Relator de receitas do Orçamento, Oriovisto promete “realismo” e critica reforma do IR

O Ministério da Economia ainda não encaminhou a proposta orçamentária de 2022, o que precisa fazer no máximo até terça-feira (31), mas o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) já prevê disputas políticas em torno do próximo Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), como aconteceu no projeto de 2021, aprovado apenas em março, em que o Congresso subestimou as receitas em relação às despesas.

Eleito o relator de receitas do Orçamento para o próximo ano, Oriovisto promete não medir esforços para que o lado das receitas da peça orçamentária seja a mais coerente possível. “Eu farei das tripas coração para que a receita seja a mais correta e realista possível”, afirma ele, em entrevista à Gazeta do Povo.

O senador falou sobre sua expectativa para a discussão orçamentária e a respeito de outras pautas da agenda econômica no Congresso sem poupar críticas ao ministro da Economia, Paulo Guedes.

Para Oriovisto, a proposta de emenda à Constituição (PEC) para parcelar precatórios “desmoraliza o governo”, e reforma tributária que Guedes mandou ao Congresso – o foco no momento são as novas regras para o Imposto de Renda – não passa de um “remendo”. “Fazer reforma tributária é um trabalho hercúleo, precisa trabalhar com técnicos de todas os tipos, e o governo não fez isso. O que mandaram? Mais um remendo. ‘Ah, vamos criar imposto sobre distribuição de lucros’. Isso é bitributação, porque já tributa o lucro da empresa”, diz.

O senador paranaense também falou sobre o clima político, votações políticas e econômicas que o Senado discutirá, fez críticas ao presidente Jair Bolsonaro e deixou claro ser contrário à discussão do voto impresso. “Na minha opinião, é perda de tempo e não vai acontecer nada”, diz.

O senhor será o relator de receitas do Orçamento. Como funciona isso?

Oriovisto Guimarães: A CMO, como diz o nome, é a Comissão Mista de Orçamento, existem deputados e senadores. Existe um relator da receita e existe um relator da despesa. Obviamente, o relator da despesa é o mais importante, é um deputado. Então, na despesa é que estão os grandes problemas. Ali é que diz onde o governo vai aplicar o dinheiro que recebe. O relator da receita vai, basicamente, conferir, atestar que as previsões de receita do governo são previsões razoáveis, que podem acontecer. A minha função será conferir todas as receitas que o governo diz que vai ter, se são razoáveis, quanto vai receber de impostos nos mais diversos tributos, com que recurso está contando, o que está colocando no Orçamento como receita. Por que é importante ter dois relatores? Para que um não possa adaptar só ao que ele quer. Por exemplo, se fosse um relator único para despesa e receita. Se eu fosse o relator da despesa, eu poderia forçar e dizer que a receita é maior e colocar mais despesas. Aconteceu no [Orçamento] passado. Quero ser extremamente rigoroso, de forma que a receita que o governo prevê arrecadar trata-se de uma previsão, que nunca é exata, mas que seja a mais coerente possível.

O senhor citou os problemas no último Orçamento. Acha que as discussões políticas podem voltar a interferir sobre o debate orçamentário ou, com a base do governo reorganizada com a entrada do Ciro Nogueira na Casa Civil, podemos ver um debate mais pacificado?

Oriovisto: A previsão não é muito boa. Porque está ligado à forma como a política é feita em nosso país. O que os deputados e muitas vezes alguns senadores também querem? Querem levar obras para sua região, para o seu estado. Então, é natural que eu, o [senador] Alvaro Dias [Podemos-PR], o [senador] Flávio [Arns (Podemos-PR)], sempre que pudermos trazer algum recurso do governo federal para o estado do Paraná, diria que é nossa obrigação. Estamos lá para defender e representar o estado, não tem nada de errado nisso. Se fizermos com honestidade pensando realmente no estado do Paraná, acho que está perfeito. Mas se fizermos pensando na nossa reeleição, está errado. Não é por aí. E eu tenho que fazer isso também pensando no Brasil, que tem um tamanho, a receita é limitada, não dá para atender todos os estados, o cobertor é curto. E pelo menos não consegue atender tudo o que os estados querem, atende na medida do que pode. Então, sempre vai haver disputa no Orçamento, é natural. Agora, quando o governo começa a ceder muito ao que se chama de toma-lá-dá-cá, colocar uma verba aqui e lá, desde que vote isso, aquilo e acolá, essa troca é indecente. É essa troca que acaba, primeiro, não prestigiando os objetivos de colocar verba naquilo que o Brasil precisa: uma boa segurança, saúde e educação. Quando o que vale mesmo é o interesse do curral eleitoral daquele senador ou deputado, aí começa a haver desvio.

