Pressionado por prefeitos, o bloco conhecido como Centrão se movimenta para barrar no Congresso o adiamento das eleições municipais. A proposta de emenda à Constituição (PEC) que muda a data das disputas por causa da pandemia do novo coronavírus foi aprovada na terça-feira (23) no Senado, mas ainda precisa passar pelo crivo da Câmara e não há acordo. O Centrão já avisou que não dará os votos necessários e tem o aval do presidente Jair Bolsonaro nessa articulação.
A proposta que recebeu sinal verde do Senado prevê que as eleições para a escolha de prefeitos e vereadores sejam realizadas em 15 de novembro, no primeiro turno, e 29 do mesmo mês onde houver segunda rodada. Pelo atual calendário, porém, as datas são 4 e 25 de outubro.
O discurso oficial dos parlamentares contrários à mudança é que nada garante que postergar o julgamento das urnas em 42 dias fará com que a pandemia seja controlada nesse período. Na prática, porém, a resistência tem outro motivo: muitos avaliam que jogar as eleições para 15 de novembro, Dia da Proclamação da República, beneficia a oposição.
Prefeitos argumentam que adiar a corrida eleitoral favorece os adversários porque dá mais tempo para que candidatos rivais se organizem e façam campanha, ainda que de forma virtual. A avaliação é a de que, como a pandemia dificulta o debate político, quem já está no cargo leva vantagem.
Partidos como Progressistas e Republicanos, integrantes do Centrão, já se manifestaram contra a nova data das disputas municipais e o PL também tende a seguir esse caminho. Diante do impasse, o DEM está dividido e o MDB liberou a bancada para votar como bem entender.
O MDB é o partido que filiou o apresentador da Band José Luiz Datena, que, pelo atual calendário, terá até a próxima terça-feira (30) para anunciar se concorrerá ou não à sucessão do prefeito Bruno Covas (PSDB) ou se será vice na chapa do tucano. A lei obriga que pré-candidatos apresentadores de rádio e TV se afastem dos programas até 30 de junho. Até agora, Datena vem dando sinais de que não entrará no páreo.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), admitiu dificuldades para o adiamento das eleições. “Não há consenso. A única certeza é que a gente precisa dialogar mais sobre isso”, disse ele. “Precisamos manter a data das eleições municipais no dia 4/10 para podermos avançar o mais rápido possível na pauta das reformas que o Brasil precisa. Ao postergar as eleições, fatalmente o Congresso Nacional demorará mais para atacar sobretudo os temas econômicos”, escreveu no Twitter o deputado Marcos Pereira (SP), que comanda o Republicanos e é vice-presidente da Câmara.
O Centrão dá as cartas do poder na Casa porque controla aproximadamente 200 dos 513 votos. Para que o adiamento das disputas seja aprovado é necessário o apoio de 308 deputados (três quintos dos votos), em duas votações. Sem o aval do Centrão, no entanto, a proposta corre o risco de ser derrubada. Maia ainda não marcou a sessão virtual para apreciação do texto.
Para Jonas Donizete, presidente da Frente Nacional de Prefeitos, o assunto é muito polêmico. “A entidade não tem uma posição fechada porque os prefeitos estão muito divididos. Quem vai para a reeleição é a favor de manter a data de 4 de outubro. Só esperamos que a Câmara decida rapidamente”, afirmou ele, que é prefeito de Campinas e filiado ao PSB.
Centrão teme desvalorização de recursos do fundo eleitoral
O Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro quer criar, não pode participar das eleições deste ano porque ainda não conseguiu as assinaturas necessárias para sair do papel. O presidente afirmou que não se envolverá na campanha, mas a ideia é que seus aliados apoiem candidatos do Centrão.
Na segunda-feira (22), o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Glademir Aroldi (Progressistas) disse que esticar o prazo da campanha faria com que a saúde da população fosse submetida a maior risco. “Se ninguém sabe o que vai acontecer, não temos garantia nenhuma”, observou Aroldi, ao defender o adiamento das eleições para 2022.
“Há grande pressão dos prefeitos atuais, candidatos à reeleição, e dos que querem fazer seu sucessor. Eles estão fortalecidos nesse momento e acham que, depois, vão se revelar problemas porque haverá escassez de recursos”, constatou o deputado Arnaldo Jardim (SP), líder da bancada do Cidadania.
Até mesmo no Supremo Tribunal Federal (STF) há divergências sobre a conveniência de se esticar a campanha. Nos bastidores, dois magistrados disseram à reportagem que seria melhor o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não entrar nesse debate político, deixando tudo a cargo do Congresso.
O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, observou, porém, que a votação no Senado acolheu sugestão encaminhada pela Corte após recomendação de médicos. “Não era uma vontade política nossa, mas apenas o encaminhamento de um entendimento uníssono de todos os médicos, cientistas, epidemiologistas infectologistas que pudemos ouvir”, argumentou Barroso. “Todos recomendaram a conveniência de se adiar as eleições por algumas semanas, pela convicção de que em setembro a curva já estará decrescente”.
Com preocupação de que houvesse “desvalorização” dos recursos do fundo eleitoral, que financiam as campanhas, assessores de deputados chegaram a enviar consulta por escrito ao TSE para perguntar se esse dinheiro — um bolo de R$ 2 bilhões, distribuído entre as siglas — poderia ser aplicado em bancos até a definição do imbróglio sobre a data das disputas. Até hoje não receberam resposta.
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