A ampla utilização de geladeiras mais eficientes do ponto de vista energético poderia reduzir a conta de luz dos brasileiros em R$ 101 bilhões na próxima década. O dado é resultado de um estudo realizado pelo Instituto Escolhas, associação civil que produz análises sobre sustentabilidade. O trabalho compara os gastos com energia dentro dos parâmetros de eficiência energética atualmente aplicados no Brasil com a economia que seria alcançada a partir da adoção de critérios mais rigorosos, seguindo padrões indicados internacionalmente.
Os refrigeradores foram escolhidos como foco do estudo porque, sozinhos, são responsáveis por um terço do consumo residencial de eletricidade no país. Conforme o Escolhas, caso o Brasil seguisse desde já as recomendações do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), cada consumidor brasileiro pagaria R$ 30 a menos na sua conta de energia, totalizando uma economia de R$ 360 ao ano – a estimativa se baseia no consumo médio de uma geladeira frost free com freezer combinado, modelo mais vendido no mercado brasileiro.
O Instituto Escolhas avalia ainda que haveria ganhos para o país: além de pesar menos no bolso do consumidor, a energia que deixaria de ser consumida graças à maior eficiência dos equipamentos aliviaria a sobrecarga do sistema energético brasileiro. A energia poupada até 2030 por geladeiras que gastam menos luz seria suficiente para abastecer 98% das residências brasileiras durante um ano.
Mesmo as geladeiras mais eficientes gastam muita energia
O comparativo feito pelo Instituto Escolhas chama a atenção para o fato de que, hoje, mesmo os equipamentos assinalados no Brasil como mais eficientes ficam aquém da performance que poderia ser alcançada em termos de economia de energia. A defasagem se deve à falta de atualização do Programa Brasileiro de Etiquetagem, do Inmetro.
O PBE serve para orientar o consumidor no momento da compra. Ele avalia produtos com base em seu desempenho em uma série de critérios e traduz os resultados em etiquetas que são afixadas nos produtos, compostas por faixas coloridas e de fácil compreensão, mostrando a classificação conquistada por aquele item. No caso da eficiência energética, a classificação vai de A (mais eficiente) a E (menos eficiente), em que se entende como superiores os equipamentos que utilizam melhor a energia, têm menor impacto ambiental e custam menos para funcionar, pesando menos no bolso.
Os fabricantes que alcançam a classificação A recebem subsídio do governo, com redução no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que cai de 15% para 10%. A desoneração é de cerca de R$ 500 milhões ao ano, e serve de incentivo para o investimento em eficiência energética.
Entretanto, os parâmetros não são alterados há 15 anos, fazendo com que a maioria dos produtos atualmente no mercado já estejam nesse patamar. Na avaliação do Instituto Escolhas, isso significa que os critérios para a avaliação de eficiência não condizem com o desenvolvimento tecnológico da indústria, enfraquecendo a política de incentivos em vigor.
Atualização completa dos parâmetros de eficiência levará quase dez anos
O Inmetro prevê a adoção de novos parâmetros de modo escalonado, com três fases entre junho de 2022 e dezembro de 2030. A atualização foi colocada em consulta pública em abril. A previsão é de que a partir da terceira etapa o país adote na íntegra o que prevê a United for Efficiency (U4E, ou “Unidos pela eficiência” na livre tradução), referência internacional para o tema.
A iniciativa, liderada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, apoia a transformação dos mercados globais com o objetivo de economizar até 20% do consumo de eletricidade e se concentra principalmente em países em desenvolvimento e economias emergentes, onde a demanda pela energia deve mais que dobrar até 2030. A estratégia do programa é acelerar a transição para produtos de alta eficiência, com destaque para iluminação, ar-condicionado, refrigeradores residenciais, motores elétricos e transformadores.
É a partir dos critérios apontados por ela que o estudo do Instituto Escolhas indica as chances de economia de R$ 101 bilhões entre 2021 e 2030, contra apenas R$ 17 bilhões que seriam poupados após a adoção da revisão mais branda proposta agora pelo Inmetro, que só adotará integralmente os critérios mais rígidos ao fim desse período.
A proposta de atualização do Programa Brasileiro de Etiquetagem define a reclassificação das categorias de eficiência energética das geladeiras comercializadas no Brasil, adotando gradativamente níveis de consumo mais rigorosos nos próximos dez anos. A expectativa é de que, em 2030, um refrigerados classe A tenha consumo reduzido em 63%, em média, na comparação com os equipamentos que estão no topo da tabela de hoje.
O que prevê o Inmetro
Os avanços nos parâmetros de eficiência energética exigidos para os refrigeradores foram organizados em três fases distintas. A primeira delas, com prazo de adequação até 30 de junho de 2022, introduzirá temporariamente as subclasses A+, A++ e A+++ para indicar refrigeradores que sejam 10%, 20% e 30% mais eficientes do que a atual classe A, respectivamente.
A segunda fase do aperfeiçoamento, com prazo de adequação até 31 de dezembro de 2025, elimina as subclasses e retorna a etiqueta ao tradicional ranking de A a F, mas com um novo topo de eficiência. Aqui a classe A passa a ser definida parcialmente com base nas recomendações da ONU, submetidas a “fatores de correção à realidade nacional”, segundo o Inmetro. Essas correções reduzirão de 63% para 44% a economia de energia que as geladeiras terão de garantir na comparação com os atuais modelos A para permanecerem nessa classificação.
Por fim, a terceira fase de atualização do PBE estabelece a adoção na íntegra das recomendações da U4E, a partir de 31 de dezembro de 2030. Só nesse momento a classificação de maior eficiência será concedida para equipamentos que consumam 63% menos na comparação com a atual classe A.
Segundo a coordenadora do programa de etiquetagem, Danielle Assafin, “assume-se que o prazo de nove anos para a terceira fase é necessário para dar sustentabilidade aos investimentos que a indústria nacional precisará realizar em sua plataforma de produção para manter seu portfólio de produtos, ou parte dele, em A”.
Ainda de acordo com o Inmetro, “a proposta foi elaborada após intensas discussões com todas as partes interessadas, de fabricantes a entidades de defesa do consumidor, e se baseou em ampla revisão sobre os níveis praticados no mundo, em padrões de ensaios para cálculo do consumo de energia e na identificação das diferentes necessidades das partes interessadas”.
Foi, de acordo com a autarquia, um processo que exigiu profundo exercício de conciliação de interesses “em direção a ampliar os benefícios da etiquetagem à população brasileira, nos aspectos social, ambiental e econômico”, destaca a coordenadora.
Essa avaliação é rebatida, entretanto pela coordenadora de projetos do Instituto Escolhas, Rafaela Silva. Segundo ela, “a indústria tem se valido do argumento de que se os critérios forem alterados agora ou forem muito rígidos, perderão o subsídio do IPI e repassarão esse custo ao consumidor. Mas isso não pode ser usado como argumento para atrasar a política de eficiência”.
A avaliação apontada é de que o subsídio recebido pela indústria com a desoneração é de R$ 81,93 por geladeira, valor inferior à economia que seria viabilizada com critérios mais pesados. “Mesmo que o consumidor tenha que arcar com esse valor quando comprar um novo equipamento, ele logo será compensado, pois a economia na conta de luz com geladeiras mais eficientes pode chegar a R$ 360 todos os anos. Ou seja, o consumidor apenas ganha com uma política mais forte de eficiência”, completa.
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