Mudança de ideia sobre inquérito das fake news

Em outubro do ano passado, Aras se manifestou favorável ao inquérito das fake news, instaurado pelo STF. O PGR defendeu que o inquérito é “atuação legítima do Supremo”. Em maio deste ano, porém, no mesmo dia em que a Polícia Federal (PF) cumpriu 29 mandados de busca e apreensão em endereços de aliados e simpatizantes de Bolsonaro, Aras pediu ao ministro do STF, Edson Fachin, que suspendesse o inquérito.

Apesar disso, Aras negou ter mudado de posição sobre o inquérito. Em nota, ele afirmou que “não houve mudança do posicionamento anteriormente adotado no inquérito”, mas que foi adotada “medida processual para a preservação da licitude da prova a ser produzida.”

O PGR também defendeu o desbloqueio da conta do empresário bolsonarista Otávio Fakhoury, investigado no inquérito das fake news do STF. Em manifestação apresentada em junho, o PGR disse que a medida era desproporcional e não tinha utilidade”.

Inquérito dos atos antidemocráticos foi aberto a pedido de Aras

Em abril, a PGR pediu a abertura de um inquérito no STF para apurar “fatos em tese delituosos envolvendo a organização de atos contra o regime da democracia participativa brasileira”. O relator do caso é o ministro Alexandre de Moraes.

Em maio, após o presidente discursar em uma manifestação em frente ao quartel-general do Exército em Brasília, Aras afirmou que a fala isolada de Bolsonaro no ato não pode ser considerada antidemocrática. A manifestação tinha pedidos de intervenção militar e de instauração de um novo AI-5, uma das medidas mais duras da ditadura.

“Se colocássemos as declarações que Bolsonaro fez naquele evento numa folha de papel de um editorial elas não teriam impacto que possam ser tomadas como antidemocráticas”, afirmou Aras. “A presença dele (na manifestação), sim, pode merecer especulação, mas nós avaliamos isso e por isso optamos por identificar organizadores do evento, já que a fala do presidente isoladamente não tem conteúdo atentatório contra instituições ou que possa se caracterizar como antidemocrático.”

Em junho, a PF cumpriu 21 mandados de busca e apreensão no âmbito do inquérito As diligências foram solicitadas pela PGR e autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes. A ação foi batizada de Operação Lume e mira empresários, blogueiros e até um deputado federal que apoiam o presidente Jair Bolsonaro.

Papel das Forças Armadas

Em junho, Aras afirmou que, no seu entendimento, as Forças Armadas podem ser usadas em ações pontuais, como garantir a lei e a ordem num eventual cenário de ruptura institucional. A posição do procurador está alinhada à do presidente Jair Bolsonaro, que vinha citando o artigo 142 da Constituição como uma saída para a crise do governo com o Supremo.

“Os poderes são harmônicos e independentes entre si. Cada um deles há de praticar a autocontenção para que não se venha a contribuir para uma crise institucional. Conflitos entre Poderes constituídos, associados a uma calamidade pública e a outros fatores sociais concomitantes, podem culminar em desordem social. As Forças Armadas existem para a defesa da pátria, para a garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de quaisquer destes, para a garantia da lei e da ordem, a fim de preservar o regime da democracia participativa brasileira”, escreveu Aras.

Ele disse ainda que a Constituição “não admite intervenção militar” e afirmou que as instituições estão “funcionando normalmente” no país.

Sinais trocados de Aras em investigação envolvendo Bolsonaro

Aras opinou contra a abertura de um inquérito para apurar suposta interferência do presidente Jair Bolsonaro junto ao antigo advogado da família, Frederick Wassef, em acordo envolvendo a concessionária Aeroportos Brasil Viracopos. O PGR apontou que não foram apresentados indícios suficientes de prática ilícita. O caso está sob relatoria do ministro Ricardo Lewandowski no STF. A ação foi movida pelo advogado Carlos Eduardo Silva Duarte após o portal O Antagonista divulgar, em junho passado, que Wassef havia sido contratado pela concessionária do aeroporto de Viracopos para “prestação de consultorias jurídicas e estratégicas”.

