Em 14 de março próximo passado, o Supremo Tribunal Federal (STF), por seis votos a cinco, firmou entendimento de que crimes comuns, conexos com crimes eleitorais, devem ser julgados pela Justiça Eleitoral. A decisão foi proferida diante de um caso concreto, ou seja, um pedido da Procuradoria Geral da República no âmbito de um inquérito que investiga o pagamento de R$ 18,3 milhões pela Odebrecht para agentes públicos do Rio de Janeiro.
A corte consolidou o entendimento já aplicado por sua 2ª Turma ao apreciar e julgar os casos da Operação Lava Jato. Embora proferida diante de um caso concreto, alguns juristas já defendiam os efeitos “erga omnes” (contra todos) da decisão.
Na realidade, o que o STF fez foi uniformizar o entendimento no tribunal, já que sua 1ª Turma adotava raciocínio contrário, gerando instabilidade e desconfiança. Em voto divergente, o ministro Luís Roberto Barroso defendeu que os crimes comuns deveriam ser julgados pela Justiça Federal, e os delitos eleitorais pela Justiça eleitoral, sustentando que esta não está vocacionada para julgamentos criminais.
No mesmo sentido, o ministro da Justiça, Sergio Moro, ponderou que “a Justiça Eleitoral não está preparada para julgar corrupção e outros crimes comuns”, enquanto o procurador da República, Deltan Dallagnol, insatisfeito com a decisão, afirmava que “hoje, começou a se fechar a janela de combate à corrupção política que se abriu há 5 anos, no início da Lava Jato”.
A polêmica decisão ensejou vários desentendimentos e outras tantas interpretações, haja vista o subjetivismo adotado pelo Colegiado em relação aos conceitos de crimes (comuns e eleitorais) e aos fenômenos jurídicos conhecidos por “foro por prerrogativa de função”, ou “foro privilegiado” e “conexão”.
A competência para processar e julgar crimes está na Constituição Federal e no Código de Processo Penal (CPP). Do cotejo dessas duas leis percebe-se que compete à Justiça Comum o processo e o julgamento dos crimes praticados contra a Administração Pública, a exemplo da corrupção e dos demais tipos penais congêneres, excluídas as competências das justiças especializadas, como a eleitoral.
O CPP também prevê as hipóteses de separação de processo ou reunião, caso haja conexão entre eles. Todavia, isso só acontece quando houver ligação de provas ou dos sujeitos envolvidos no crime, nunca a critério meramente subjetivo da autoridade investigadora (delegado de Polícia e Ministério Público) nem de autoridade judiciária (juízes, desembargadores e ministros).
Constatada, juridicamente, a conexão entre crimes comuns e eleitorais, o princípio da especialidade ordena que a competência para o processo e julgamento seja da justiça especializada (a eleitoral), face o bem jurídico tutelado. Em relação à chamada “prerrogativa de função”, também conhecida como “foro privilegiado”, que foi outro ponto debatido no julgamento do Supremo, nossa Lei Maior prescreve que a competência originária é do próprio STF, a partir da diplomação do eleito.
Os crimes cometidos anteriormente, portanto, a exemplo dos delitos eleitorais, submeter-se-ão a processo e julgamento da Justiça Eleitoral. Tal fato ocorreu com o entendimento de que os crimes cometidos durante a campanha eleitoral pelo deputado guardariam conexão com seu “status” no exercício do mandato.
Para o STF, a Justiça Eleitoral está plenamente capacitada para exercer, com inteira correção e apuração técnica, a jurisdição penal quando os crimes comuns estiverem conexos com os crimes eleitorais. Segundo o ministro Celso de Mello, “O Supremo Tribunal Federal tem plena consciência de que não faltarão meios para a Justiça Eleitoral realizar e desempenhar os encargos que lhe competem na esfera penal”. Daí as modificações ocorridas em toda a Justiça Eleitoral para o desempenho de suas novas funções. Competência não lhe falta, para tanto.
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