No principal jornal do país, um extenso abaixo-assinado de artistas, políticos e celebridades clama pelo fim dos embargos a Cuba. Chico Buarque, Wagner Moura e Lula figuram entre os signatários. Até aí, tudo bem. Podemos imaginar que o jornal seja paulista, que o ano seja qualquer um entre 2003 e 2017. Mas é o New York Times. Chico Buarque, Wagner Moura e Lula são nomezinhos perdidos em meio aos de Jane Fonda e Oliver Stone, do eterno Noam Chomsky e da papisa da ideologia de gênero, Judith Butler. Figuram ainda nomes atrelados ao Black Lives Matter e uma penca de brasileiros esquisitos, como Paulo Roberto da Silva Lima, pertencente aos “Entregadores Antifascistas”. Tem presidente da UNE e gente do PSOL.
Em 2021, temos presidente da UNE junto com Chico Buarque e Jane Fonda no New York Times, num anúncio pago de página inteira, sob o slogan “Let Cuba Live” (Deixem Cuba viver). O mesmo slogan apareceu projetado num prédio da Union Square, no centro de Nova York.
Você pode clicar aqui e ver o site todo bonitinho do Let Cuba Live, com as assinaturas expostas e uma cópia em alta resolução da página inteira do New York Times. De onde virá tanto dinheiro? Da Fundação Ford? Segundo Jaime Bayly, uma página inteira no New York Times custa entre seis e oito milhões de dólares.
Artistas cubanos protestam e fazem abaixo-assinado
Abaixo-assinado e canção de protesto são trade marks das esquerdas latinas. A mania de abaixo-assinados começou na França com o caso Dreyfus; o engajamento dos artistas também deve ser de origem francesa, mas mais antiga, atrelada aos sansimonianos. Com a turma stalinista de Sartre, esse estilo político acabou virando trade mark da esquerda nos anos 1970. Mas podemos dizer que é algo enraizado nas culturas latinas, seja da Europa ou da América.
Pois muito bem: um diretor cinematográfico (Asiel Babastro), aliado a cantores pop (Yotuel, Descemer Bueno mais a dupla Gente de Zona) e dois rappers (Maykel Osorbo, El Funky), fez um videoclipe de protesto contra o regime. Chama-se “Patria y vida” e pode ser assistido clicando aqui. Diz a letra: Já não gritamos “Pátria ou Morte”, senão “Pátria e Vida”.
“Pátria ou morte” é a frase que Che Guevara – que nem cubano era – pôs na boca das massas cubanas durante um discurso na ONU em 1964. O lema “Pátria e vida”, portanto, é um lema anti-Che Guevara. O vídeo no Youtube ultrapassou 7 milhões de visualizações. Conta com 273 mil “gostei” versus 9 mil “não gostei”, além de dezenas de milhares de comentários.
(Enquanto isso, a canção brasileira e antibolsonarista “Desgoverno”, sobre a qual Polzonoff escreveu, conta com menos de 62 mil visualizações, não exibe os polegares para cima ou para baixo e traz fechada a seção de comentários).
Todos os artistas são cubanos. Ao menos um (Yotuel) parece viver em Madrid. O diretor parece viver nos EUA. Mas os demais parecem viver todos em Cuba. A Maykel Castillo, vulgo Osorbo, e a Eliexer Márquez, vulgo El Funky, a participação na canção custou a liberdade. Também pagou o pato Luis Manuel Otero Alcantara. Ele aparece no clipe segurando a bandeira de Cuba e é líder do Movimiento San Isidro, aludido na canção, que promove intervenções artísticas contra o regime. Quanto à Gente de Zona e a Descemer Bueno, xeretei seus canais no Youtube. Têm vídeos bem produzidos e gozam de fama no mundo de língua espanhola. Devem, portanto, ser fonte de dólares para o regime ladrão. Fonte involuntária, claro, como qualquer um que receba dinheiro em Cuba.
Por causa dessas e outras prisões, os artistas cubanos fizeram em maio um abaixo-assinado pedindo a libertação dos presos políticos. As canções de protesto se multiplicam nas comunidades cubanas fora de Cuba.
Se não tiveram vitória, tiveram ao menos algumas conquistas. Maykel Osorbo tomou um chá de sumiço de oito dias, mas já apareceu, embora siga preso. El Funky está sob medida cautelar. Ainda em maio, o líder do San Isidro recebeu “alta” e voltou para casa. Ele, que fazia greve de fome em casa, tinha sido sequestrado para um hospital e deixado incomunicável por um mês, período no qual perdeu a avó. A alta equivaleu a uma soltura. Mas já foi preso de novo.
