Como o capitalismo transformou a Holanda do século XVI em uma potência global

A frota da Companhia das Índias Orientais”: obra realizada em 1677 pelo pintor Ludolf Bakhuizen (1630-1708)| Foto: Reprodução

Enquanto o Brasil, em pleno século XXI, ainda não forneceu saneamento básico para a metade de sua população, no século XVI a maioria dos moradores dos Países Baixos desfrutava de saneamento e condições de higiene superiores as dos brasileiros. Em 1650, pelo menos metade dos holandeses viviam nas cidades (no Brasil, a população urbana só superou a rural na década de 1970). Além disso, a país estava enriquecendo graças ao intenso comércio interno e externo, proteção à propriedade privada, um mercado financeiro exuberante e uma agricultura que usava métodos modernos. A receita dos neerlandeses (os habitantes dos Países Baixos) chamou a atenção até de Adam Smith, autor de “A Riqueza das Nações”.

Tudo começou longe dali, com a conquista de Constantinopla pelos turcos em 1453. O fim do Império Bizantino praticamente acabou com o acesso dos europeus à Rota da Seda, ao Oriente e por tabela a uma série de bens e produtos que vinham movimentando a economia da Europa havia séculos. Espanhóis, portugueses, italianos, franceses e ingleses se viram então forçados a procurar outros caminhos para o Oriente. Com os holandeses não foi diferente. Mas em vez de adotarem uma tática expansionista e imperialista, seus governantes, cientes de sua incapacidade de competir militarmente com as potências da época, procuraram abrir as novas rotas fazendo o que sabiam fazer melhor: o comércio.

Havia uma grande diferença entre os holandeses e seus rivais europeus. Enquanto Espanha e Portugal, as grandes potências navais de então, priorizavam a conquista, o foco holandês era o comércio. Não por acaso ouviram de um de seus “parceiros comerciais” locais durante uma expedição comercial à África: “seu Deus é o ouro”. Os beligerantes ingleses e espanhóis construíam navios mercantes que podiam ser convertidos em navios de guerra. Já os holandeses se esforçavam em fazer navios mercantes que pudessem ser cada vez mais rápidos e com maior capacidade de carga.

Claro que isto não significou que os holandeses abriram mão de tentar ser também uma potência colonialista, e tão brutal, se necessário, quanto as outras; pelo contrário: como nós brasileiros bem sabemos, por 30 anos, de 1624 a 1654, os Países Baixos tiveram uma das experiências mais bem sucedidas de europeus no Novo Mundo, centrada em torno de Mauritsstad (atual Recife), na qual trouxeram para este rincão atrasado do globo que moramos uma série de conceitos que portugueses e, depois da União Ibérica, espanhóis, nos negaram, como a liberdade religiosa e comercial.

A corte de Maurício de Nassau também cruzou o Atlântico com uma série de diversos artistas e intelectuais consigo, deixando um legado que, embora não tenha sido de todo esquecido, especialmente no Brasil, acabou por se apagar num misto de nostalgia e vergonha pela perda da colônia — o que faz com que até hoje o período não seja devidamente abordado nos livros escolares dos Países Baixos. Além do Brasil, os holandeses tiveram uma série de colônias, mas em menor escala do que seus vizinhos europeus. Entre as que deixaram um legado maior em sua história e até mesmo na cultura atual do país, podemos citar o Suriname e a Indonésia.

A criação da Companhia das Índias Orientais

Mas foi através da exploração comercial que os Países Baixos imprimiram seu legado pelo mundo. Em 1595, já atraídos pelo mercado de especiarias, que rendiam um rebanho inteiro em troca de um mísero pacotinho, uma expedição de navegadores holandeses saiu pelo mundo afora, seguindo as rotas já abertas pelos portugueses em torno do Cabo da Boa Esperança e indo além, chegando até mares que, embora já dantes navegados, ainda tinham sido pouco explorados, até a ilha de Java.

Ainda que pouco mais de dois terços da tripulação não tenham chegado com vida ao seu destino original, a carga que trouxeram serviu como consolo. Segundo Stephen R. Bown, autor especializado na história das viagens de exploração do período, quando estas especiarias chegavam, “o que valia uma cesta de arroz na Indonésia custava uma fortuna em prata na Europa”. Nos anos que se seguiram, 65 outros navios holandeses foram para o Oriente, retornando com cravo, canela, gengibre, noz-moscada, entre outros.

