Reações como dor no braço, dor de cabeça, mal estar e febre são comuns após a aplicação das vacinas contra a Covid-19, seja qual imunizante for. O que nem todo mundo sabe, porém, é que esses sintomas podem indicar que o organismo está atingindo o objetivo principal da vacina: aprender a se proteger.
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Ao instigar o sistema imunológico a produzir os anticorpos contra o coronavírus, a vacina acaba desencadeando uma inflamação. Esta reação inflamatória, por sua vez, leva ao surgimento dos sintomas, que tendem a desaparecer entre 24 a 48 horas após a aplicação.
Mas quem não teve febre ou mal estar não precisa se preocupar. A ausência dos sintomas não indica um fracasso do imunizante, segundo explica Isabella Ballalai, médica pediatra e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações.
“A reação inflamatória produzida pela vacina está relacionada à eficácia, mas não significa que na pessoa que não teve nenhuma reação, [a vacina] não funcionou. Mas, quanto maior for a reação inflamatória, maior a chance de efeitos adversos”, detalha.
Diferença de idade nas reações
Uma situação que tem sido vista na campanha contra a Covid-19, segundo Ballalai, é a diferença de idade nas reações adversas. Na maior parte das vezes, as pessoas idosas têm tido menos reações em comparação aos mais jovens.
Isso se explica pelo envelhecimento do sistema imunológico, ou a imunossenescência. Ao envelhecermos, as células de defesa precisam de um tempo a mais para reagirem, e a resposta às vacinas pode ser menor – tanto na questão da eficácia/efetividade quanto nos efeitos adversos.
Em um estudo divulgado no fim de maio, pesquisadores brasileiros viram que a efetividade da Coronavac – vacina desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac e produzida pelo Instituto Butantan – diminuía conforme a idade do paciente avançava. A partir dos 80 anos, foi calculada em 28%.
Isso, no entanto, não é surpresa para os especialistas. “Eles [idosos] respondem pior [às vacinas], e isso é natural para qualquer vacina, não apenas para aquelas contra a Covid-19. Mas os idosos também têm uma reação inflamatória menor e, portanto, menos reações adversas. Isso não é demonstrado, mas é o que a gente entende e temos visto”, destaca Ballalai.
E as tromboses?
No início de abril, a agência regulatória de medicamentos na Europa confirmou que a vacina desenvolvida pela AstraZeneca/Oxford/Fiocruz estava associada a eventos trombóticos. No entanto, são raros.
De acordo com o parlamento do Reino Unido, que vem acompanhando os casos, entre dezembro de 2020 e maio de 2021 foram registrados 260 casos de VITT, ou trombose associada à vacina, entre as 30,8 milhões de doses aplicadas no Reino Unido.
Com isso, o risco estimado de VITT foi de 10,9 por 1 milhão de doses aplicadas, e varia de acordo com a idade da pessoa. Acima dos 50 anos, o risco é de um caso para cada 100 mil pessoas vacinadas. Entre os 18 e 49 anos, um caso para cada 50 mil vacinados.
Pesquisadores da província de Ontario, no Canadá, também estimaram o efeito adverso em diferentes países que aplicaram o imunizante. Eles calculam que o risco varia entre 1 caso para cada 26,5 mil vacinados a 1 caso para cada 127,3 mil vacinados.
De acordo com Ballalai, é preciso destacar que a trombose relacionada à vacina, além de rara, é diferente daquela já conhecida. “A trombose da vacina é uma reação autoimune. O organismo que produz anticorpos contra as nossas plaquetas”, explica a especialista.
As tromboses mais conhecidas, que podem surgir após procedimentos cirúrgicos ou em aviões, por exemplo, estão associadas a problemas de coagulação. “A pessoa que teve uma trombose um dia não está em um grupo de risco para um evento adverso trombótico da vacina. O diagnóstico é diferente”, esclarece a especialista.
A trombose associada à vacina pode aparecer entre quatro a 28 dias após a aplicação, e os sinais de alerta são:
- Dor de cabeça persistente;
- Pressão/peso na perna;
- Dor abdominal persistente;
- Falta de ar;
- Manchas pequenas de sangue sob a pele;
- Dor ou inchaço nas pernas;
- Dor no peito;
- Visão turva.
Como cuidar dos sintomas?
No fim de maio, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) fez um alerta sobre os riscos no uso indiscriminado do paracetamol – medicamento usado para controle dos sintomas após a vacinação. Segundo a agência, o uso da substância sem orientação poderia levar a “eventos adversos graves, incluindo hepatite medicamentosa e morte”.
Para Ballalai, como a maioria dos sintomas tende a desaparecer após dois dias, não se espera que a população faça um uso exagerado da medicação. As doses máximas de paracetamol, de acordo com a idade, descritas pela Anvisa são:
- Adultos e crianças acima de 12 anos: dose máxima de 4 gramas em um dia;
- Crianças entre 2 e 11 anos: não devem ser utilizados mais de 50-75 mg/kg em um dia (24 horas);
- Crianças abaixo de 11 kg ou 2 anos: consulte o médico antes de usar.
A especialista lembra que, caso seja necessário, as pessoas podem adquirir remédios analgésicos, contra a dor, ou antitérmicos, contra a febre, mas não os anti-inflamatórios.
“A reação da vacina implica em uma inflamação, e atrapalhar essa resposta do organismo não é uma boa ideia. Não é que a pessoa não possa tomar, depende da situação, mas em geral é melhor evitar”, explica.
Reações diferentes
Vacinas podem apresentar reações diferentes, de acordo com o tipo de plataforma adotada. No Brasil, por exemplo, estão sendo aplicadas três tipos de vacinas anticovídicas até o início de junho e cada uma instiga o sistema imunológico de uma forma.
O imunizante Coronavac usa o coronavírus na forma inativada, ou “morta”, incapaz de gerar a doença. Já a vacina da Pfizer/BioNTech usa uma tecnologia mais moderna, do RNA mensageiro. Com esta estratégia, apenas um filamento de informação genética do coronavírus é entregue ao sistema imunológico, envolvido em uma cápsula de gordura.
No caso da vacina da AstraZeneca/Universidade de Oxford/Fiocruz, a plataforma escolhida foi o vetor viral. Informações genéticas do coronavírus são entregues ao organismo via outro vírus. Os pesquisadores optaram pelo adenovírus, agente causador do resfriado comum em chimpanzés.
“Normalmente temos vacinas basicamente iguais, contra a mesma doença, mas de diferentes marcas. Desta vez são vacinas diferentes, com eventos adversos diferentes. Mas o que há de comum: são eventos diferentes relacionados à inflamação. Desde uma inflamação simples, que é o que acontece com a maioria, com mal estar e dor no local da aplicação, e até eventos adversos mais graves”, explica Ballalai.
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