Drei Brasilianische Helden: a história de três heróis brasileiros que lutaram contra o nazismo

Dentre as muitas histórias de heroísmo da FEB destaca-se a de 3 brasileiros enterrados com honras pelos próprios inimigos.| Foto: Reprodução/ Facebook

Nesta semana o Brasil perdeu mais um integrante da Força Expedicionária Brasileira a lutar contra as tropas da Alemanha nazista na Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Justino Alfredo, nascido em 24 de setembro de 1919, em Campinas, foi convocado aos 21 anos para integrar o Sexto Regimento de Infantaria, o chamado “Regimento Ipiranga”. Ele participou de todas as batalhas da tropa até o final da guerra. Alfredo sobreviveu à Covid-19, mas não aos problemas renais que o afligiam.

Nada mais justo que se homenageie a história de outros personagens que também participaram desse conflito e que mereciam ter seu nome e sua história lembrados com frequência e carinho pelos brasileiros: os chamados Três Heróis Brasileiros.

Contexto

No começo de 1945, o regime nazista de Adolf Hitler já se encontrava cercado pelas forças Aliadas. Depois do desembarque de tropas inglesas, americanas e canadenses na Normandia e da invasão dos soviéticos pelo Leste Europeu, a situação dos alemães já era desesperadora. Além disso, a perda da Itália, com a queda de Mussolini pela insatisfação do próprio povo italiano e a subsequente invasão Aliada através da Sicília, colocou-os na situação de terem que lutar pela própria sobrevivência.

A Itália foi palco de algumas das batalhas mais ferozes de todo o conflito. À medida que os Aliados avançavam, os alemães se entrincheiravam em pequenas cidades montanhosas ao longo do centro e norte da península, na chamada Linha Gótica, a linha defensiva que ainda mantinha o controle do norte da Itália sob o jugo alemão. Construída com o trabalho forçado de dezenas de milhares de prisioneiros de guerra e minorias escravizadas pelos nazistas, como os judeus, a Linha consistia de milhares de casamatas, bunkers, postos de observação e artilharia destinados a impedir qualquer aproximação das forças aliadas.

Durante meses, tropas americanas e inglesas, com a ajuda de diversos outros países, entre eles o Brasil, tentaram romper, sem sucesso, essa barreira. Os alemães resistiam ferozmente, com duas divisões da Wehrmacht, além do Exército da Ligúria, as tropas italianas enviadas por Mussolini que, depois de seu resgate espetacular da prisão onde os Aliados o mantinham cativo, exercia o papel de fantoche do governo nazista na chamada “República Social Italiana”, a célebre República de Salò.

Um ano antes, os Aliados já tinham tentado uma ofensiva gigantesca para penetrar o bloqueio alemão. Enquanto os britânicos atacaram a região costeira do Mar Adriático com seu 8º Exército, que tinha participado do cenário africano da guerra, os americanos concentraram suas forças no região central da cordilheira dos Apeninos, numa tentativa de estabelecer uma posição vantajosa no vale do Pó. A ofensiva, no entanto, foi frustrada, entre outras coisas, pela severidade do inverno daquele ano e do começo do ano seguinte.

Com a chegada da primavera, uma nova ofensiva colossal foi planejada, denominada Operation Grapeshot, para romper definitivamente a Linha Gótica. Embora as tropas britânicas estivessem consideravelmente reduzidas, com o deslocamento de muitas de suas divisões de infantaria e brigadas para outros cenários da guerra, eles ainda mantinham uma presença considerável na Bota, inclusive com tropas neozelandesas. Os americanos tinham ao seu lado tropas de diversos outros países, entre eles os poloneses, o Esercito Cobelligerante Italiano, formado pela resistência a Mussolini, e a Força Expedicionária Brasileira, enviada por Getúlio Vargas (depois de alguma resistência e hesitação) para ajudar na tomada do território italiano.

Montese

Depois de uma série de batalhas bem-sucedidas, os Aliados gradualmente começaram a penetrar no território até então dominado pelos alemães. Em 14 de abril daquele ano, o 11º Primeiro Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro, que vinha atuando em conjunto com o 5º Exército Americano, foi destacado para tomar uma localidade extremamente estratégica: a pequena cidade de Montese, situada na província de Módena, na região da Emília-Romanha, no topo dos Apeninos. Montese era a extremidade defensiva mais a noroeste das tropas nazistas e, uma vez tomada, o avanço dos Aliados rumo ao norte seria inevitável. Os nazistas tinham reforçado a cidade com seu 14º Exército, além da temida 114ª Divisão de Infantaria (Jäger-Division).

Situada entre as províncias de Módena e Bolonha, Montese era um lugar particularmente difícil de ser capturado, tamanha a quantidade de fortificações construídas pelos alemães que estavam resistindo ali. Os americanos diziam ter escolhido os pracinhas brasileiros especificamente para essa ofensiva pelo suposto efeito moral que vinham causando nos combatentes alemães, muitos deles jovens inexperientes recrutados às pressas pelo Alto Comando nazista em meio ao desespero de ver sua derrota se aproximando. O porte alto, o tom de pele mais escuro e a coragem de um povo totalmente desconhecido supostamente inspiravam temor nos jovens combatentes alemães. Obviamente, o mais provável é que estavam sendo usados como bucha de canhão. Os brasileiros, no entanto, estavam apreensivos. Esta seria sua estreia num cenário de combate urbano.