Em 1602, então, o governo holandês resolveu estimular uma união dos esforços de todos os comerciantes (e, como todo governo, tirar algum proveito disso), e permitiu a criação da VOC, Vereenigde Oostindische Compagnie – “Companhia Unida das Índias Orientais” – e equipou-a com um exército de soldados e burocratas para estabelecer entrepostos e assegurar seu domínio sobre as rotas comerciais abertas.

Em 1614, no entanto, vendo essas rotas sendo gradualmente ameaçadas pelas potências europeias, especialmente os ingleses, o governo neerlandês resolveu apontar um contador, já com uma certa experiência no mundo das navegações, para ser diretor-geral da companhia. Jan Pieterszoon Coen era um calvinista ferrenho, a ponto de adotar o lema “Não se desespere, não poupe seus inimigos, pois Deus está conosco”. Rapidamente estabeleceu à força monopólios da Companhia com seus contatos na Indonésia, obrigando-os a vender seus produtos por preços mais baratos do que os oferecidos pela concorrência.

Entre seus métodos de persuasão estavam a tortura e a morte de qualquer comerciante local que aceitasse as ofertas feitas por chineses ou indianos de arroz em vez da lã e do veludo que os holandeses traziam (e eram completamente inúteis diante do clima tropical local), e a queima de campos de cultivo usados pelos rivais, para provocar deliberadamente a escassez de determinados produtos. O grau de brutalidade de Coen, se já não estivesse suficiente explícito nos massacres de portugueses e ingleses recorrentes durante suas empreitadas, ficou evidente num célebre episódio em que ele encontrou a filha de 12 anos de um colega que estava sob seus cuidados dentro de seu quarto com um soldado de 15 anos, e imediatamente mandou que ele fosse decapitado e ela chicoteada.

Globalização

A despeito de qualquer violação cometida por seus líderes e funcionários, a Companhia das Índias Orientais rapidamente se tornou a empresa mais rica e poderosa do mundo, estendendo seus tentáculos para outros ramos, como a construção, fabricação de bebidas alcoólicas, vidro, cultivo de tabaco e refino de açúcar. Estima-se que três quartos de todos os navios cargueiros circulando pelo mundo em meados do século XVII pertencessem à Companhia.

Seus lucros ajudaram a trazer ainda mais riquezas a uma nação já próspera, e a financiar uma era de ouro na arte, arquitetura, e ciência, que nos legou artistas como Rembrandt, Vermeer, filósofos como Descartes (apesar de francês, passou grande parte de sua vida adulta na Holanda), e cientistas como van Leeuwenhoek. Foi o primeiro exemplo cabal do que viríamos a descrever mais tarde como globalização.

O legado da VOC – efetivamente, a primeira multinacional do mundo – esteve longe de se restringir às fronteiras dos Países Baixos. O vinho da África do Sul, por exemplo, é um de seus maiores legados, graças às vinícolas construídas por seus membros durante o período em que os holandeses estiveram naquele país. Da mesma maneira, o desenvolvimento extraordinário de Taiwan nos dias de hoje tem sua origem durante a passagem da Companhia pela ilha, que até então não passava de um lugar habitado por tribos aborígenes. A empresa holandesa começou a estabelecer fazendas e trazer imigrantes chineses para trabalhar nelas.

Rejeição ao poder centralizado

Claro que essa prosperidade não teria sido possível se o país não tivesse anteriormente um período de prosperidade que permitisse o surgimento e desenvolvimento de todas essas condições para ela.

A região onde hoje se encontram a Holanda e a Bélgica, era habitada por uma tribo céltica, os batávios, que já tinha uma longa tradição de confecção de produtos têxteis, exportados em grande quantidade para os romanos. Apesar de terem sido descritas por Júlio César como uma das tribos mais ferozes da Gália, rapidamente se integraram ao mundo romano depois de terem sido subjugadas.