O senhor identifica esses problemas do toma-lá-dá-cá na atual gestão?

Oriovisto: O governo Bolsonaro se entregou por completo ao Centrão, e a moeda do Centrão é verba para comprar trator e não sei o quê [em referência às verbas que originaram as acusações do Orçamento paralelo]. E dá aquela confusão que deu no Orçamento passado. Colocaram mais despesas do que cabia na receita. E aí fura o teto dos gastos, desrespeita a regra de ouro e as coisas viram um inferno. Meu papel na comissão é relatar a receita e, depois, como membro da comissão, analisar a despesa e votar no sentido de que o Orçamento seja equilibrado e coerente. Agora, não é também uma coisa que se consegue com facilidade não, a briga é intrínseca, própria da política.

Tendo o senhor na relatoria da receita, ajuda a equilibrar as forças entre os interesses políticos que existem e o que o Orçamento, de fato, precisa?

Oriovisto: Entendo que sim, porque, pelo menos, eu farei das tripas coração para que a receita seja a mais correta e realista possível. Por mais boa vontade que eu tenha, por mais técnicas e mais científicas que sejam a previsão, ela é uma previsão, vou prever número X. Nunca vou acertar 100%, pode ser que dê um pouco menos ou mais que X. Pode ser que sejam tantos trilhões e sejam tantos trilhões e meio. Posso errar, aliás, ninguém até hoje conseguiu acertar na mosca. Mas faremos a previsão mais honesta possível.

Já dá para falar em quanto fica a receita para 2022?

Oriovisto: Não, isso é um trabalho a ser feito com várias assessorias. Vamos fazer isso junto com a do Ministério da Economia e os assessores especiais que o Senado tem na área econômica. É difícil dizer algo agora, mas, se tomar por base a receita do governo este ano e se imaginar que vai ter um índice de aumento na atividade econômica, de um modo geral, e que você teve uma inflação, um chute razoável seria alguma coisa com uma receita obtida neste ano mais 10%. Mas isso é um chute do chute do chute. Porque eu estou falando só para te dar uma noção, porque tenho que fazer isso setorialmente. Temos que ver como o desempenho do PIB [Produto Interno Bruto], quanto vai crescer, se vai crescer mais na agricultura, indústria ou serviços. A análise tem que ser feita mais elaborada nas previsões que teremos agora para 2022.

Quando falamos de Orçamento, é importante levar em consideração que o governo precisa de receita também para financiar o novo Bolsa Família. Parte dela viria da tributação de dividendos, que, no entanto, depende da aprovação da reforma do Imposto de Renda. De todo o modo, há uma expectativa de que a arrecadação continue crescendo no ano que vem, porém, em ritmo menor ao deste ano. Dito isso, quais são os principais desafios para se costurar o projeto orçamentário para 2022? 

Oriovisto: Veja, o que o governo não pode fazer é contar com o ovo que a galinha não botou. Essa questão de um novo imposto sobre lucros e dividendos, hoje, eu não posso sequer considerar isso, porque isso não existe, não foi aprovado ainda, não é lei, não está instituído. Aliás, a reforma do Imposto de Renda que estava sendo discutida na Câmara caiu por completo. A maioria dos deputados decidiu retirar da pauta. Nem vejo mais tempo hábil para que se faça qualquer reforma tributária ainda este ano ainda. Podemos discutir reforma tributária, mas o próprio governo levou atrás, porque o relator fez tantas concessões que o governo iria ter prejuízo se fizesse a reforma do Imposto de Renda da forma como o relator deixou. Imposto bom é imposto velho, porque imposto velho ao menos se sabe o quanto arrecada, sabe o quanto arrecadou no ano anterior, tem uma previsão de quando vai ser o aumento do PIB, tem a inflação. Quando cria um imposto que nunca foi cobrado, não tem receita do que vai conseguir arrecadar. Você pode fazer uma imagem, pode fazer uma hipótese, vai dizer: “não, as empresas no seu total distribuem no país inteiro tanto de lucros e dividendos”. Vamos supor que tivesse esse dado. “Ah, vou cobrar 20% sobre isso e vou arrecadar tanto”. Isso é uma hipótese que parece lógica, mas não é, as empresas vão reagir. Se existisse essa nova regra, passariam a distribuir menos lucro e, automaticamente, sua hipótese de receita iria cair. O governo só pode contar com o ovo que a galinha já botou.

