Apesar da letargia provocada pela pandemia, há sinais que apontam para a retomada gradual do investimento em diversas áreas, apontam especialistas
As incertezas atreladas à pandemia da Covid-19 ainda deixam investidores em alerta, mas, apesar do cenário predominantemente nebuloso, alguns fatores permitem vislumbrar um esboço de melhora nos rumos dos investimentos no Ceará, no horizonte próximo. A Transposição do rio São Francisco, cujas águas chegaram ao Estado no fim de junho, deve ser crucial na atração de aportes privados e provocar grande impacto no perfil econômico do Estado no futuro. Soma-se a isto a aprovação do novo marco legal do saneamento e o potencial cearense para o setor de energias renováveis, ambos vistos por economistas como importantes atrativos de recursos. Ademais, o governador Camilo Santana antecipou, em recente entrevista à Coluna Poder, do Diário do Nordeste, que o Estado prepara um pacote de investimentos em obras para retomar o crescimento da economia, melhorando a oferta de emprego para os cearenses.
Este conjunto de fatores acena para um esforço de retomada gradual dos investimentos. Em maio, aponta o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Indicador de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) cresceu 28,2% ante abril, a maior alta percentual desde 1996, sinalizando que o pior momento para o investimento deve ter ficado no retrovisor.
Na avaliação do economista e presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará, Ricardo Coimbra, com a Transposição, o agronegócio pode ser uma das vertentes do crescimento do Estado. “A partir de agora, nós teremos um volume constante efetivo de água e isso gera um nível de certeza para o investidor, que antes não tinha isso para montar uma estrutura de perímetros irrigados, então ele não tinha certeza da matéria prima”, diz. “Esses investimentos poderão estar muito atrelados ao Complexo Industrial e Portuário do Pecém, à Zona de Processamento de Exportação”, detalha.
Na área de energias renováveis, o economista destaca que “o Estado é um polo muito interessante no se refere aos ventos”. “Não só quando falamos da produção de pás eólicas, mas na exploração e na distribuição da energia, então a atração de investimentos nessa área deve ser o foco, tendo continuidade”. Coimbra também pontua que, no longo prazo, empreendimentos na área turística têm espaço. “A própria construção de resorts em toda a costa litorânea, por exemplo. Existe uma possibilidade de expansão no médio e longo prazo”, diz.
Considerando a desvalorização do real, Ricardo Coimbra avalia que o Ceará e o Brasil ficam, de fato, mais atraentes aos olhos dos investidores de outros países, favorecendo a atração de capital estrangeiro. “Talvez nesse momento, ter uma diferenciação de câmbio forte seja bem interessante para que o investidor externo faça aportes no nosso Estado, então há essa perspectiva”.
Com o marco legal do saneamento básico, o presidente do Corecon-CE também avalia que há uma perspectiva de investimentos significativos da iniciativa privada. O novo marco, aprovado no Senado no fim de junho e agora aguardando a sanção do presidente Jair Bolsonaro, prevê, por exemplo, a abertura de licitação para serviços de água e esgoto, autorizando a entrada da iniciativa privada nas concessões e facilitando a privatização de estatais de saneamento.
Transposição
O presidente da Câmara Setorial do Agronegócio da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), Amilcar Silveira, reforça que a deficiência hídrica no Ceará “afugentou os investidores” nos últimos anos. “Naturalmente não tinha água, então era complicado investir. A Transposição nos dá uma segurança hídrica, então nós devemos atrair esse investimento”, avalia, acrescentando que isso deve ser impulsionado pelo dólar em alta.
“Nós já vemos algumas empresas se preparando para ampliar suas áreas de produção por causa dessa segurança hídrica na região”, diz, acrescentando que a região da Ibiapaba deve receber em breve um investimento na horticultura. “Chegou uma investidora nacional que vai se instalar lá. Estamos juntamente com a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet) apostando também na bovinocultura leiteira. O agronegócio tem crescido sobremaneira no Brasil inteiro”.
Para ele, o Estado possui uma vocação fantástica nesse sentido. “Um hectare de fruta representa um emprego gerado”, pontua Silveira.
Dificuldades
Apesar da desvalorização cambial como ponto positivo, Ricardo Coimbra avalia que os atritos no relacionamento entre o Governo Federal e os governos estaduais, a exemplo do que foi observado na condução das ações de combate ao coronavírus nos últimos meses, podem gerar um clima de incerteza para os investidores. “Se há muitos atritos entre as esferas de governo, isso pode gerar uma incerteza sobre o sucesso do investimento, mas para dizer isso, é necessário analisar setor a setor, avaliar cada atividade. Mas pode ser um fato”, detalha.
Sobre o pacote de obras públicas mencionado pelo governador Camilo Santana para o segundo semestre, o diretor da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade (Feaac) da Universidade Federal do Ceará, Paulo Matos, vê com bons olhos a iniciativa do Estado de apostar em obras públicas para estimular a economia no Ceará, sobretudo se essas obras forem voltadas para a garantia do básico à população.
“Se é para o Estado se endividar e investir no Ceará, que seja para prover melhores condições à população, como no acesso à internet, por exemplo”, diz. Ao criar condições melhores para a população, Paulo Matos avalia que a ambiência para a atração do investimento estrangeiro fica mais favorável. “O investimento público em saneamento básico é tão bem visto. Os investidores estrangeiros vão olhar e ver que o Estado está fazendo a sua parte”, pontua.
O vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), André Montenegro, destaca que as obras do Estado são responsáveis por uma grande circulação de recursos na economia. “O Estado é um grande investidor. Quando ele investe, o dinheiro circula, gera emprego, renda e riqueza, então isso nos deixa esperançosos”.
Ele frisa que a taxa de juros mais baixa, que favorece o mercado imobiliário aquecendo o setor da construção civil, também estimula os investimentos neste segmento. “A construção civil vai passar por um momento muito bom considerando a taxa de juros para o crédito imobiliário, que nunca esteve tão barato. Tivemos recorde no financiamento imobiliário”, diz. Ele avalia ainda que o marco regulatório do saneamento será importante vetor para o investimento privado. “É tão importante para o Brasil quanto a reforma da Previdência. Isso gera investimento de infraestrutura, investimento nos a iniciativa privada tem interesse que pode entrar capital externo e pode beneficiar ainda a área da saúde”, finaliza Montenegro.
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