Com o fim do Império Romano, passaram a fazer parte de diversas entidades medievais, como o Reino dos Francos, o Sacro Império Romano-Germânico, e o Ducado da Borgonha. Durante todo este tempo, a indústria têxtil continuou a ser a principal força motriz financeira da região, o que fez com que o país, ainda à procura de independência das forças que o dominavam, desenvolvesse uma espécie de dependência dos britânicos pela lã necessária para a confecção destes produtos têxteis – devido à dificuldade de se criar rebanhos extensos num terreno situado praticamente abaixo do nível do mar.

Isso deu origem a um movimento coletivo e construção de diques, inicialmente com a intenção de proteção contra ataques estrangeiros, especialmente de vikings, mas depois para conseguir mais terras aráveis, e que propiciou uma espécie de revolução agrária que teria consequências permanentes na história do território.

Para a construção desses diques formaram-se comunidades independentes do governo, que criaram um sistema totalmente revolucionário de administração compostas por representantes de cada uma das regiões, com funcionários e servos próprios, e com autoridade para cobrar impostos e atuar judicialmente, minando gradualmente qualquer tipo de poder central existente à época – em contraste com o que acontecia no resto da Europa.

Muitos desses representantes tinham assistentes que eram eleitos pelos próprios habitantes dessas regiões. Assim, a estrutura social dos Países Baixos gradualmente se tornou totalmente diferente do resto da Europa da época. Ao mesmo tempo, foi surgindo uma distinção cada vez mais crucial para o desenvolvimento do próprio país: enquanto o Sul, que acabou por se tornar a parte flamenga da Bélgica, continuou dependente da produção de lã, o Norte procurou encontrar outras formas de sobrevivência, entre elas a pesca do arenque.

Agricultura moderna

O fato de os terrenos obtidos a partir da construção de diques serem pesados para a produção, apesar de relativamente férteis, forçou os habitantes locais a, se não desenvolverem, pelo menos passarem a adotar com mais intensidade tecnologias novas, como o arado mais pesado, de metal, puxado por cavalos mais fortes. Esse arado rapidamente permitiu que os Países Baixos se tornassem já no século XI um dos países com uma agricultura mais destacada da Europa.

Além disso, em vez de deixar a terra descansar por um ano após a colheita, os holandeses passaram a plantar grãos ricos em nitrogênio (nabos, trevos e ervilhas), que melhoravam o solo para o próximo cultivo e ainda por cima forneciam alimento para os rebanhos.

Apesar disso, não eram capazes de produzir trigo; mas como a quantidade de grama que surgiu nestas terras era abundante, rapidamente o país se tornou um expoente na produção de laticínios, e logo estabeleceu um comércio com as nações vizinhas, especialmente com os países bálticos, seus principais fornecedores de grãos.

Viver num país tão próximo ao mar e cortado por canais e rios também teve suas vantagens. O transporte marítimo e fluvial logo se tornou uma das especialidades dos neerlandeses, e o custo de se transportar mercadorias por água chegava a ser um décimo do que por terra. A longa experiência na pesca do arenque tida pelos holandeses no Mar do Norte serviu como uma mão na roda nessa hora.

O fato de que essa terra recuperada pelos diques era tão difícil de ser trabalhada, e requeria uma mão de obra especializada e capacitada, impediu o domínio dos que nela trabalhavam por senhores feudais, como aconteceu no resto da Europa. As propriedades rurais eram detidas quase sempre por quem trabalhava nelas, ou no máximo por pequenos proprietários que contratavam, a salários relativamente altos, alguém para trabalhar nelas. A alta produtividade agrícola fez com que uma grande parcela da população fosse liberada das atividades braçais e passasse a se dedicar ao comércio e às finanças, provocando um êxodo urbano que foi ainda maior nos Países Baixos que nos países vizinhos.

Vida nas cidades e salários altos

No fim do século XVI, o grau de urbanização dos Países Baixos tinha subido dos 10% de três séculos antes, um número praticamente equivalente ao resto da Europa, para um índice que variava de 40 a 60% de sua população local, uma estatística que ultrapassava até mesmo os lugares mais desenvolvidos da Europa na época, como o norte da Itália e sua vizinha (e antigo membro dos Países Baixos) Bélgica.

