Reforma tributária pode triplicar carga de impostos sobre serviços digitais

Plataformas de streaming, como Netflix, serão impactadas com aumento de carga tributária| Foto: PIxabay

Caso a proposta de reforma tributária, aprovada na Câmara dos Deputados no dia 7, passe também no Senado, um dos setores mais impactados com aumento de carga tributária deve ser o de serviços. Preços praticados por companhias que atuam por meio de plataformas digitais, como os provedores de streamings Netflix, Spotify, Amazon Prime e Disney+, e de aplicativos de transporte, como Uber e 99, e de delivery, como iFood, poderão aumentar.

O eixo central da reforma é a adoção de um sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Passam a vigorar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no lugar do ICMS estadual e do ISS municipal; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui três tributos federais: PIS, Cofins e IPI.

Atualmente, as alíquotas médias pagas pelas empresas do setor de serviços digitais são de até 5% de ISS, dependendo do município, e de 3,65% de PIS/Cofins. Embora precise ser definida por meio de lei complementar, a previsão é que a alíquota de referência do IBS e do CBS seja inferior a 30%. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), braço do Ministério do Planejamento, estima a alíquota em 28%.

“Essa reforma foi predominantemente para a prestação de serviços, que vai ser de longe o setor mais afetado”, diz Mariana Ferreira, advogada tributarista do Murayama Affonso Ferreira e Mota Advogados.

Ela ressalta, no entanto, que a discussão não está encerrada, uma vez que tanto na tramitação no Senado pode haver inclusão dos serviços digitais no rol de setores com redução de 60% na alíquota do IVA.

É o que pedem associações e federações ligadas ao setor de serviços digitais, TI e internet. Um manifesto foi divulgado por entidades como a Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro), Associação Brasileira de Internet (Abranet), Federação Nacional das Empresas de Informática (Fenainfo), Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) e Sindicato de Empresas de Internet do Estado de São Paulo (Seinesp).

“Supondo uma alíquota de referência de 25% de IBS e CBS, a aprovação da reforma, representaria uma elevação de 189% da carga tributária do setor no melhor cenário – visto que milhares de empresas do setor estão sediadas em municípios que tem a alíquota de ISS fixada em 2% (o que representaria uma elevação da carga tributária em 342%) e que a alíquota final de referência pode de vir a ser mais elevada”, dizem as entidades.

Já a Câmara Brasileira de Economia Digital (camara-e.net) publicou nota em que defende a adoção de um teto para o aumento de carga tributária do setor de serviços como forma de “assegurar a sua competitividade e empregabilidade, sem criar complexidades na estrutura do IVA”.

“A camara-e.net reforça a importância de que as demais proposições legislativas da reforma tributária permitam a amenização do impacto do IVA sobre o setor de serviços, seja por uma política ampla que desonere o emprego ou pela criação de possibilidades adicionais de créditos tributários”.

Principal entidade brasileira a reunir empresas da chamada economia digital, a camara-e.net representa as principais empresas de tecnologia e varejo digital do país, o que inclui representantes de Google e Facebook, Amazon, iFood, Mercado Livre e OLX, por exemplo.

O Ministério da Fazenda diz que a reforma tributária pode ter impacto em serviços digitais como streamings e aplicativos de transporte e entrega de comidas, mas que a redução do preço da energia elétrica, que seria gerada pela mesma emenda constitucional, compensaria os aumentos, resultando em pouco impacto para o consumidor final.

Assespro, Abranet, Fenainfo, Acate e Seinesp, no entanto, afirmam que o aumento de carga tributária impactará negativamente o crescimento do setor de serviços digitais, TI e Internet nacional, ao enfraquecer e retirar competitividade das empresas que operam e contribuem para levar o país para um futuro tecnológico, “muitas delas fadadas à extinção, ocasionando a perda de empregos diretos e indiretos, um prejuízo que não é apenas econômico, mas também social”.

“Além disso, a alta tributação sobre folha de pagamentos (insumo que não gera crédito) se colocará como um desestímulo à produção e ao desenvolvimento de softwares, serviços domésticos, inovação, contratação de funcionários celetistas, além e demissões em larga escala, gerando, inclusive, prejuízos à previdência social”, diz um trecho do manifesto assinado pelas entidades.

Eduardo Nehme, advogado tributarista do Caputo, Bastos e Serra Advogados, acredita que, ainda que o efeito econômico final da reforma seja neutro para os consumidores, alguns setores devem sair favorecidos e outros prejudicados ao final da reforma.