Depois da feitura desse abaixo-assinado, ainda foi preso o fotógrafo que fez imagens do clipe. Anyelo Troya foi preso e condenado a um ano de cadeia por “desordem pública” por protestar em 11 de julho, mas foi solto depois de muito clamor. Jaime Bayly, jornalista peruano que tem um programa de TV pan-hispânico situado em Miami, havia denunciado na véspera a sua prisão.
Nem Maduro engole mais o embargo
Foi o mesmo Bayly que mostrou também um discurso de Nicolás Maduro contra a lenga-lenga de que países socialistas precisam de comércio com os EUA para prosperar. Com um capacetezinho de pedreiro para a entrega de obras, Maduro discursa: “A Venezuela deve construir sua prosperidade econômica, sua felicidade e seu socialismo contando com o ataque imperialista e sem usá-lo como desculpa. Os denunciamos pelo mundo como atos criminosos, como crimes de lesa humanidade contra a Venezuela. Os denunciamos e os denunciaremos. E seguiremos nossa vida até que suspendam todas as medidas [econômicas] cruéis contra a Venezuela. Mas não as usemos como desculpa”.
Assim como Cuba, a Venezuela está sob sanções dos Estados Unidos. Mas Maduro reconheceu o óbvio: que as sanções não podem ser desculpa para deixar o povo na miséria.
Bayly comenta aquilo que toda a gente informada e de bom-senso sabe: que Cuba é um Estado parasitário. Primeiro chupou a União Soviética e depois teve como sua maior vítima a Venezuela, que está exangue.
Os demais países do Foro de São Paulo financiam Cuba de maneiras variadas, como o trabalho escravo de médicos. É verdade que o Brasil financiou, por meio do BNDES, ditaduras mundo afora. Mas lembrem-se de que esse dinheiro saiu do Brasil por meio de empreiteiras cujo caixa era indiscernível dos fundos eleitorais dos partidos de esquerda. Ou seja: numa obra em Cuba ou na Venezuela, não é certo que todo o dinheiro do BNDES tenha ficado em Cuba ou na Venezuela. O financiamento de ditaduras estrangeiras pode ter sido, ao mesmo tempo, um autofinanciamento da esquerda brasileira.
Perder a Venezuela não é pouca coisa. Lembremos que ela tem as maiores reservas de petróleo do mundo e que um general venezuelano chamado Barroso saiu de lá para o Brasil petista, em 2015, carregando 20 bilhões de dólares da PDVSA. A direita brasileira costuma dizer que tivemos o maior caso de corrupção da história, mas isto é falso. Tivemos o maior caso pego. A Venezuela, cheia de ouro preto e branco (cocaína, movimentada pelo Cartel de los Soles), com certeza é palco de corrupção mais gabaritado que o nosso.
Quebrar a Venezuela foi uma façanha. Ela, sim, era uma galinha dos ovos de ouro. Maduro bem poderia viver só de cocaína e apoiar o discurso oficial de Havana, segundo o qual os países viram sabão se sofrerem sanções dos EUA. Acho que o dinheiro chinês está mandando ali e que escolheu abandonar Cuba à própria sorte. Afinal, o maior capital que Cuba tinha a oferecer eram espiões, que Pequim também tem de sobra, inclusive dentro dos Estados Unidos.
Clima político estranho nas Américas
Mas voltemos ao começo. Não é a coisa mais esquisita do mundo o New York Times publicando o nome de membro brasileiro dos “Entregadores Antifascistas” em anúncio milionário? E, mais ainda, não é estranho que se escolha fazer isso em Nova York enquanto se abandona o Brasil?
Por aqui, a esquerda tem sido discreta ao apoiar a ditadura cubana. Tirando o PCdoB e companhia limitada, o apoio é mais regulamentar do que entusiasmado. Apoiar a ditadura cubana pega mal entre nós, brasileiros.
É de admirar que, com uma dinheirama para gastar com propaganda esquerdista castrista, o local escolhido tenha sido os Estados Unidos, e o local preterido, o Brasil.
Isso depõe a favor da nossa cultura política aqui. E é uma evolução compreensível de nossa parte; afinal, fomos roubados por ladrões cínicos e estamos vacinados contra essa lenga-lenga de embargos. Mas é estranho e pouco compreensível que os Estados Unidos de repente se convertam num asilo para essa ideia velhinha de que Cuba só é pobre por causa dos embargos. E se somarmos isso à conduta da Casa Branca com os cubanos, então… Só podemos inferir que há algo de pode e inédito por lá.
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