Mudança demográfica e ensino

Na semana em que o Pisa mostrou que o Brasil continua perdendo a corrida educacional, um estudo detalha a realidade da área em todos os Estados

Na mesma semana em que o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês) mostrou que o Brasil continua perdendo a corrida educacional e os especialistas em ensino básico alegaram que só a valorização da carreira docente mudará esse cenário trágico, o economista Ricardo Paes de Barros, ex-subsecretário da Secretaria de Ações Estratégicas da Presidência da República, economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e professor do Insper, apresentou aos secretários estaduais de Educação um detalhado estudo sobre a realidade educacional nas 27 unidades da Federação.

Segundo o estudo, como a população brasileira está envelhecendo e a taxa de natalidade está caindo, a demanda por matrículas na rede de ensino básico tende a se reduzir nos próximos anos – o que já vem sendo detectado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por isso, se os cursos de licenciatura e pedagogia mantiverem a média de formandos dos últimos anos, o Brasil terá um excedente de professores, conclui Paes de Barros. Entre 2013 e 2017, esses cursos formaram 1,148 milhão de docentes. As estimativas das autoridades educacionais são de que mais de 1,5 milhão vai se formar nos próximos cinco anos.

O desafio que o País tem de enfrentar para reerguer seu sistema educacional, portanto, é claro: em vez de gastar recursos escassos com a expansão do ensino superior na área de licenciatura e pedagogia, é necessário concentrá-los na melhoria da qualidade dos cursos existentes, para que possam formar professores preparados. “Precisamos dizer às universidades que não necessitamos de mais professores, mas de melhores”, afirma Barros.

A opção por mais qualidade do que quantidade é o que os especialistas em ensino básico chamam de valorização do professorado. Como lembra o estudo de Barros, um dos principais problemas responsáveis pela baixa qualidade dos formandos em licenciatura e pedagogia está no fato de que esses cursos se expandiram basicamente pela oferta de graduações a distância, cuja qualidade é bastante inferior à dos cursos presenciais.

Além disso, professores com melhor formação precisam ser recompensados com vencimentos mais altos do que os atuais, lembra Barros. Mas como aumentar salários num período de dificuldades orçamentárias? Segundo ele, como haverá a necessidade de menos docentes e de novas escolas de ensino básico, por causa das mudanças demográficas, a economia de recursos daí advinda pode ser revertida em favor do próprio sistema educacional. Em outras palavras, os recursos poupados poderão ser destinados ao aumento salarial dos professores.

O estudo mostra ainda que, além de ser decisiva para a ampliação dos níveis de aprendizagem dos alunos do ensino básico, a melhoria na qualidade de formação dos professores tem outro importante impacto social. “Como o magistério público atrai gente de famílias pobres, aumentar a remuneração dos profissionais de ensino é uma importante janela de ascensão social”, diz Paes de Barros.

Dois indicadores dão a dimensão dessa “janela”. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), realizada pelo IBGE, os professores representam atualmente 3,1% da força de trabalho do Brasil – e entre as mulheres com ensino superior, 20% são professoras. Além disso, segundo dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2017, 72% dos concluintes em licenciatura e cursos de pedagogia eram mulheres; 52% eram negras, pardas ou indígenas; e 61% tinham mães que haviam cursado, no máximo, até o ensino fundamental. 

O estudo de Paes de Barros, um conceituado estudioso da relação entre educação e economia, apresenta um número significativo e valioso de informações para fundamentar um projeto destinado a reverter o trágico cenário apontado pelo Pisa. Resta esperar que, em vez de perder tempo criticando professores e discutindo religião e pedagogia, as autoridades educacionais o leiam, linha por linha.

Confira matéria do site Estadão.

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