Diversos fatores propiciaram isto. O elevado grau de conforto e higiene existente nas cidades do país, em comparação com as do resto do continente; o talento e vocação para o comércio, a grande especialização dos seus profissionais e a quantidade de excedentes disponíveis, fruto do alto nível de sua produção agrícola e da abundância de produtos que chegavam de todas as partes do mundo em seus portos.

Boa parte da população passou a se dedicar à construção de barcos e outras atividades industriais (ou pré-industriais, para ser mais preciso). Os salários aumentaram cada vez mais, a ponto de que, no século XVI, quase metade de toda a força de trabalho dos Países Baixos era formada por trabalhadores assalariados, e essas relações entre contratante e contratado eram totalmente distintas do resto do continente, com diversos aspectos que consideraríamos modernos, como discussões salariais formais, com base em salários diários, semanais ou mensais, e até mesmo equipes que recrutavam trabalhadores para ofícios específicos. Desenvolveu-se também um mercado de capital que tinha como característica básica o fato de que um grande número de participantes de capital modesto tinham acesso a um crédito de longo prazo a juros pequenos.

Enquanto boa parte dos agricultores europeus ainda produzia para a própria subsistência ou para a do seu senhor, cerca de 85 a 90% de tudo que era produzido pelos holandeses era destinado ao mercado, não só local, mas externo. Como resultado óbvio, os “senhores” locais e governantes passaram a perder importância para os detentores de poder mercantil.

E embora, como em todo o resto do mundo, o comércio do país ainda sofresse com taxas e impostos pagos em todo tipo de transação comercial, as barreiras impostas aos empreendedores eram significativamente menores do que no resto da Europa.

Da mesma maneira, os direitos absolutos e exclusivos a uma propriedade de terra eram incomparáveis ao resto do continente, protegidos pelas autoridades locais de uma maneira que nunca tinha sido vista antes, especialmente a partir do século XIV. A proteção se estendia tanto a proprietários de terra contra locatários inadimplentes quanto compradores cujo contrato não fosse seguido à risca por quem lhes tinha vendido uma propriedade, e era aplicada tanto a poderosos quanto aos mais humildes. Havia um interesse claro em se manter um equilíbrio entre todas as instituições e setores da sociedade.

Em suma, foi uma sociedade forçada a se organizar por conta própria, na ausência de um poder autocrático que insistisse em impor à população local leis arbitrárias.

República dos Sete Países Baixos Unidos

Apesar disso, os Países Baixos ainda faziam parte do grande império dos Habsburgo, embora tivessem sempre sido preservados das decisões centrais por fazerem parte de um condado local.

Em 1555, a Casa dos Habsburgo se dividiu entre duas facções, uma austro-alemã, e outra espanhola, e coube aos Países Baixos ficar sob o domínio do espanhol Filipe II. Diante das medidas ferrenhas contra a Reforma Protestante do monarca ibérico, a população local, majoritariamente calvinista, sentiu finalmente o peso de uma medida autocrática imposta por um governante opressor, e, naturalmente, se revoltou.

Durante pouco mais de trinta anos os holandeses suportaram o jugo de seus dominadores católicos, até que em 1588 foi fundada a República dos Sete Países Baixos Unidos, enquanto a parte Sul, basicamente a atual Bélgica, continuou dominada pela Espanha até ser sucessivamente conquistada pela Áustria e pela França.

Adam Smith definiu a República dos Países Baixos como “o exemplo primordial de uma sociedade puramente comercial”. Ele destacou o fato de país obter “não só toda a sua riqueza, mas boa parte de sua subsistência necessária, do comércio exterior”. Para ele, a Holanda era, “proporcionalmente ao tamanho de seu território e ao número de seus habitantes, de longe o país mais rico da Europa, (…) com a maior parcela no comércio de transporte da Europa”.

Falando da segunda metade do século XVIII, ele ainda ressaltava a importância dos Países Baixos no comércio europeu, estimulados pelo fato de que baixas taxas de juros deixavam que a burguesia local não deixasse seu dinheiro parado, e investisse-o em empreitadas mercantis: “Lá é fora de moda não ser um homem de negócios. A necessidade fez com que todos os homens se tornassem um, e, assim como em todos os lugares, são os costumes que regulam a moda”.

