O recente reajuste concedido pela Petrobras nos preços dos combustíveis e do gás de cozinha desgastou a relação entre o presidente da estatal, Joaquim Silva e Luna, e o presidente Jair Bolsonaro (PL). O aumento de R$ 0,90 sobre o óleo diesel às vésperas de o Congresso votar e aprovar um projeto de lei que desonera o combustível em R$ 0,60 gerou uma irritação no governo federal e na base governista. A ponto de quadros políticos influentes defenderem a demissão de Silva e Luna.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é um dos mais incomodados com os rumos da Petrobras sob a gestão do general da reserva. Ainda na quinta-feira (10), quando a estatal anunciou o reajuste sobre os combustíveis e o gás de cozinha, ele disse que a “insensibilidade” da empresa “causou espanto” e classificou a decisão como um “tapa na cara” de um “país que luta para voltar a crescer”.
Deputados próximos de Lira e da base “raiz” de Bolsonaro afirmam à Gazeta do Povo que o presidente da Câmara está “indignado” com a política de preços da Petrobras e considera que Silva e Luna sucumbiu ao mercado financeiro. “O general Silva e Luna, que chegou com ímpeto para promover mudanças, foi ‘engolido’ pelo sistema e ganância dos acionistas”, diz um deputado da liderança do governo.
Outro deputado aliado afirma que o sentimento de Lira e da base governista é de que Silva e Luna não tem mais condições de permanecer à frente da presidência da Petrobras. “Ouvi crítica direta do Arthur Lira que o presidente [da estatal] não tem a menor condição de se manter porque ‘come na mão’ dos engenheiros da Petrobras, que sempre fazem o que estão fazendo”, diz a fonte.
A leitura feita por Lira e pela base chegou ao conhecimento de Bolsonaro, que também não tem evitado críticas à atual gestão. Desde a sexta-feira (11), o presidente da República tem reiteradamente criticado a estatal por não ter esperado o Congresso dar sua resposta aos combustíveis antes de propor o reajuste e dito que falta “sensibilidade” a companhia. Nesta terça-feira (15), ele cobrou que a empresa acompanhe a queda no valor do petróleo no mercado internacional e reduza o preço dos combustíveis.
Bolsonaro não fala abertamente que pensa em demitir Silva e Luna, mas no sábado (12) disse que, com exceção do presidente da República e do vice-presidente, “todo mundo tem a possibilidade de ser trocado”. “Ninguém falou em trocar [o Silva e Luna], você perguntou se ele pode ser trocado, qualquer um pode ser trocado menos eu, logicamente, e o vice-presidente da República, que têm mandato”, disse.
Qual a chance de Silva e Luna ceder à pressão e deixar a Petrobras
Apesar da fritura política, o cenário atual sugere que uma demissão de Silva e Luna é improvável. Mesmo com a “cabeça a prêmio” por quadros influentes do Centrão, como Arthur Lira, Bolsonaro foi aconselhado por seus núcleos político, econômicos e até aliados da base a não cobrar por uma saída. Ao menos não por agora.
Técnicos da equipe econômica apontam que a demissão de Silva e Luna repercutiria mal junto ao mercado e investidores, o que poderia provocar ainda mais impactos econômicos no ambiente doméstico brasileiro.
Militares em postos no governo e nas Forças Armadas concordam com a leitura e defendem Silva e Luna. Um aliado fardado de Bolsonaro pondera que uma eventual demissão do presidente da Petrobras recairia negativamente não apenas junto aos agentes econômicas, mas, também, junto aos militares. “O general Silva e Luna é uma pessoa da confiança do presidente e está lá cumprindo uma missão”, pontua.
Outro militar pondera que o presidente da República sabe que, embora seja o presidente da estatal, ele não tem como interferir nos preços. “Não é algo pessoal [com o Silva e Luna] e o presidente [Bolsonaro] está insatisfeito mesmo é com a política de preços. Por isso, não creio em demissão”, analisa.
Já interlocutores do núcleo político do Palácio do Planalto concordam com a tese de que a demissão de Silva e Luna poderia criar mais instabilidades junto ao mercado, mas não descartam que a pressão pode ser rediscutida quando a “poeira abaixar”. Alguns apontam que a carga pode ser retomada em abril.
Em 13 de abril, acionistas da Petrobras vão eleger um novo conselho de administração em uma Assembleia Geral Ordinária (AGO), que deve confirmar como presidente do colegiado o engenheiro Rodolfo Landim, atual presidente do Flamengo e ex-presidente da Gaspetro e da BR Distribuidora.
Landim chegou a ser sondado como potencial candidato a vice de Bolsonaro e se aproximou da família do presidente da República nos últimos anos. A indicação dele à presidência do Conselho de Administração da estatal é apontada como uma forma de o governo ter maior influência para segurar reajustes futuros sobre os combustíveis e o gás de cozinha.
