O “cancelamento” de Moro e o ataque à pluralidade na academia

O ministro da Justiça e ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro, falou pela primeira vez nesta segunda-feira (11) sobre a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado e preso por ele na operação. O petista foi solto depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ilegal a prisão em segunda instância, na semana passada.

A “vingança dos corruptos”, de que tão acertadamente falou Luís Roberto Barroso durante o julgamento que manteve a suspeição do ex-juiz Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá, não ocorre apenas dentro dos três poderes. Ela só é possível porque também existe toda uma série de linhas auxiliares, formadas por pessoas que não participam de ato ilícito algum, mas que criam um arcabouço intelectual para a narrativa que transforma os bandidos em vítimas. Tais linhas auxiliares estão presentes especialmente na imprensa e na academia, e uma demonstração de seu modus operandi acaba de ser vista neste fim de semana, envolvendo o convite e o posterior cancelamento da participação de Moro no III Encontro Virtual do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito do Brasil (Conpedi).

No sábado, dia 19, o Conpedi anunciou a programação do evento e informou que Moro coordenaria, na próxima sexta-feira, um painel com o tema “O papel do setor privado em políticas anticorrupção e de integridade”. A claque contrária a Moro e à Operação Lava Jato reagiu instantaneamente nas mídias sociais e o Conpedi respondeu no dia seguinte. Em nota, anunciou, de forma um tanto contraditória, que, embora nunca renuncie “aos princípios democráticos e da pluralidade de ideias que permeia o ambiente acadêmico”, estava exatamente renunciando aos princípios democráticos e à pluralidade de ideias, pois deixara a turba se impor pela intimidação, cancelando o painel e a participação de Moro – que, recorde-se, também tem carreira no mundo acadêmico, tendo sido professor da Universidade Federal do Paraná.

Juristas que valorizam a justiça e a verdade jamais compactuariam com um ataque grosseiro à liberdade de debate característica do ambiente acadêmico, nem com esta agressão à liberdade de expressão que consiste na pressão para calar Moro

Os canceladores não se deram por satisfeitos e, mesmo após a decisão de não se realizar mais o painel, seguiram repudiando publicamente o fato de o Conpedi ter convidado Moro para seu evento. O comunicado, com 125 assinaturas, é muito mais obra de militantes partidários ideologizados que algo saído da pena de “juristas, professores e professoras de programas de pós-graduação em direito do Brasil”, até porque não esboça argumento técnico ou jurídico algum, limitando-se a repetir alguns dos mais batidos – e falsos – clichês inventados pelo petismo para atacar a Lava Jato, como o de que a operação “gerou incontáveis prejuízos materiais, financeiros e simbólicos ao país”, como se fosse o combate à corrupção, e não a corrupção em si, que causasse prejuízos ao Brasil e arranhasse a imagem da nação.

Não faltaram, obviamente, as menções à decisão do STF que considerou Moro suspeito – não “nos processos que dirigiu”, como diz o texto militante, mas em um único processo envolvendo o ex-presidente Lula – como argumento para que ele não participasse do evento. Mas juristas dignos deste nome jamais teriam ignorado que se tratou de decisão teratológica do Supremo, repleta de circunstâncias que são motivo de vergonha para a suprema corte, e não para Moro, que sempre se conduziu com lisura nos processos que julgou. Não há, no texto dos ditos “juristas”, uma única palavra sobre a manutenção de um habeas corpus impetrado dentro de um processo considerado nulo; nem sobre a inexplicável mudança de voto de Cármen Lúcia na Segunda Turma; nem sobre o fato de atos que se deram estritamente dentro dos limites da Constituição e dos códigos legais terem sido arbitrariamente transformados em abusos ou ilegalidades pelos ministros do STF.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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