Para ele, a forma republicana de governo era a principal base da grandeza atual da Holanda: “os proprietários de grandes capitais, as grandes famílias de comerciantes, costumam ter na administração desse governo ou uma participação direta ou uma influência direta. Em nome do respeito e da autoridade que essa situação lhes propicia, dispõem-se a viver num país em que seu capital lhes gera lucros menores, se eles mesmos o investem, e juros menores, se eles mesmos o emprestam; num país, além disso, no qual o rendimento bastante módico que retiram de seu capital lhes permitirá comprar uma quantidade de artigos necessários e úteis à vida muito menor do que seria possível comprar em qualquer região da Europa. Apesar de todas essas desvantagens, a residência dessas pessoas ricas necessariamente mantêm no país um certo grau de atividade”.

Bolsa de Valores

Com a independência, o surgimento da Companhia das Índias Orientais, e o desenvolvimento do comércio exterior dos Países Baixos com todo o mundo e o seu domínio quase que total no comércio de especiarias, o capitalismo mercantilista holandês trouxe consigo uma série de melhorias que levaram o país avançar a um ritmo maior que o resto da Europa.

Em 1602 surgiu a Bolsa de Valores de Amsterdã, considerada a mais antiga do mundo, fundamentada principalmente nas viagens para as terras recém-descobertas, que eram financiadas por investidores que mitigavam o risco dessas jornadas ao investir uma fração de seu capital nessas empreitadas, colhendo o lucro dos sucessos.

As especulações financeiras logo saíram do espectro das viagens marítimas e passaram para o comércio de trigo, arenque, óleo de baleia, e até mesmo tulipas. A Holanda até mesmo teve o primeiro crash da bolsa: no começo da década de 1630, quando o preço do bulbo da tulipa estava tão supervalorizado que uma quantidade cada vez maior de pessoas os comprava antes mesmo que elas nascessem, dando como garantia suas casas, propriedades e indústrias, na esperança de obter um lucro maior. Não só as tulipas eram sobrevalorizadas. As ações da Companhia das Índias chegaram a valer o equivalente a atuais 7,9 trilhões de dólares, um valor cinco vezes maior que o PIB do Brasil em 2020, que foi de US$ 1,42 trilhão.

Mas em 1637, depois de anos em que famílias de classe média e até mesmo pobres tinham se empolgado com os preços crescentes das tulipas e resolvido investir no preço da commodity, veio a dúvida sobre esse aumento que nunca chegava, deixando milhares na miséria e outros tantos perdendo suas fortunas. Em 1609 foi criado também o Banco de Amsterdã, o primeiro “Banco Central” nos modernos atuais, que introduziu o conceito de depósitos bancários como forma de pagamento. O crash também motivou toda uma série de medidas de proteção aos investidores e credores, muitas das quais permanecem conosco até hoje.

Ainda assim, a sociedade neerlandesa era uma das mais igualitárias do mundo, talvez influenciada pela mentalidade calvinista além de toda a questão histórica e sócio-política. Ainda que não fosse difícil de se diferenciar a casa de um banqueiro da de um pescador às margens de um canal em Amsterdam, todos dispunham das mesmas benesses e de um nível de vida relativamente alto, perante o resto não só do mundo, como até mesmo da Europa, e dos mesmos direitos perante à lei e à sociedade. As principais cidades do país, como Amsterdã, Roterdã, Haia, que já eram um exemplo de civilização e higiene diante da realidade assustadora europeia nos séculos anteriores, agora tinham se tornado praticamente cidades-modelo.

Como nada dura para sempre, a Revolução Francesa, as Guerras Napoleônicas, e a ascensão da Inglaterra como potência suprema mundial, acabaram por reduzir gradualmente os Países Baixos à posição de um país coadjuvante, se tanto. Ainda assim, a herança que esse período legou ao país é enorme, especialmente na mentalidade da população, que conseguiu sair praticamente ilesa de diversas crises ao longo dos últimos séculos, especialmente graças à sua capacidade de se manter relativamente frugal, sabendo quando apertar o cinto e como controlar seus gastos. E, acima de tudo, por apostarem na liberdades econômica e civil e na força do capitalismo.

Confira a matéria na Gazeta do Povo

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