– Tá acompanhando a CPI?
– Tô.
– Muito legal, né?
– Muito. Adoro CPI.
– Eu também. Tava com saudade.
– Não sei por que deixaram a gente tanto tempo sem CPI.
– Absurdo. A gente vota nos caras pra ter distração e os caras não cumprem.
– Agora você falou tudo.
– Só repeti o que todo mundo sabe. Político não cumpre promessa.
– Não, falei da distração. Nunca tinha pensado nisso.
– O que?
– Que a gente vota pra se distrair. Não tem nada a ver com política.
– Aí você já radicalizou. Um pouquinho às vezes tem.
– É. Às vezes tem. Mas é raro. Lembra o governo Lula?
– Mais ou menos.
– Pois é. Eu lembro bem.
– Prova de que você não é tão distraído.
– Verdade. Mas estou me curando.
– Que bom. O importante é se distrair. Mas o que tem o governo Lula?
– Foi um fenômeno interessante. Começou com uma política macroeconômica responsável, consolidando o Plano Real. Ou seja, um tédio.
– Foi chato mesmo esse período. Tanto que eu nem lembrava.
– Aí veio o mensalão e animou. Nunca mais o Lula saiu das manchetes.
– Bem observado. Se não fosse o mensalão talvez ele nem tivesse sido reeleito.
– Com certeza não. Seria esquecido.
– Engolido pelo tédio.
– Exatamente.
– Por isso hoje a gente deve muito à dupla R & R.
– R & R?
– Renan e Randolfe. Eles vieram salvar o país do marasmo com essa CPI.
– Aí vou ter que discordar. Marasmo? No meio de uma pandemia?
– É. Já estavam vindo com esse papo no Congresso de retomar reformas. Imagina o tédio?
– Ah, entendi. Verdade. Basta começarem a falar na TV de reforma administrativa que eu pego no sono.
– E a tributária? IVA, ISS, agregado… Quando chega no imposto em cascata eu já estou sonhando com o Ciro Gomes.
– Faz sentido. Cascata por cascata, pelo menos o Ciro Gomes grita.
– Esses burocratas falando baixinho de cumulatividade e incidência em cadeia deviam ser proibidos no horário nobre.
– Falam em cadeia sem o menor conhecimento de causa. Por isso é bom ouvir o Lula.
– Exato. Fala do que sabe, do que viveu.
– Ciro Gomes também.
– Conhece cadeia?
– Não. Mas contratou o João Santana, que não só foi preso como é o autor da estratégia que empoderou o maior ladrão do país.
– Aí sim o voto vale a pena. Senão a gente ia ficar falando de que? Reformas?!
– Ninguém merece. Falando em reformas, temos que tirar o chapéu pro STF.
– Por quê?
– Colocou o Lula na eleição do ano que vem. Vamos poder voltar a falar das reformas do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia.
– Ufa. E a gente achando que nunca mais ia poder discutir reforma boa nesse país… Ponto pro STF.
– E ponto pro Renan Calheiros, pro Randolfe Rodrigues e demais guerreiros da nova CPI. Ninguém pode negar: era claríssimo o risco de afundarmos de novo naquelas reformas entediantes e tecnocráticas que ficam discutindo custo Brasil e não divertem ninguém.
– Graças a eles vamos voltar a ver show do Mandetta.
– Será que ele vai sambar no pé de novo?
– Se o Renan pedir ele samba.
– Mas não vai ter aquele baixo astral de covidão e desvio de verbas emergenciais não, né?
– Nada. Só alegria.
– Então viva a CPI!
– Viva!
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