Se estivesse interessado em dar ao público a impressão de que é um bom brasileiro, e fazer isso a preço de custo, sem risco nenhum para si mesmo ou para a sua clientela, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia , bem que poderia liberar para votação o projeto de lei que acaba com o foro privilegiado para políticos e outros peixes graúdos da vida nacional.
Ele daria, se fizesse o gesto, um contrapeso à sua imagem de Patrono Emérito dos deputados e senadores ladrões, que construiu em boa parte por causa de sua recusa em levar o projeto ao plenário: há quase dois anos está segurando em sua gaveta a votação da lei que acabaria com metade da atração que a política brasileira tem hoje para corruptos, gangsters e malfeitores em geral.
O risco, como dito acima, é baixo. Em primeiro lugar, o projeto pode não ser aprovado, dada a quantidade de gente ruim que há no plenário – ou acabar tão desfigurado por “emendas” que não vai valer nada. Além disso, mesmo que o fim da impunidade para a bandidagem seja aprovado, o Supremo Tribunal Federal está aí para resolver qualquer problema.
O ministro Dias Toffoli, como se sabe, acaba de proibir a Polícia Federal de entrar no gabinete do senador José Serra (PSDB-SP), acusado de caixa dois nas eleições de 2014 ao Senado. Vai continuar proibindo, com lei ou sem lei do foro privilegiado; que diferença faz, então? O STF, simplesmente, vai declarar que a lei que acabaria com o direito dos políticos a não serem investigados como os demais cidadãos brasileiros é “inconstitucional”.
Se alguém tentar punir algum deputado ou senador que roubou do Erário (ou cometeu qualquer outro tipo de crime, inclusive homicídio qualificado), estará ameaçado pelo ministro Celso de Mello de ser levado “debaixo de vara” perante o Excelso Pretório. Poderá se ver enfiado no inquérito secreto que o ministro Alexandre de Moraes promove contra os inimigos da “democracia”. Correrá o risco de receber um exemplar da Constituição da ministra Rosa Weber, junto com uma aula de moral e cívica.
Rodrigo Maia pode estar deixando de lado uma bela oportunidade de ficar bem na foto.
J.R. Guzzo
J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame. **Os textos do colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.
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