O plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (10) o texto-base do projeto que dá autonomia formal ao Banco Central. Foram 339 votos a favor da proposta, 114 votos contrários e uma abstenção. O texto estava entre as 35 prioridades elencadas pelo Planalto para o ano de 2021. Foi a primeira sessão de votação de projeto de lei dirigida pelo novo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Os deputados rejeitaram todos os destaques (pedidos pontuais de mudança) apresentados. Como já tinha sido aprovado pelo Senado em novembro de 2020, o projeto agora segue para a sanção presidencial.
A votação em plenário nesta quarta só foi possível após acordo de líderes. Na terça-feira (9), houve aprovação do requerimento de urgência para a proposta. Com isso, o texto não precisou passar pelas comissões e pôde ser votado diretamente em plenário. O presidente Arthur Lira pautou a matéria imediatamente.
A oposição, contrária à proposta, entrou em obstrução. Após longo debate, a base do governo e a oposição, com exceção do Psol, fecharam o acordo de adiar a votação para esta quarta. Também ficou acordado que a oposição apresentaria cinco destaques para tentar alterar o texto. Esses destaques tentavam desconfigurar a proposta.
Objetivo do projeto e repercussão
O principal objetivo do projeto é reduzir os riscos de ingerência política na autoridade monetária ao estabelecer mandatos fixos para o presidente e os diretores do BC. Os mandatos não serão coincidentes com o do presidente da República.
O texto-base também reforça que o objetivo principal da instituição é a busca pela estabilidade de preços, mas acrescenta como metas acessórias à busca pelo desenvolvimento econômico e o fomento ao pleno emprego.
“É a garantia de que aumentos setoriais e temporários de preço, como ocorreu com materiais de construção e alimentos, não devem se transformar em aumentos permanentes e generalizados de preços, que é a espiral inflacionária”, afirmou o ministro Paulo Guedes na segunda-feira (8), quando foi firmado o acordo para votação do texto. “É decisivo para garantir a estabilidade monetária do país, poder de compra da moeda, poder de compra dos salários, das aposentadorias e a própria execução orçamentária”, continuou.
O relator do projeto na Câmara, deputado Silvo Costa Filho (Republicanos-PE), emitiu parecer favorável à proposta, sem alteração de mérito (conteúdo), em acordo com o governo. Em discurso em plenário, ele lembrou que o tema está em debate há 30 anos, sem nunca ter avançado.
“Passaram quase 30 anos e nós não tivemos a autonomia do Banco Central. Faltou vontade politica para que a gente pudesse avançar nessa pauta tão importante para o Brasil”, afirmou Costa Filho. “As principais democracias e economias desenvolvidas têm um Banco Central autônomo. Isso vai dar ao país um novo padrão de governança monetária e fazer com que os investidores olhem o país com outra imagem”, completou, dizendo que é possível que o texto melhore a nota de crédito do Brasil.
Costa Filho reforçou, ainda, que o Banco Central tem que ser uma política de Estado, não de governo. “O Banco Central não pode estar ao bel-prazer do presidente da República e do ministro da Economia.”
O presidente da Câmara destacou que a aprovação do texto “representa justamente a blindagem da instituição de quaisquer ingerências políticas”, afastando a especulação que a sua eleição e de Rodrigo Pacheco para o comando do Senado representaria o “triunfo da politicagem, em sua pior acepção”.
“É fruto de uma postura republicana de desprendimento do Executivo e de engajamento do Legislativo, emitindo um sinal claro para o mundo de que o Brasil está avançando em sua governança e previsibilidade. O trabalho conjunto em torno de pautas centradas nos mais elevados interesses nacionais é a melhor resposta que as instituições podem dar para que o país supere suas dificuldades e recupere sua prosperidade para o nosso povo”, escreveu Arthur Lira em suas redes sociais.
O que muda com a autonomia do Banco Central
Pelo texto-base aprovado, o Banco Central perde o status de ministério, deixando de ser vinculado ao Ministério da Economia, e passa a ter autonomia formal. Atualmente, o BC já funciona de maneira autônoma, mas isso não está no papel. Há apenas um acordo informal para que o governo federal não interfira nas decisões na autoridade monetária.
O projeto também estabelece mandato de quatro anos para o presidente e os diretores do BC, com início no dia 1.º de janeiro do terceiro ano do mandato do presidente da República. Ou seja, os mandatos do presidente da República e da cúpula do BC passam a ser não coincidente. Atualmente, não há mandatos fixos para a autoridade monetária e o presidente da República pode trocá-los quando bem entender.
Os nomes continuarão sendo indicados pelo presidente da República no segundo ano de seu governo e, mantendo o que já ocorre hoje, terão de passar por sabatina e aprovação no Senado Federal. A cúpula do BC poderá ter seu mandato estendido por mais quatro anos, por decisão do presidente da República.
Quando o presidente Jair Bolsonaro sancionar o projeto, ele terá o prazo de 90 dias para nomear a cúpula do BC com base nas novas regras. Ele poderá escolher os dirigentes atuais ou novos. Esse prazo excepcional foi concedido porque o texto está sendo votado somente agora, no terceiro ano do governo.
Além do mandato fixo, o texto estabelece quarentena de seis meses para que o presidente e os diretores do BC possam assumir qualquer emprego em instituições financeiras. Em compensação, terão uma remuneração compensatória a ser paga pelo BC.
Segundo a proposta, eles só perderão seus mandatos em três casos: caso tenham condenação criminal transitada em julgado; apresentem pedido de demissão de próprio punho e justificado; e por iniciativa do presidente, mas mediante exposição de motivos, que precisará ser aprovada pelo Senado, assegurada ao dirigente a oportunidade de defesa em sessão pública.
Por fim, o projeto aprovado prevê uma espécie de “mandato duplo light” ao Banco Central. A principal função da autoridade monetária continuará sendo a estabilidade de preços, dentro das metas de inflação estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Mas, além do controle dos preços, o BC passa a perseguir, “na medida de suas possibilidades”, o desenvolvimento econômico e o pleno emprego. São objetivos acessórios que não existem atualmente e foram aprovados pelo Congresso.
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