Deputado usa motosserra e alicate para derrubar bloqueio em base indígena em Roraima; veja vídeo

Os indígenas Alisson Waimiri e Josimar Waimiri, na entrada da Terra Indígena Waimiri Atroari (18/06/2019) Foto: Bruno Kelly / ESTADAO

Jeferson Alves diz que ‘nunca mais’ rodovia será fechada; BR-174 corta a terra indígena Waimiri Atroari, onde vivem os índios kinja

BRASÍLIA – O deputado estadual Jeferson Alves (PTB-RR) derrubou na manhã desta sexta-feira, 28, o bloqueio da base indígena que controla o acesso à BR-174, que liga Manaus (AM) a Boa Vista (RR). Com uso de uma motosserra e um alicate de pressão, o deputado corta o tronco e uma corrente que era usada pelos índios para controlar o acesso na rodovia. A BR-174 corta a terra indígena Waimiri Atroari, onde vivem os índios kinja.

O acesso pela estrada é controlado durante a noite pelos índios, com restrições de passagem para caminhões. A terra indígena também está no meio de uma polêmica de uma linha de transmissão de energia, que passaria pela reserva, ao largo da estrada.

Apoiado por outras pessoas, o deputado Jeferson Alves rompeu a corrente usada no bloqueio da estrada, dizendo que “nunca mais” a rodovia será fechada. Ele cita o presidente Jair Bolsonaro como alguém que apoia sua atitude.

Os Waimiri Atroari habitam uma região localizada à margem esquerda do baixo rio Negro. A Funai avaliou que, na década de 1960, quando a estrada começou a ser construía, viviam 3 mil indígenas na área onde seria construída a BR-174.

Os planos de construção da BR-174 foram apresentados em 1968. O 6º Batalhão de Engenharia (BEC) assumiu a execução da obra. Durante o processo de construção, que terminaria em 1979, a população indígena foi quase dizimada por confrontos e contágio por inúmeras doenças. Com a estrada, somaram-se os efeitos da construção da hidrelétrica de Babina, o mais trágico projeto elétrico do país, e a mineração industrial.

De 3 mil índios, os kinja reduziram-se para 200 indígenas. O resgate do povo kinja deve-se ao trabalho do indigenista Porfírio Carvalho, que por décadas atuou na defesa desses indígenas e conseguiu estabelecer uma política de controle, o que envolveu, entre outras ações, um programa de proteção e apoio firmado com a Eletrobrás.

Hoje, vivem cerca 2,1 mil índios da região, espalhados em 56 aldeias.

O conflito

Há anos, o bloqueio da BR-174 ocorre diariamente, das 18h às 6h da manhã, no trecho da reserva indígena Waimiri Atroari. Durante o bloqueio, só é autorizada a passagem de ônibus de linha interestadual, caminhões com cargas perecíveis e ambulâncias.

Os indígenas afirmam que o bloqueio é realizado para proteger animais e os próprios povos de atropelamentos. O professor da Universidade Federal de Roraima, Marcos Braga, defendeu, em audiência no ano passado, o direito de consulta às comunidades indígenas para encontrar caminhos que resolvam a situação. Ele ressaltou que o cenário atual é bem diferente da época em que o 6º Batalhão de Engenharia e Construção (BEC) colocou a corrente, quando a etnia quase foi dizimada durante a construção da BR-174 nas décadas de 1960 e 1970.

Desde o ano passado, Jeferson Alves tem criticado o bloqueio e pedido defendido a retirada da corrente. “O governo Bolsonaro teve 70% dos votos em Roraima, prometendo a retirada dessa corrente. Ele tem que se manifestar”, afirmou Jeferson Alves, em audiência sobre o assunto realizada no ano passado.

O deputado estadual Jeferson Alves (PTB) na Assembleia Legislativa de Roraima
O deputado estadual Jeferson Alves (PTB) na Assembleia Legislativa de Roraima Foto: Alex Paiva/ALE-RR

Representantes do Ministério Público de Roraima (MPRR) e da Universidade Federal de Roraima (UFRR) têm defendido o diálogo sobre o assunto. No ano passado, o secretário estadual de Planejamento, Marcos Jorge, disse que não há regulamentação legal para a prática. “Parabenizo o Poder Legislativo por essa discussão, pois há uma cultura de se fechar essa corrente por 12 horas, mas não há nenhuma norma que autorize o fechamento. E pensando no desenvolvimento pacífico de todo o estado de Roraima, é que o Governo se manifesta pela retirada da corrente”, afirmou, na ocasião.

O que diz a Funai

Procurada pela reportagem,  a Fundação Nacional do Índio (Funai) afirmou, por meio de nota, que “o Ministério Público Federal já tomou conhecimento do fato” e que “não tem competência para julgar a legalidade do ato”.

Os indígenas, segundo a fundação, já substituíram as correntes, que são colocadas no início e no fim da terra indígena. No único comentário sobre o deputado estadual, a autarquia ligada ao Ministério da Justiça limitou-se a dizer que “está acompanhando de perto o desenrolar do caso da retirada de uma corrente na BR-174”.

A iniciativa de controlar o tráfego na BR-174 partiu do Exército, quando ainda era responsável pelos postos de vigilância. A medida de controle, apesar das críticas, faz parte do Subprograma de Proteção Ambiental do Programa Waimiri-Atroari, e tem por finalidade controlar o tráfego nas estradas existentes dentro da terra indígena e evitar ações predatórias da fauna. “A medida evita que carros de passeio ou caminhões em alta velocidade atropelem animais de hábitos noturnos, muito comuns às margens daquela estrada”, afirmou a Funai.

Rodovia BR-174, na área da Terra Indígena Waimiri Atroari (18/06/2019)
Rodovia BR-174, na área da Terra Indígena Waimiri Atroari (18/06/2019) Foto: Bruno Kelly / ESTADAO

Confira matéria do Estadão .

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