Supremo julga nesta quarta-feira, 4, se pessoas filiadas a um partido político podem assinar fichas de apoio de criação de uma nova sigla
BRASÍLIA – Um julgamento marcado para esta quarta-feira, 4, no Supremo Tribunal Federal (STF) pode atingir os planos do presidente Jair Bolsonaro de tirar do papel o partido Aliança pelo Brasil, que ainda patina na coleta de assinaturas. O plenário vai decidir se uma pessoa filiada a um partido político pode ou não assinar a ficha de apoio de criação de uma nova sigla.
Não se trata de permitir a filiação a dois partidos simultaneamente, e sim de decidir se alguém pode apoiar a criação de uma nova sigla mesmo já sendo filiado a outra.
Para a advogada e tesoureira do Aliança, Karina Kufa, a proibição deve ser derrubada pelo Supremo. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), até esta segunda-feira, 5.499 assinaturas em favor da criação da nova sigla foram consideradas válidas, 51.765 estão em fase de impugnação (contestação), 2.827 ainda em análise por cartórios e outras 13.419 já foram descartadas por uma série de motivos, entre eles a questão da filiação e o fornecimento de informações incompletas.
Uma das barreiras identificadas por Kufa é justamente a proibição de que filiados a partidos apoiem a criação de novas siglas. Os dirigentes do Aliança receberam relatos de eleitores sobre dificuldades burocráticas para se desfiliar das atuais siglas e embarcar no novo projeto de Bolsonaro.
“Isso inviabiliza a criação de partidos e traz um transtorno enorme para o cidadão. O ato de apoiamento é do cidadão, não do partido. Não podemos cercear umas das formas de exercício direto da democracia”, afirmou Kufa. Para sair do papel, o Aliança precisa coletar até março as 491,9 mil assinaturas. O partido já jogou a toalha e dirigentes admitem não ser possível viabilizar seu registro na Justiça Eleitoral até o início de abril, prazo necessário para disputar as eleições municipais deste ano.
Partido diz que lei viola princípio da liberdade de manifestação
A ação chegou ao Supremo em 2015, em uma ação movida pelos Pros, que contestou a restrição imposta por uma lei que proibiu a contabilização, no processo de criação de novos partidos, da assinatura de eleitores filiados a outras agremiações. Para a sigla, a barreira viola os princípios das liberdades de manifestação e convicção política, criando duas classes de cidadãos (uns com e outros sem filiação partidária).
Na época, pelo placar elástico de 10 a 1, o STF manteve em vigor a restrição, frustrando o Pros e defendendo o maior rigor previsto na legislação para o surgimento de mais siglas. O caso voltará a ser discutido em meio à ofensiva de Bolsonaro para viabilizar o Aliança pelo Brasil.
Integrantes do STF ouvidos reservadamente pelo Estado, no entanto, acreditam ser difícil que o tribunal mude o entendimento, ao examinar desta vez o mérito da ação. O único ministro que não participou do primeiro julgamento foi Alexandre de Moraes, que chegou à Corte em 2017, após a morte de Teori Zavascki em um acidente aéreo.
Em 2015, o único voto a favor de eleitor filiado a partido político poder apoiar a criação de uma nova sigla veio do ministro Dias Toffoli, que atualmente comanda a Corte. “Ao franquear apenas a determinado grupo de eleitores a participação na criação de novos partidos políticos – excluindo desse processo, automaticamente, outra parcela de eleitores, igualmente aptos e legitimados a participar de importante etapa do processo democrático – a norma restringe o eleitor do acesso a um instrumento de cidadania, em patente violação desse princípio fundamental e do princípio democrático”, disse Toffoli na ocasião.
Prevaleceu, no entanto, o entendimento da relatora, ministra Cármen Lúcia, que apontou para a “explosiva criação de novos partidos políticos” em seu voto.
“A proliferação partidária havida atualmente no Brasil agrava-se com a mesma rapidez com que avançam mecanismos tecnológicos, servis ao acesso e à coleta massiva de assinaturas para apoio a novas criações de legendas, não se exigindo dos subscritores responsabilidade ou compromisso, sequer mesmo a certeza de sua identidade”, afirmou Cármen à época.
Na avaliação da advogada Ezikelly Barros, que defende o Pros na ação, a restrição é desproporcional. “Se o partido do presidente da República, que acabou de passar por uma eleição e goza de boa popularidade perante a opinião pública, está enfrentando dificuldades em razão dessa barreira colocada, isso demonstra que essa restrição não tem razoabilidade, porque está vedando que lideranças legítimas consigam viabilizar a criação de um partido”, disse.
Já o especialista em direito eleitoral da FGV-São Paulo Diogo Rais não vê violação à Constituição no caso. “O Supremo não faz o controle de qualidade da lei, e sim do respeito à Constituição. Com toda a sinceridade, não acho que esse dispositivo fere a Constituição, porque traz um requisito. Assim como só pode tirar título de eleitor acima de 16 anos, porque o legislador assim quis”, comentou.
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