“O debate que se apresenta é se o Brasil pretende aumentar a tributação sobre os serviços online – um setor estratégico, intimamente ligado à inovação e com tendência de se tornar cada vez mais presente no cotidiano, especialmente com a popularização do acesso à internet e com o crescente número de produtos físicos com serviços de internet integrados”, diz Nehme.

companhar políticos em redes sociais, o novo “crime” no Brasil orwelliano

Bolsonaro
PGR quer dados de todos os que seguem Jair Bolsonaro nas várias mídias sociais.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Neste país onde já não se pode fazer afirmações – mesmo privadamente, em grupos reservados – que em outros lugares seriam o puro e simples exercício da liberdade de expressão, agora até mesmo o ato de seguir o político “errado” em uma rede social pode gerar problemas futuros. É a mensagem que a Procuradoria-Geral da República acaba de enviar com um pedido que viola a garantia constitucional da privacidade de dezenas de milhões de brasileiros, sendo ao mesmo tempo absurdo, autoritário, desproporcional e… inútil – isso a julgar pelas palavras da própria PGR.

O subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos pediu ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que determine o envio, por parte das empresas de mídias sociais, de uma “lista completa com os nomes e dados de identificação dos seguidores de Jair Messias Bolsonaro”. Segundo informações fornecidas pelo próprio subprocurador em seu pedido, o ex-presidente da República tem 15 milhões de seguidores no Facebook, 25,3 milhões no Instagram, 11,4 milhões no Twitter, 6,47 milhões no YouTube, 5,5 milhões no TikTok e 426 mil no LinkedIn. E para quê tudo isso? Era de se esperar que Santos fosse capaz de explicar, de forma bastante convincente, como a posse de tamanha base de dados pudesse auxiliar em alguma investigação de crimes concretos. No entanto, nem o subprocurador conseguiu o efeito, tampouco a PGR foi capaz de fazê-lo, em nota divulgada após a repercussão negativa do pedido.

Se a PGR é incapaz de explicar com clareza como o envio desses dados ajudará a investigação, não existe nenhum motivo para que o STF autorize uma violação massiva da privacidade de inúmeras pessoas que não são investigadas por nada

“Impõe-se dimensionar o impacto das publicações e o respectivo alcance. Jamais iria investigar milhões de pessoas, seria até impossível fazer isso (…) Só há um investigado neste caso: o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro”, justificou-se o subprocurador. Em nota, a PGR afirmou que pretende “obter informações que permitam avaliar o conteúdo e a dimensão alcançada pelas publicações do ex-presidente em relação aos fatos ocorridos em 8 de janeiro nas redes sociais”. Ora, se é assim, existe um único usuário de mídias sociais cujos dados são necessários à investigação e cujas publicações precisam passar pelo escrutínio da PGR: Jair Bolsonaro, e mais ninguém. Curiosamente, o pedido deixa implícito que a investigação não sabe muito bem aonde quer chegar. O inquérito em questão, afinal, trata dos atos de 8 de janeiro; existe uma publicação específica na mira dos procuradores – um vídeo publicado dois dias depois, e que teria sido apagado posteriormente –, mas à exceção deste caso concreto o pedido menciona apenas que “o objeto em análise pode configurar, isoladamente, a prática de outros crimes por Jair Messias Bolsonaro”, sem dizer que outros crimes seriam esses.

Em bom português, até mesmo no caso de Bolsonaro parece estar em curso o que se chama de “pesca probatória”, prática abusiva em que os investigadores recolhem todo o material que puderem, sem saberem ao certo nem mesmo o que pretendem encontrar, mas convictos de que haverá algo que mereça sua atenção. Se é assim com o verdadeiro investigado, o que dizer da intenção de lançar a rede para pegar um cardume de dezenas de milhões de brasileiros, simplesmente porque curtem, seguem ou acompanham o ex-presidente, às vezes por razões meramente profissionais, sem que haja afinidade com a pessoa ou as ideias de Bolsonaro? Uma vez que a PGR é incapaz de explicar com clareza como o envio desses dados ajudará a investigação, não existe nenhum motivo para que Moraes autorize uma violação massiva da privacidade de inúmeras pessoas que não são investigadas por nada.

Se a PGR suspeita da existência uma rede de instigação a atos contrários ao Estado Democrático de Direito, com a participação de Bolsonaro, precisa arregaçar as mangas e fazer seu trabalho como deve ser feito: investigando publicações específicas com esse teor e as interações relevantes, como compartilhamentos feitos por outros perfis com volume substancial de seguidores. Em hipótese alguma pode-se compactuar com pedidos descabidos que violam garantias constitucionais sem razão alguma e criam uma legião de “suspeitos (ainda que não no sentido formal-jurídico da palavra) por seguimento”. Acompanhar um político nas mídias sociais – quaisquer que sejam suas opiniões – não é crime, e só um Estado totalitário pensaria em ir atrás dos dados dessas pessoas da forma como a PGR acaba de fazer.

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