Então o senhor trabalhará estritamente com o “ovo que a galinha botou”. Isso facilitará o relatório?

Oriovisto: Facilita, claro que sim, e não pode ser diferente. Para o ano que vem, quais são os impostos e fontes de receita que tem? É com elas que vamos contar. Não posso fazer hipóteses sobre coisas que não existem, porque aí vira uma peça, um delírio, uma imaginação, que bom seria se fosse de tal maneira. Temos que ter os pés no chão e contar com o que realmente existe.

Sobre a reforma do Imposto de Renda, há muitas críticas de que a pauta virou um “toma-lá-dá-cá”, com a possibilidade de aumentar o FPM [Fundo de Participação dos Municípios] como preço para se aprovar o texto. Estados e municípios querem mais R$ 18 bilhões para aprovar o texto. Dito isso, se aprovada na Câmara como está, que respostas o senhor acha que o Senado dará ao texto? 

Oriovisto: Olha, dificilmente isso passa no Senado. Agora, falando de reforma tributária. Se parar para analisar, desde a Constituição de 1988 que se tenta fazer uma reforma tributária e não se consegue. O Lula mandou dois projetos, antes dele, Fernando Henrique tinha feito dois projetos. Às vezes, é aprovado no Senado, não é aprovado na Câmara, e o que nós tivemos desde 1988 para cá sempre foi mais um “remendozinho”. Tivemos cerca de 17 remendos nesse período. Cria mais imposto aqui, mais uma coisinha ali, mas uma visão completa de todos os impostos, uma reforma, de fato, ninguém fez.

Por que é tão difícil fazer uma reforma robusta?

Oriovisto: O que precisava acontecer era sentar todos na mesa para se chegar a um grande entendimento nacional naquele Confaz, a reunião dos secretários de Fazenda de todos os estados, conversar com municípios e simplificar. O que queremos numa reforma? Tornar mais simples, menos impostos. Não esse tanto de impostos. Hoje, 33% de tudo que o Brasil produz vai para o governo. Equivale a dizer que você, eu, todos os brasileiros, trabalhamos quatro meses por ano só para pagar imposto. Isso é um terço do ano, são quatro meses. O Paulo Guedes tem todos os dados e as condições para fazer uma reforma ampla, conversar com estados, municípios, deixar claro para a população como vai ser a nova regra e, aí, sim, poderíamos aprovar isso com apoio de todos e sair uma reforma.

O governo falhou nisso…

Oriovisto: É um trabalho hercúleo, precisa trabalhar com técnicos de todas os tipos, e o governo não fez isso. O que mandaram? Mais um remendo. “Ah, vamos criar imposto sobre distribuição de lucros”. Isso é bitributação, porque já tributa o lucro da empresa. E tem outros falando de criar imposto sobre grandes fortunas, imposto sobre herança. Criar novo imposto é a coisa mais fácil, encontra um fato gerador, qualquer atividade humana pode ser um fato gerador, e cria uma lei sobre essa atividade, que tantos por cento é do governo. O problema é que a nação não suporta mais, atingiu o limite máximo. Agora, onde está a dificuldade? Está no entendimento nacional. As confederações da agricultura, comércio, serviços, os estados, municípios… têm que ser ouvidos, porque o aparato estatal depende dos impostos.

E sobre a PEC dos Precatórios? Que fim o senhor acha que essa pauta terá?

Oriovisto: Eu acho que parcelar precatórios é uma invenção do Paulo Guedes, isso não existe. Tem uma decisão judicial, então, recorra à Justiça e peça para ela parcelar isso. Agora, até pode ser que seja aprovada essa PEC e acho que vai acabar sendo, não tem outro jeito, o governo não tem dinheiro. Mas veja, isso desmoraliza o governo. Isso é o que diminui a confiança do mercado, é o que afasta os investidores, é o que faz o juros subir, é o que aumenta a inflação e faz o dólar disparar. O governo tem que ser o grande garantidor, tem que ser a última palavra e as coisas feitas por ele têm que ser muito sérias. Quando não é, pensam que o país não é sério. A Justiça manda pagar, mas o governo não pode. É uma coisa muito estranha, mas só Deus sabe o que vai acontecer.

E a privatização dos Correios, que foi aprovada na Câmara e chega para ser discutida no Senado. O que podemos esperar? 

