Por que o investimento produtivo é baixo no país, e como isso limita o crescimento

Os últimos dez anos foram uma década perdida para o Brasil. Enquanto a economia mundial crescia num ritmo médio de 2,7% ao ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a brasileira cresceu cerca de 0,3% ao ano, de acordo com o IBGE. O resultado é que o país perdeu relevância no cenário internacional. Em 2010, era a sétima economia global; dez anos depois, caiu para a 12.ª posição.

Uma das travas ao crescimento no longo prazo do Brasil é a baixa capacidade de investimento na economia. No ano passado, a taxa fechou em 16,43% do PIB, segundo o IBGE, a maior em cinco anos e o terceiro crescimento seguido. Apesar do avanço, o número está no mesmo nível de 2003 e aquém do registrado em economias desenvolvidas, onde a taxa oscila entre 20% e 25% do PIB.

“O patamar ideal para o Brasil seria de taxas superiores a 20%, que propiciariam a obtenção de ganhos de produtividade”, diz Leonardo Mello de Carvalho, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

E o crescimento da taxa de investimento no ano passado não foi resultado de um aumento do investimento em si. A explicação é a seguinte: a formação bruta de capital fixo (FBCF) – indicador que reflete os gastos em máquinas, equipamentos e construção e serve de referência para o cálculo do investimento – caiu 0,8% no ano passado. Mas aumentou em relação ao PIB, porque este encolheu muito mais: 4,1%.

Os números poderiam ter sido ainda piores, segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV), se não houvesse a inclusão de um artifício contábil: a importação fictícia de plataformas de petróleo, dentro de um regime especial para o segmento petrolífero, que vigorou até o fim do ano passado. Sem esse efeito, a FBCF teria encolhido entre 3,4% e 8%.

Falta de poupança interna

O economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato Fonseca, aponta que um dos principais problemas é a falta de geração de poupança doméstica. No ano passado, ela correspondeu a 15% do PIB, ante 12,5% em 2019, num crescimento puxado pela “poupança forçada” feita por famílias e empresas durante a pandemia. A taxa, no entanto, ainda é considerada baixa. “Isto obriga que a gente capte poupança externa para financiar o investimento”, diz.

Uma das dificuldades é uma questão cultural: o brasileiro não está acostumado a poupar. Nos Estados Unidos, ele lembra que as pessoas são obrigadas a poupar para pagar a educação dos filhos, para garantir tratamento médico e para ter reservas para a aposentadoria. “É uma poupança precaucional.”

Um problema no Brasil é que o Estado não poupa. No ano passado, o déficit das contas públicas (diferença entre o que o governo arrecada e gasta) foi de 9,49% do PIB, o pior resultado desde 2001, e que correspondente a um rombo de R$ 702,9 bilhões. Os auxílios concedidos a empresas e pessoas, por causa da pandemia da Covid, respondem por R$ 561,3 bilhões desse déficit, aponta a FGV. Mesmo sem eles, no entanto, o país já teria fechado as contas com um saldo negativo de mais de R$ 140 bilhões.

Outro problema, levantado por Carvalho, do Ipea, é o mercado de crédito pouco desenvolvido no Brasil. Segundo o Banco Central, o saldo total de empréstimos no Sistema Financeiro Nacional corresponde a 54% do PIB. Em outros países latino-americanos, como o Chile, essa taxa é de 100%. E nos países desenvolvidos supera os 130%.

Ambiente de incertezas dificulta tomada de decisão

Contra o Brasil também pesa o elevado ambiente de incertezas na economia. Indicador da FGV mostra que o nível de incerteza recuou em fevereiro e março, mas segue acima dos níveis registrados antes do início da pandemia.

“A queda do indicador de incerteza em março foi motivada exclusivamente pelo recuo do componente de mídia, aparentemente como um reflexo do avanço das campanhas de imunização conta a covid-19 no Brasil. O recrudescimento da pandemia e seu difícil controle, por outro lado, são refletidos no componente de expectativa, que voltou a subir no mês, retratando o enorme desafio de se prever cenários econômicos para os próximos 12 meses”, disse Anna Carolina Gouveia, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), em nota sobre o resultado de março.

“Mesmo com a queda, o nível de incerteza [de 123,5 pontos em março] continua elevado, tanto em relação ao nível neutro em termos históricos (100 pontos) quanto em relação ao nível médio de 114 pontos vigente entre 2015 e 2019”, completou a economista.

Segundo Carvalho, o elevado nível de incertezas na economia contribui para uma maior dificuldade na tomada de decisão. “Ajuda a manter o custo de crédito elevado.”

As reformas, cuja tramitação está travada no Congresso, também têm um papel relevante no estímulo ao investimento. Elas ajudam a ancorar a dívida pública, cuja taxa em relação ao PIB está próxima dos 90%. E o câmbio seria menos impactado.

Carvalho aponta que elas são fundamentais na formação das expectativas. “O investimento depende da confiança no futuro da economia. Se não se sabe que a economia vai estar saudável, não há investimento.”

Além de diminuir o risco e a incerteza sobre o ambiente econômico, as reformas permitiriam, segundo especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, que o governo realizasse mais investimentos públicos, seja por exigência constitucional – na educação e na saúde -, seja em obras públicas.

Incertezas afetam setor de máquinas e equipamentos

O cenário de incertezas foi um dos fatores que contribuiu para a baixa relação entre investimentos e vendas do segmento de máquinas e equipamentos. Esta proporção foi de 3,4% em 2020. Em 2007, era de 14,4%.

Segundo o presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), João Marchesan, aponta que a retração está relacionada à baixa demanda, ao cenário de incertezas e às taxas de juros que historicamente competem com os investimentos industriais.

“Mesmo o Brasil tendo saído da crise de 2015-16, quando o PIB recuou em média 3,4% ao ano, o desempenho de sua economia continuou fraco – crescimento médio ao redor de 1,5% a. a. – nos anos que se seguiram, portanto com elevada ociosidade nos fatores de produção, o que justifica parte da queda nos investimentos”, diz o dirigente empresarial.

Em síntese, segundo Renato Fonseca, da CNI, falta um bom ambiente macroeconômico. A falta de condições melhores volta e meia obriga o governo a dar uma travada na economia para impedir maiores problemas.

Investimento tem impactos de longo prazo

O economista aponta que a baixa taxa de poupança gera impactos de longo prazo. “Se quisermos que nossos netos consumam mais, temos de poupar mais.”

Outros problemas causados pela baixa poupança e pelo baixo investimento são a tendência ao aumento da pobreza e a perda de força e competitividade da economia. “Nos últimos dez anos, a indústria brasileira encolheu”, cita o economista da CNI.

Ele afirma que as empresas brasileiras vêm perdendo eficiência tecnológica. “É um problema causado pelas dificuldades que temos na educação. Temos dificuldade em aprender novas tecnologias.”

Não bastasse isso, o Brasil sofre com um sistema tributário que gera cumulatividade, é complexo, favorece as brigas entre governo e contribuintes, e penaliza os segmentos que agregam mais valor aos seus produtos e serviços.

A infraestrutura também é deficiente. Um estudo feito pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) mostra que o investimento público e privado em rodovias foi, no ano retrasado, o menor desde 2010. E a instabilidade jurídica é grande.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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