Alguns aliados políticos até defendem que Landim assuma a presidência da Petrobras ainda em abril, mas a falta de consenso em relação a essa possível indicação na base governista é um entrave. “Não vejo ele sendo indicado à presidência, mas pelo menos forçaria o Silva e Luna a ter pulso firme em relação aos reajustes”, diz um deputado governista.VEJA TAMBÉM:
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O que diz o general sobre sua situação e o que sugerem governistas
Em meio à pressão, Silva e Luna tem se defendido. Em entrevista à Jovem Pan nesta terça-feira (15), ele disse que “não há crise” e negou a possibilidade de pedir demissão e “abandonar a tropa”. “Sou o soldado, o campo de batalha é minha zona de conforto, não fujo do campo de batalha abandonando a minha tropa. Um homem tem que fazer o que um homem tem que fazer”, declarou.
O presidente da Petrobras também afastou as chances de pedir demissão em entrevista ao site G1. “Jamais farei isso. Tenho formação militar. A gente morre junto na batalha e não deixa a tropa sozinha. Agora, minha indicação é do presidente da República, com quem tenho uma relação de lealdade e de confiança”, declarou.
Na segunda-feira (14), em meio a notícias de que o governo espera sua demissão, Silva e Luna disse à agência Reuters que não deixará o cargo. “Não há crise”, garantiu.
O discurso adotado pelo general em suas entrevistas encontra amparo entre militares, a exemplo do próprio vice-presidente Hamilton Mourão. “Silva e Luna é resiliente, sempre foi. Como bom nordestino, aguenta pressão”, afirmou a jornalistas na segunda. Nas Forças Armadas, o presidente da Petrobras também é elogiado. “Fez um belíssimo trabalho na Itaipu Binacional, é ex-ministro da Defesa e está lá a missão, não para enriquecer ou para atender a interesses do mercado”, diz um militar.
Militares apontam que Silva e Luna enfrenta a difícil missão de reduzir a volatilidade dos preços sem desrespeitar o alinhamento com as cotações internacionais, como pregou em seu discurso de posse. Um oficial militar pondera, inclusive, que ele possa ter autorizado o reajuste da última semana após ouvir os diferentes setores da estatal e por não ter garantias de que o Congresso aprovaria a desoneração sobre o óleo diesel. Caso seja demitido, um outro militar analisa que sua saída não geraria desgaste entre Bolsonaro e as Forças Armadas.
Já a base governista se mantém impaciente em relação ao presidente da estatal e cobra que ele próprio peça demissão para evitar desgastes ao país e a Bolsonaro. Existe um temor de que novos reajustes sejam autorizados por Silva e Luna e isso traga impactos negativos à candidatura à reeleição.
“Dentro da Petrobras ele virou um técnico, mas ele não é técnico, ele é o agente político da estatal”, sustenta um deputado. Um outro deputado da base diz que o reajuste autorizado por Silva e Luna é uma demonstração de “fraqueza absurda”. “Estão alegando que os acionistas pressionaram e que fazia anos que a Petrobras não distribuía dividendos e, agora, distribui. Sim, tem que distribuir, mas tem que ter em mente o princípio da oportunidade e conveniência. Nesse momento, era para esperar”, critica.
Um interlocutor do Planalto confirma que a pressão é grande e que integrantes influentes da base pediram a demissão de Silva e Luna, mas reforça que isso pode não ocorrer neste momento. “Eu acho que, se for o caso, ele vai pedir para sair, porque ficaria muito chato para um general ser demitido pelo presidente, e vice-versa”, pondera.
Já o deputado federal Nereu Crispim (União Brasil-RS), vice-líder do partido na Câmara e presidente da Frente Parlamentar Mista dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas, entende que Silva e Luna é uma “marionete” de Bolsonaro. “Isso pra mim é um teatro, quem botou ele foi o presidente da República. Ele está lá fazendo exatamente o que o presidente quer, não há nada desalinhado. É o presidente quem deu a facada nos caminhoneiros e demais brasileiros com o reajuste sobre o gás e os combustíveis”, acusa.
O parlamentar destaca que em outubro do ano passado solicitou a Bolsonaro que vetasse pagamentos de derivados de petróleo vinculados a moeda estrangeira. O pedido foi feito com base em um documento assinado por Arthur Lira sob o argumento de que o Código de Defesa do Consumidor veda a correção do preço de serviços e produtos com base em índices internacionais. Com base nessa defesa, por sinal, a frente parlamentar e entidades representativas dos caminhoneiros entraram com uma ação civil pública na Justiça contra o reajuste autorizado pela estatal.
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