Justiça Eleitoral indefere mais de 10 mil candidaturas

Falta de documentos é o principal motivo das impugnações; Ficha Limpa, o segundo. Especialista em direito eleitoral considera que muitos candidatos ainda poderão concorrer após recorrer em segunda instância.

Com a maior parte dos pedidos de registro de candidaturas julgados pela Justiça Eleitoral até esta segunda-feira (26), mais de 10 mil postulantes ao cargo de vereador, prefeito e vice-prefeito em todo o Brasil tiveram a candidatura indeferida.

Se forem somados os falecimentos e as renúncias, o número de candidatos inaptos supera os 16,5 mil. A maior parte, no entanto, cerca de 10,6 mil casos, é formada por candidatos que não poderão concorrer porque não atenderam a algum requisito legal.

Os candidatos inaptos representam cerca de 2,9% do total de casos analisados, um percentual, por enquanto, menor que o registrado em 2016 (3,4%). O prazo final para a conclusão dos julgamentos termina nesta segunda. Mas 112 mil pedidos ainda aguardam parecer da Justiça Eleitoral.

Pelos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o principal motivo das cassações ou indeferimentos é a “ausência de requisito de registro”, com 75,9%. Como uma única candidatura pode ser barrada por mais de um motivo, o número total supera o de candidatos indeferidos.

Efeitos da Ficha Limpa

A segunda principal razão para rejeição dos pedidos de registro é a Lei da Ficha Limpa, com 11,2%. Segundo a lei, políticos condenados por abuso de poder político e econômico ficam inelegíveis por oito anos.

Advogado e professor de Direito Eleitoral, Alberto Rollo acredita que os dados dos julgamentos das candidaturas divulgados não refletem o que preconiza a legislação eleitoral. Segundo ele, a lei determina que os registros devem estar julgados em primeira e segunda instância eleitoral até 20 dias antes do dia da votação, ou seja, muitos julgamentos ainda estão pendentes.

Principais motivos de indeferimento — Foto: Aparecido Gonçalves/G1

“Isso quer dizer que, até esta segunda-feira, os pedidos de registro das candidaturas deveriam ter sido julgados, inclusive, pelos tribunais regionais, porque há muitos casos com recurso. Acredito que esses dados refletem mais os julgamentos da primeira instância. Estamos vendo, na verdade, o que o ministro Barroso já havia alertado lá atrás, de que o tempo era muito curto para que a Justiça Eleitoral analisasse todos os pedidos”, afirma Rollo.

Na avaliação do professor, mesmo que quase 80% dos casos tivessem sido analisados em primeira e segunda instância, há ainda cerca de 112 mil candidaturas sem ser julgadas, segundo o site do TSE. Por lei, esses candidatos poderão concorrer até que a Justiça decida sobre a validade dos registros.

Para Alberto Rollo, a proporção de 11% de indeferimentos por conta da Lei da Ficha Limpa pode ser considerada baixa. O professor avalia que o percentual deve cair um pouco mais, com os recursos que deverão ser apresentados. A ausência de requisito de registro, principal motivo de cassação ou indeferimentos das candidaturas, segundo Rollo, pode estar associada também às dificuldades geradas pela pandemia.

“Muitos dos documentos que o candidato precisa levantar para apresentar à Justiça Eleitoral só existem no formato físico, são milhões de documentos, que precisam ser buscados um a um. Por outro lado, há muitos tribunais que fizeram home office durante a pandemia, o que limitou muito o trabalho de pesquisa. Então é provável que muitos casos sejam ausência desses documentos”, lembra Rollo.

Partidos pequenos se destacam

A distribuição das candidaturas inaptas, sem considerar os falecimentos e as renúncias, mostra que os partidos pequenos se destacam. O G1 calculou a proporção de inaptos em relação ao total de candidaturas lançadas por cada legenda. Pela ordem, partidos como PCO, PSTU, PCB, PMB e DC apresentam percentuais maiores que a média.

Na outra ponta, os partidos com menores percentuais de candidaturas impugnadas foram Novo, PP, DEM, PSD e MDB. Professor de ciência política e coordenador do Laboratório de Partidos e Sistemas Partidários da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Bruno Bolognesi acredita que essa distribuição reflete o grau de profissionalização dos grandes partidos e das condições para montar estruturas nos estados e municípios.

“A primeira hipótese para essa distribuição é de fato o nível de profissionalização e expertise eleitoral. Partidos grandes ou com boas estruturas, como o Novo, por exemplo, normalmente contam com um corpo técnico robusto em campanhas, com advogados, contadores, publicitários. Já partidos pequenos normalmente são reféns de assessores do ‘dono’ do partido e que vivem de relações clientelísticas dentro da legenda, com parca experiência na burocracia estatal, por exemplo, que pode ajudar a formar know-how para disputa eleitoral, principalmente no aspecto formal das exigências”, observa Bolognesi.

O professor da UFPR chama a atenção também para o perfil ideológico das legendas que apresentam os maiores percentuais de candidaturas impugnadas. Para Bolognesi, alguns partidos estão mais preocupados com a propaganda ideológica, e menos com a disputa eleitoral de fato.

“Há uma questão do partido antissistema. Ainda que estes partidos estejam disputando eleições, eles não estão necessariamente preocupados em ganhar votos, como é o caso dos partidos de extrema esquerda. Então a relação com a eleição é muito mais doutrinária do que eleitoral, de modo que não há uma preocupação com a viabilidade do candidato, mas sim em fazer propaganda ideológica para a legenda”, observa Bolognesi.



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