À época, a concessionária havia fechado acordo de relicitação do terminal em Campinas (SP) e Wassef teria se reunido com Bolsonaro horas antes de o presidente se encontrar com representantes da empresa. Segundo o proponente da ação, Wassef “teria apenas servido como preposto do presidente na defesa dos interesses privados da concessionária”.

Aras, no entanto, apontou que não foram apresentados elementos suficientes para embasar a abertura de um inquérito. “Na eventualidade de surgirem indícios suficientes de uma possível prática ilícita pelos ora representados, será providenciada a instauração de inquérito perante esse Supremo Tribunal Federal, com adoção, a partir de então, das medidas cabíveis”, afirmou.

No dia seguinte, a PGR abriu uma averiguação preliminar para investigar indícios de que Bolsonaro manteve um esquema de rachadinha em seu gabinete quando ele era deputado federal.

No pedido de abertura de inquérito, cujo relator é o ministro Luís Roberto Barroso, o procurador-geral da República disse que “na eventualidade de surgirem indícios suficientes de uma possível prática ilícita pelo representado serão adotadas as medidas cabíveis junto a essa Corte suprema”. Apesar disso, o procurador-geral da República afirma que não pode instaurar inquérito contra o presidente da República alegando, com base no artigo 86 da Constituição, que o chefe do Poder Executivo não pode ser “não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”.

Em novembro do ano passado, o PGR se posicionou contra a abertura de inquérito no STF para apurar se o presidente Jair Bolsonaro e o vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) cometeram crime de obstrução de Justiça no âmbito das investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes.

Carlos e o presidente tiveram acesso aos áudios da portaria do condomínio onde moram gravados no dia do crime. No local, também reside um dos acusados pelos assassinatos, Ronnie Lessa.

Investigações envolvendo Flávio Bolsonaro

Aras pediu ao STF a rejeição de uma ação da Rede Sustentabilidade que contesta o foro concedido ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) nas investigações de suposto esquema de “rachadinhas”. A apuração mira o gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Estado do Rio, quando o filho do presidente da República era deputado estadual.

No documento, Aras aponta questões técnicas e processuais para pedir o arquivamento da ação. “Para a análise de casos concretos e a revisão de decisões que se entenda contrárias ao ordenamento legal ou constitucional — ou à orientação do STF que sobre estes prevaleça —, existem as vias apropriadas, recursais ou não, que não podem se fazer substituir pela ADI (ação direta de inconstitucionalidade”, escreveu Aras.

Em novembro do ano passado, Aras pediu ao STF a derrubada da liminar concedida pelo ministro Dias Toffoli que afetou a investigação de Flávio Bolsonaro no caso Queiroz. O PGR argumentou que limitar o compartilhamento de dados sigilosos do antigo Coaf com o Ministério Público e a polícia pode “comprometer tanto a reputação internacional do Brasil quanto sua atuação nos principais mercados financeiros globais”. Aras criticou a inclusão do Coaf na questão, enquanto os dados se tratavam da Receita Federal.

O que Aras tem feito sobre a pandemia de coronavírus

Em abril, Aras encaminhou manifestação a ministros do Supremo Tribunal Federal na qual defendeu a liminar do ministro Alexandre de Moraes que proibia o presidente Jair Bolsonaro de derrubar medidas de governadores e prefeitos sobre isolamento social.

Em julho, Aras recomendou que que integrantes do MP se abstenham de fazer contestações judiciais de políticas públicas em casos para os quais não haja consenso científico durante a pandemia. A Associação Nacional de Procuradores da República e a Associação Nacional de Procuradores do Trabalho buscaram o STF. À Corte, argumentam que a recomendação viola a independência do Ministério Público pois interfere na atuação dos procuradores. Em defesa da recomendação, Augusto Aras afirmou ao Supremo que deve-se respeitar o exercício da discricionariedade do gestor público.