Oriovisto: Acho que passa. Eu, particularmente, sou favorável, acho que não é um serviço essencial. Veja, tenho uma concepção muito clara de governo. O governo tem que ser para fazer uma boa educação, boa saúde, boa segurança. Precisamos também de um bom trabalho na Justiça, que precisa ser reformada, de um Judiciário mais ágil. Agora, o governo ter 80, 90 estatais, como tem, é uma barbaridade, nenhum país tem isso. Eu acho que tudo que o governo puder privatizar e o particular puder fazer, deve deixar para o particular. O que acontece com as empresas estatais? Primeiro, que nunca quebram; quando dão prejuízo, o governo cobre com dinheiro público. Segundo, que é um cabide de emprego para influência política. O próprio Correios, como começou o Mensalão? Foi lá, e não há necessidade disso. E aí dizem: ‘ah, se privatizar os Correios, como ficam as pequenas cidades”. Pode fazer regulamentação do edital [de privatização] prevendo que quem ficar [com a estatal] tenha posto de coleta em cada cidade, ainda que de forma criativa, podendo se associar a uma agência bancária local, ter algum caminho para resolver essa questão.

Há riscos de o clima político no Senado contaminar outras votações na Casa, inclusive as pautas econômicas?

Oriovisto: Contamina no sentido de que faz com que se ocupe muito tempo com assuntos que não são relevantes. Poderíamos estar discutindo mais profundamente a privatização dos Correios ou reforma tributária. Nesse sentido, perturba um pouco. Mas a maioria dos senadores, no que diz respeito à pauta econômica, vota independentemente se gosta ou não do presidente. O PT tem por ideologia que não se deve privatizar nada, fazer a reforma trabalhista. Então, aí é um voto mais ideológico, mas a maioria dos senadores são favoráveis a uma pauta mais liberal, e um Estado mais moderno, mais enxuto, e essas matérias serão votadas favoravelmente pela maioria, independentemente se o Bolsonaro cria crise ou não, mas ele atrapalha porque demora para essas pautas entrarem em votação, porque estão todos preocupados com temas como voto impresso. Tira o foco daquilo que é importante, mas só nesse sentido, no resto, cada um vota de acordo com sua ideia ideológica.

Voto impresso. Qual é a opinião do senhor sobre a pauta? Acha que tem chances de ela ser votada?

Oriovisto: Esse ano, não. Esse ano e no ano que vem, não, talvez lá para frente, sim. Acho que todos os assuntos podem ser discutidos, mas não pode ser com base em motivação política, atender interesse pessoal de uma pessoa, tem que ser pensando no país e cá para nós. Me diga uma coisa, eu vivi muitos anos com o voto impresso [em cédula, por preenchimento manual]. Tinha muito mais corrupção do que é hoje, muito mais fraude eleitoral do que é hoje. O voto impresso não vai evitar a fraude. Veja uma coisa: tem 5 mil e poucos municípios no brasil inteiro. Vamos abandonar as urnas eletrônicas e vamos voltar ao voto impresso, fazemos tudo com cédulas, reúnem-se os mesários, pegava os mesários, ia todo mundo despejando as cédulas e contando voto por voto. Em algum lugar vai ter que ser totalizado esses votos, vai ter que ser somado. Como você acha que vai ser transmitido isso aí? Vão ter que colocar em todas as cédulas ou vão passar telegrama, ou por telefone? A informática vai entrar no meio sempre, pode eliminar as urnas, mas continua dependendo das comunicações e da informática. E sempre dá para fazer uma teoria de que alguém via entrar no meio e falsificar uma coisa, transmitir o dado errado. A urna não está ligada na internet. A urna não tem nada a ver com hacker. Você tem que ter contato físico com a urna para adulterar uma coisa. O voto [eletrônico] é auditável, mas isso é outra conversa. Pode ser discutido? Pode. Vai resolver alguma coisa? Na minha opinião, é perda de tempo e não vai acontecer nada.

E a volta das coligações partidárias, que será discutida no Senado pela proposta de reforma eleitoral aprovada na Câmara? Isso passa na Casa?

Oriovisto: Eu ainda não tenho essa leitura. Mas o que eu sinto é que a maioria dos senadores é contrária à volta das coligações, porque isso descaracteriza os partidos. De repente, você quer que as empresas estatais sejam privatizadas, você vai votar num partido que defende essa ideia. Aí, vai votar em um partido que ia privatizar, mas que faz coligação com o PT. Então, você vota num candidato e elege o outro, é o fim do mundo. É uma maneira de burlar o voto do eleitor, sou contra a coligação até debaixo da água. Mas isso vai ser discutido e, a rigor, é imprevisível. Talvez surja uma proposta intermediária e vamos ver o que acontece.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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