Três Heróis Brasileiros

Às 9 horas da manhã, teve início o ataque a Montese. Dois pelotões foram enviados rumo às tropas inimigas nos arredores da cidade, sofrendo forte resistência alemã. O primeiro conseguiu conquistar seu objetivo depois de algumas horas e atingiu uma posição vantajosa, enquanto o segundo teve seu avanço interrompido por um campo minado e se viu entrincheirado entre escombros, contra uma barragem constante de tiros do inimigo e bombardeios pesados dw artilharia. Estima-se que cerca de 1800 disparos de artilharia tenham sido lançados pelos alemães contra os brasileiros durante toda aquela tarde e noite.

Em meio a este cenário de caos, três pracinhas do segundo pelotão, Arlindo Lúcio da Silva, de 25 anos, Geraldo Rodrigues de Souza, de 26, e Geraldo Baeta da Cruz, de 28, todos naturais de Minas Gerais, acabaram por desempenhar um papel crucial na tomada da cidade e talvez um dos atos mais heroicos da história do Exército Brasileiro. Ao ver a situação de desespero em meio ao fogo inimigo, e depois de ver seu comandante morrer com um tiro na cabeça, acabaram se afastando da zona de fogo e se separando do resto do seu grupo – alguns dizem que numa tentativa de descobrir uma saída para o resto do pelotão, outros com a intenção de obter reforços.

O fato é que os três acabaram, talvez inadvertidamente, contornando os cerca de 100 soldados nazistas que estavam disparando contra seus companheiros. Depois de se posicionar em um ponto estratégico, deitaram no chão e começaram a atirar contra os nazistas responsáveis pela barragem pesada de artilharia que estava massacrando seus colegas.

O primeiro foi Arlindo, que, portando um fuzil automático, praticamente descarregou seis carregadores sobre os atônitos combatentes alemães. Os outros logo seguiram, disparando e jogando granadas contra os inimigos que, julgando estar diante de outro pelotão Aliado, começaram imediatamente a gritar contra eles, ordenando sua rendição e retornando o fogo. E assim ficaram por um bom tempo, tirando o foco dos alemães do resto do pelotão brasileiro, até que a determinada altura se viram sem munição e, segundo muitas versões, teriam se levantado e avançado com suas baionetas contra o inimigo, sendo abatidos em questão de segundos: Baeta e Arlindo com tiros certeiros, e Geraldo por estilhaços.

Os alemães, ao descobrir que tinham sofrido um ataque tão feroz por apenas três combatentes, e não todo um pelotão, ficaram atônitos. O comandante da tropa ordenou que três covas fossem cavadas, e colocou nelas cruzes onde se lia “Drei Brasilianische Helden” – “Três Heróis Brasileiros”.

Neste meio tempo, o segundo pelotão pôde sair de seu refúgio e avançar rumo até onde o primeiro pelotão estava, uma posição mais estratégica rumo à empreitada da conquista da cidade, onde estava concentrado o resto das tropas alemãs. No dia seguinte, as tropas da FEB finalmente conseguiram neutralizar todos os focos de artilharia dos nazistas na cidade e conseguiram entrar de vez nela. Depois de um ou dois dias de combates ferozes contra a infantaria nazista, os pracinhas capturaram de vez Montese para os Aliados.

A Batalha de Montese foi a batalha mais sangrenta já travado por brasileiros fora do país depois da Guerra do Paraguai. Dos 454 pracinhas mortos durante a campanha da FEB na Segunda Guerra, 34 morreram em Montese, enquanto mais de 400 foram feridos, capturados pelo inimigo ou nunca foram encontrados.  189 habitantes da cidade morreram, e, das 1121 casas ali existentes, 833 foram destruídas. Já os alemães perderam 54 de seus soldados, e outros 453 foram presos pelos brasileiros.

A conquista de Montese foi decisiva para que a Operation Grapeshot pudesse ser bem-sucedida. Juntamente com outras ofensivas simultâneas realizadas pelo resto dos Aliados ao longo da linha de defesa nazista, as tropas de outros países rapidamente conseguiram penetrar no norte da Itália e, semanas depois, empurrar de vez os combatentes alemães remanescentes de volta para seu país, até a posterior invasão da Alemanha.

Outros atos de heroísmo

Os corpos dos três heróis brasileiros foram trasladados para o cemitério da cidade italiana de Pistoia, na Toscana, de onde foram levados para o Monumento dos Pracinhas, no Rio de Janeiro.

Esse não teria sido o primeiro caso do gênero. O pracinha manauara Joaquim Manoel Xavier Silveira, que serviu na Segunda Guerra como operador de rádio no Pelotão de Transmissões da Companhia de Comando, conta o seguinte relato, em seu livro A FEB por um Soldado:

“Ao conquistarem Castelnuovo, as tropas se depararam com um testemunho da coragem do soldado brasileiro. Desde janeiro, três soldados do Regimento Sampaio figuravam na lista dos desaparecidos em combate: Cabo José Graciliano Carneiro da Silva, Soldado Clóvis Paes de Castro e Aristides José da Silva. Em Castelnuovo havia uma tosca cruz de madeira com a dística em alemão: 3 Tapfere – Brasil – 24.01.1945 (“Três bravos” – Brasil – 24.01.1944). Essa singular homenagem feita pelo inimigo é uma eloquente demonstração da coragem do soldado brasileiro”.

Até hoje homenagens são prestadas aos pracinhas em diversas cidades italianas, inclusive em Montese, onde existe uma Piazza Brasile. No chamado Dia da Libertação, celebrado em 25 de abril, crianças locais cantam, em português, o hino da Força Expedicionária Brasileira.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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