Ceará tem quase 90% de subnotificações de Covid-19, aponta estudo

Estudo aponta que apenas um em cada dez casos da doença entra nas estatísticas oficiais. Testagem deve ser ampliada Foto: Camila Lima

Pesquisadores indicam que, com quantidade insuficiente de testes para atender a todos os casos suspeitos, pode haver falsa sensação de controle da doença e o relaxamento de medidas de contenção. Ceará já acumula 397 óbitos e 6,7 mil casos confirmados, segundo Secretaria de Saúde

No Ceará, a taxa de notificações do novo coronavírus é de apenas 10,9%, conforme estimativa de um estudo do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (Nois) da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), publicado neste mês. Ainda assim, o índice fica acima da média nacional, de 8%. O total no Estado representa uma possível taxa de subnotificações de 89,1% – ou seja, fora do radar das autoridades de Saúde. No último domingo (26), mais 300 mil testes rápidos para detecção da doença chegaram ao Ceará, mas o Governo do Estado vai destiná-los a grupos prioritários.

“O curso rápido da pandemia e o baixo número de testes realizados no Brasil dificultam a estimativa do real número de casos confirmados”, considera o Núcleo.
A “baixa capacidade de testagem pelo RT-PCR”, exame mais complexo e confiável, é um fator apontado pelos pesquisadores para que o Ministério da Saúde (MS) recomendasse que apenas os casos mais graves fossem testados. O levantamento analisa dados até o 10 de abril e tem confiança de 95%.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) confirma que o número de casos notificados é inferior ao real porque “não temos testes em quantidade suficiente para atender a demanda, então é possível que haja subnotificação”. Ainda para o Nois, o elevado grau de subnotificação pode sugerir “uma falsa ideia de controle da doença” e, consequentemente, levar ao “declínio” de ações de contenção do coronavírus, “como o isolamento horizontal” – que vale para todos e não apenas para alguns grupos, como seria o vertical.

Conforme a plataforma IntegraSUS, da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), mais de 22,7 mil exames já foram realizados no Ceará. No entanto, apesar do incremento na capacidade de realização dos exames, outros 18,8 mil casos ainda seguem em investigação. Segundo o prefeito Roberto Cláudio, em Fortaleza, para cada óbito há uma estimativa de 100 casos da doença.

Registros

Até as 17h17 de ontem, o Ceará acumulava 397 óbitos confirmados, 116 suspeitos, e 6.783 casos confirmados de Sars-CoV-2. Na comparação com o boletim de domingo, no mesmo horário, foram 21 mortes e 523 casos a mais. A taxa de letalidade no Ceará é de 5.9% e a faixa etária que reúne a maior quantidade de óbitos é de 80 anos ou mais.

Sem realização do teste, a farmacêutica Naiara Ximenes, 30, pensa que pode ter tido Covid-19. A mãe dela, de 62 anos, recebeu diagnóstico positivo após retornar de uma viagem à Europa e foi cuidada pela filha. Uma semana após o teste da mãe, Naiara apresentou febre e sintomas gripais. Nesse período, a rotina de toda a família passou a ser dentro de casa. Mesmo com a desconfiança, a farmacêutica não procurou exame para si.

“Eu sei como o negócio está colapsado. Eu fazer um teste não vai me dar abertura de um leito caso eu precise. Também não existe certeza se você não pode ser reinfectado, então deixei pra quem precisa”, garante Naiara. Em breve, com o fim das férias, ela deve retornar à linha de frente na farmácia, onde sabe que é a primeira opção da maioria das pessoas, antes dos hospitais. “Mas tem que dar a cara a tapa”, entende.

O publicitário Rodrigo Cidrão, 34, teve quatro familiares com teste positivo para a Covid-19, incluindo a avó, que faleceu. No início de março, quando o Ceará tinha poucos casos confirmados, ele teve febre por menos de dois dias, tosse e uma sensação de “cabeça fofa”, mas não foi testado. “Os médicos disseram: ‘não vamos testar porque você está assintomático’. Eu super entendi que tinha pouco teste e que tinha que priorizar quem tinha prioridade, quem estava com caso mais grave”.

Para Rodrigo, a falta do diagnóstico oficial não fez diferença porque foi tratado pelos profissionais da saúde como se estivesse com a doença, tendo conseguido acompanhar o pai durante a internação por causa disso. “Fico um pouco aliviado de ter pego isso no começo por termos conseguido quatro leitos logo e porque, teoricamente, a gente não pega mais, ainda que possa ser vetor de transmissão. Hoje, tenho mais cuidado pelos outros do que por mim mesmo”.

O médico imunologista da Care Plus, Eduardo Finger, reforça que “nenhum serviço consegue tolerar o número de testes” necessários para verificar toda a população. No entanto, destaca que a maior parte que tiver contato com o vírus “não vai ter absolutamente nada”. “Dessa enorme maioria, 20% vai ter alguma coisa, uma gripe, nariz entupido, dor de cabeça, mal estar, febre, e não vai passar disso. Um pequeno contingente pode evoluir para doença mais séria, e uma menor porcentagem terá doença grave”, diz.

O especialista defende que, se o indivíduo apresentar sintomas leves, deve se isolar em casa e esperar passar. Contudo, se apresentar alguma dificuldade respiratória, deve procurar uma unidade de saúde. “A gente tem que se isolar para reduzir o máximo possível essa transmissão, que é natural. Mas existe uma diferença crítica entre todo mundo se infectar de uma vez ou uma transmissão mais lenta. Uma vez que você perde o controle, está correndo atrás do prejuízo”, explica.

Os 300 mil testes rápidos que chegaram da China serão distribuídos aos 184 municípios cearenses conforme a população e o número de casos em cada um. Segundo o secretário da Saúde, Carlos Roberto Martins, o Dr. Cabeto, a princípio, 40% dos testes serão enviados para o Interior, e os outros 60% serão aplicados na Capital, que concentra o maior número de casos. “Vamos centralizar primeiro nos hospitais, os profissionais da segurança, e para os casos suspeitos. Vamos disponibilizar nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) para aqueles que tenham mais de cinco dias de sintomas. Estamos discutindo se (ficará) em alguns postos de saúde”, explica.

Rápidos

Os testes rápidos, com resultado em até 20 minutos, servem para detectar anticorpos contra a Covid-19, em amostras de sangue total, soro ou plasma humano. Resultados negativos não excluem a infecção por Sars-CoV-2, mas resultados positivos também não podem ser usados como evidência absoluta.

RT-PCR

Já o teste RT-PCR, por biologia molecular, é mais complexo e identifica o coronavírus logo no início, ou seja, no período em que ainda está agindo no organismo. Ele é considerado o mais confiável para o diagnóstico, embora também apresente limitações.

Confira matéria do Site Diário do Nordeste

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