No último dia 7, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou um processo do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, relacionado à Operação Fatura Exposta, um desdobramento da Lava Jato. De acordo com essa operação, os crimes de corrupção e organização criminosa foram praticados por Cabral juntamente com outras seis pessoas, os quais desviaram da saúde entre 2007 e 2014 o valor aproximado de R$ 16 milhões.
De acordo com o processo, Sérgio Cabral e os demais envolvidos receberam propinas milionárias para fraudar contratos da área da saúde, sendo identificado que o ex-governador cobrava 5% de propina sobre todos os contratos firmados pelo Estado do Rio de Janeiro, inclusive os celebrados pela Secretaria da Saúde.
Por ser um desdobramento da Operação Lava Jato/RJ, o juiz competente para julgar o caso da Operação Fatura Exposta – ou seja o juiz prevento – era o juiz Marcelo Bretas, titular da 7ª Vara Criminal Federal do Rio. Assim, o processo foi iniciado em maio de 2017, com denúncia criminal oferecida pelo Ministério Público Federal contra os membros da organização criminosa.
Em fevereiro de 2020, Bretas condenou Sérgio Cabral; o ex secretário de Saúde e outros réus. Contudo, a Segunda Turma do STF anulou a condenação do ex-governador, tornando nula sua pena de 14 anos e 7 meses de prisão.
De acordo com o Supremo, o juiz Marcelo Bretas não seria o juiz processualmente competente para julgar a Operação Fatura Exposta, pois esse caso não teria relação com o primeiro processo que havia sido distribuído (sorteado) a ele, que foi a Operação Calicute, que apurava desvios na Secretaria de Obras.
Assim, por conta dessa decisão, o referido processo deverá ser novamente distribuído, ou seja, submetido a sorteio dentre os juízes federais criminais do Rio de Janeiro.
Desde a anulação dos processos do ex-presidente Lula verifica-se que o STF trilhou um caminho para a anulação de diversos outros casos. Um processo que envolve o ex-presidente Michel Temer foi anulado e também outro onde o réu era o ex-ministro Guido Mantega. Agora as anulações estão alcançando a Lava Jato/RJ, operação que desmantelou o maior esquema de corrupção da história no Estado do Rio de Janeiro.
Tudo começou em 2015, quando foi encaminhado um processo de Curitiba para que o MPF do Rio investigasse irregularidades em contratos para a construção da Usina Nuclear Angra 3. Em novembro de 2016, Sérgio Cabral foi preso na Operação Calicute, pois foi apontado como o chefe de uma complexa organização criminosa que desviou recursos de praticamente todas as obras públicas realizadas durante seu governo, seja na área da saúde; obras; administração penitenciária; casa civil e transportes; bem como desvios em obras da Prefeitura do Rio de Janeiro.
Foi constatado que Cabral estava envolvido em uma grande rede internacional de lavagem de dinheiro envolvendo 47 doleiros. Ao longo de 5 anos, o ex-governador foi alvo de 33 ações penais, e foi condenado em 21 processos a 399 anos e 11 meses de prisão.
Os resultados da Lava Jato no Rio de Janeiro são impressionantes; foram deflagradas 56 operações policiais e abertos 104 processos contra 887 pessoas. Ao todo, 183 réus foram condenados e foram recuperados nos acordos de colaboração premiada mais de R$ 3 bilhões. Somente o ex-governador Sérgio Cabral teve apreendido R$ 250 milhões em joias e barras de ouro, valores que foram utilizados para pagamento de pensionistas e servidores do estado do Rio que estavam sem receber há meses.
Assim, a anulação desse processo poderá ser o início de muitas outras anulações, e caso a Justiça caminhe nesse sentido, possivelmente o ex-governador será solto e receberá de volta todos os valores ilícitos que foram apreendidos. Na minha visão, não caberia ao STF analisar esse caso, pois quem verifica se houve o não um erro na distribuição de um processo para um determinado juiz não é o Supremo, mas sim o Superior Tribunal de Justiça. Contudo, o Supremo é a máxima instância, e, caso o pleno do STF decida por manter essa anulação, não há a quem recorrer.
Por conta disso, eu defendo a necessidade de uma reforma na Constituição para que a nossa Suprema Corte seja uma instância exclusivamente constitucional, e que não interfira em processos criminais. Em nenhum outro país do mundo uma Corte Suprema decide se um criminoso será ou não preso ou se seu processo será ou não anulado.
Aguardaremos – sem surpresa – outras anulações do processo de Sérgio Cabral e também de outros grandes corruptos, enquanto grande parte da população brasileira permanece no analfabetismo, sem rede de esgoto, sem um sistema de saúde e educação adequado, e sem o pleno exercício de sua cidadania.
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