Um dia depois, Aras enviou recomendação ao ministro da Economia, Paulo Guedes, com propostas para dar mais transparência ao recursos federais destinados ao combate à Covid-19.

Aras e a atuação de Bolsonaro durante a pandemia

Bolsonaro é alvo de uma notícia-crime impetrada por um advogado no STF que busca imputar ao presidente o crime de genocídio. O pedido de abertura de inquérito está nas mãos da ministra Carmén Lúcia.

Aras se manifestou contra o pedido de abertura de inquérito. Em manifestação apresentada ao STF, o PGR classificou como naturais as divergências de opinião entre os vários atores envolvidos no processo de elaboração de uma política sanitária de combate à uma doença nova, como foi o coronavírus.

“Em meio à pandemia de Covid-19, os dissensos a respeito dessa doença contagiosa são muitos e permeiam, inclusive, a comunidade científica. Autoridades em matéria sanitária divergem sobre várias questões, tais como eficácia do isolamento social, imunidade coletiva (ou ‘de rebanho’), contágio, risco individual, diagnóstico, terapêutica, etc”, descreveu o procurador-geral da República. “Nesse cenário, é natural que boletins epidemiológicos sucessivos reflitam as divergências científicas.”

“Inexiste indício de que houve intenção de prejudicar o povo brasileiro”, afirma Aras. “Aliás, seria ilógico que um governante, numa democracia, intencionasse, sem motivo aparente, propagar uma patologia grave e dizimar parcela da população governada.”

A PGR, entretanto, abriu um procedimento preliminar prévio contra Bolsonaro em que ele é acusado de “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”. O presidente foi denunciado neste caso por outro advogado após ter sido flagrado conversando com garis em 23 de julho, sem máscara, na região próxima ao Palácio Alvorada. O presidente havia testado positivo para a Covid-19 um dia antes.

“Caso surjam indícios de uma possível prática criminosa pela autoridade noticiada, portanto, serão adotadas as providências persecutórias cabíveis”, disse Aras em uma manifestação apresentada em 21 de agosto. A apuração da PGR não tem data para ser concluída.

Balanço da PGR

A PGR divulgou um balanço da atuação de Aras durante o primeiro ano de mandato. Desde setembro de 2019, quando Aras foi indicado ao cargo, foram abertas 121 novas frentes de investigação. O número já ultrapassa todo o biênio da antecessora Raquel Dodge. Sob o comando da procuradora, 96 inquéritos foram instaurados entre 2017 e 2019.

Além disso, nos últimos 12 meses, foram apresentadas 26 denúncias contra 92 pessoas, sendo 7 ao Supremo Tribunal Federal e 19 ao Superior Tribunal de Justiça.

“A esfera criminal se mantém como um dos pilares do trabalho e, desde o fim de setembro de 2019, tem se intensificado no exercício da atribuição institucional da persecução penal, mobiliza uma equipe formada por membros auxiliares e servidores, orientada a agilizar o andamento dos casos apostando, sempre que possível, na solução extrajudicial”, informou, em nota, a Secretaria de Comunicação Social da PGR.

Os acordos de colaboração premiada são prioridade na gestão, segundo a Procuradoria. Até aqui, foram assinados 19 deles, incluindo o do ex-secretário de Saúde do Rio de Janeiro, Edmar Santos, que subsidiou o afastamento do governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), e integram duas denúncias sobre corrupção do Executivo fluminense.

Em outra frente, a PGR fechou dois acordos de não persecução penal com investigados em processos no Supremo Tribunal Federal. Regulamentado pela Lei Anticrime (Lei 13.964/2019), o instrumento permite que o MP deixe de denunciar o investigado à Justiça mediante a confissão do delito e o cumprimento de condições ajustadas entre as partes. A medida vale para crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, com pena mínima inferior a 4 anos de reclusão, e vem crescendo em todo o MPF, segundo informou a instituição. Em 2020, foram firmados 3.892 acordos do tipo no país.

*Com informações de Estadão Conteúdo


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