Uma coisa que os políticos brasileiros aprenderam há muito tempo, com curso de pós-graduação fornecido pelo Supremo Tribunal Federal, é virar juiz de alguma coisa, em todas as oportunidades que lhes aparecem pela frente. É automático, ou pelo menos é assim que raciocinam: o melhor jeito de escapar da polícia é sair gritando “pega ladrão”. Como se sabe, pelo menos um terço de todo o Congresso brasileiro tem problemas com o Código Penal — possivelmente, a maior concentração per capita de gente enrolada com a Justiça, num ambiente só, que existe fora das penitenciárias em todo o território brasileiro.
É natural que utilizem as suas “imunidades parlamentares” para ficarem fora da cadeia — e que, além disso, vivam brigando para fazer o papel de julgadores. Enquanto estão julgando os outros, com pose de justiceiros, eles próprios não são julgados.
Estão nessa vida há anos, ou até décadas. Já se viu aí todo o tipo de absurdo, mas poucas vezes exageraram tanto como nessa “CPI da Covid” que o Senado inventou para apurar incompetência, corrupção e outras coisas horríveis na administração da covid, e que começa nesta terça-feira (26) a sua atividade. Veja só quem participa da CPI, no papel de polícia correndo atrás de bandido — e acredite se quiser.
Está lá, na primeira fila, ninguém menos que o senador Renan Calheiros (MDB-AL), dono de uma das mais prodigiosas folhas corridas da história penal do Brasil; nem os seus advogados sabem ao certo quantos processos ele tem hoje nas costas. Há 30 anos vive fugindo, através de truques diversos, do seu encontro com a lei – trata-se de um verdadeiro maratonista, como descreveu o jornalista Augusto Nunes. Sua medalha de ouro é a participação na lista de políticos comprados que a empreiteira Odebrecht mantinha nos computadores do seu “departamento de corrupção”. Seu apelido (cada um tinha o seu apelido, ali) é “Atleta”.
Pode parecer uma piada macabra, mas não é: uma das condições mais importantes para alguém ser juiz na CPI da Covid é fazer parte da lista de codinomes registrados no “departamento de corrupção” da Odebrecht. Ao lado de Renan, estão ali gigantes como Humberto Costa (o “Drácula”, por seu envolvimento na máfia dos ladrões de sangue quando era ministro da Saúde de Lula), ou Jader Barbalho (o “Wiskey”, pelos motivos que se pode imaginar; seu filho, o atual governador do Pará, Helder Barbalho, é o “Cavanhaque”). Detalhe: o Pará é um dos estados onde mais se roubou dinheiro público destinado ao combate da epidemia, segundo as denúncias correntes.
Não é preciso ser um nenhum doutor em ciência política para ver o que muitos membros da CPI estão fazendo lá. Desde o aparecimento da Covid, um ano e pouco atrás, cerca de R$ 60 bilhões de em verbas federais foram entregues aos estados — e uma grande parte dessa pilha de dinheiro, por conta da situação oficial de “emergência”, foi gasta sem licitação pública e outros controles legais. Como foi fartamente noticiado, as ”autoridades locais” roubaram de tudo: respiradores, máscaras, luvas, aventais cirúrgicos, diárias de UTI, desinfetante, o diabo.
Por que não? No governo Lula roubaram até sangue — e o ministro da Saúde de então é um dos juízes da ladroagem de hoje. É assim que funcionam as sagradas “instituições democráticas” do Brasil.
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