Sufocada pela burocracia, sociedade serve ao Estado. Deveria ser o contrário

O dever do Estado é governar, manter a ordem e aplicar leis que defendam os cidadãos e suas atividades, protegendo a vida, a liberdade e a propriedade. Em uma democracia, as atividades do Estado jamais deveriam ser autointeressadas ou sem limites, como acontece muitas vezes no Brasil.

O Estado surgiu para facilitar a vida em sociedade. O conceito de servir o cidadão significa que o estado deve melhorar, simplificar, tornar menos onerosa, mais organizada e mais simples a vida das pessoas. Quando o Estado cria burocracias desnecessárias e onera demasiadamente as pessoas, ele está agindo em sentido contrário à sua razão de existir.

Há três séculos, a burocracia era encarada como um termo para designar a organização do Estado, formada por servidores responsáveis por suas respectivas áreas de atuação. Hoje, burocracia é sinônimo de empecilho, de obstáculo e atraso para a vida dos cidadãos. Por quê? Porque o cidadão reconhece que não existe valor e muito menos necessidade em várias ações e demandas que o estado realiza.

Em vez de criar uma empresa para sua segurança, para reduzir custos de transação e para facilitar seus negócios, no Brasil, o empreendedor acaba tendo que lidar com uma série de obstáculos que não fazem o menor sentido: as empresas gastam até 1.501 horas por ano para pagar impostos por aqui, segundo estatística do Banco Mundial. Se você considerar o horário comercial de trabalho, é o equivalente a 187 dias só para pagar impostos. É um absurdo!

E a média brasileira para a obtenção de uma licença ambiental é de 208 dias, de acordo com o engenheiro ambiental Leonardo Santiago, da consultoria WayCarbon. O número de dias varia de acordo com os estados ou com as atividades. Por exemplo, no caso do setor de transporte, obter licenciamento ambiental pode variar de 308 até 2.828 dias (mais de sete anos). Em atividades do agronegócio, de 267 a 3.967 dias (mais de dez anos). Na indústria alimentícia, de 178 a 2.898 dias (mais de sete anos), e assim por diante.

Quando o assunto é execução de contratos, isto é, a resolução de disputas comerciais em varas cíveis, a média de tempo no Brasil é de 32 meses, conforme o relatório Doing Business 2021. O período entre protocolar uma ação e a  execução da sentença varia de 18 meses a mais de quatro anos. “Esse processo é mais demorado e mais oneroso do que a média dos países de alta renda da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico)”, explica o Doing Business.

Das 191 economias medidas pelo Doing Business 2021, o Brasil é uma das 15 onde a abertura de uma empresa requer pelo menos 11 procedimentos, o que leva em média três semanas e custa o equivalente a 5,1% da renda per capita anual. Isso envolve até seis órgãos públicos nos âmbitos nacional, estadual e municipal. Por aqui, são impostos três procedimentos a mais do que a média das economias da América Latina e do Caribe. Embora o Brasil esteja melhorando muito nesse quesito, ainda precisamos simplificar mais a vida dos empreendedores.

No famoso discurso de Abraham Lincoln, proferido em 1863, na cerimônia de inauguração do Cemitério Militar de Gettysburg, ele disse que a democracia é o “governo do povo, pelo povo e para o povo“. Entretanto, no Brasil, parece que houve uma inversão. Hoje, parece que a nossa democracia é o governo da burocracia, pela burocracia e para a burocracia. O cidadão fica completamente refém desses entraves, quase precisando pedir favor para exercer seus direitos mais básicos. Está mais do que na hora de o Estado resgatar seu papel original e voltar a servir a sociedade.

Fonte: Gazeta do Povo

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