A perseguição piorou durante a pandemia, segundo relata a Comissão de Justiça e Paz de Hong Kong.
Perseguição religiosa é um elemento importante para a manutenção do poder em ditaduras, tanto de esquerda quanto de direita, sobretudo as mais longas. Acreditar na transcendência do indivíduo e na sacralidade da vida é uma forma de evitar a idolatria de líderes políticos e do Estado, o que inviabiliza o controle das pessoas e das massas.
O caso mais gritante de violação de direitos humanos é do da etnia Uigur, original do Turcomenistão e de maioria muçulmana. O governo recolheu dezenas de milhares de pessoas a campos de concentração e o motivo é religioso. No caso dos cristãos, a prática da religião passou a ser permitida, mas com uma exigência bizarra: a de que as únicas Bíblias permitidas fossem aquelas impressas pelo Partido Comunista Chinês, que também precisa legalizar os templos.
Com a pandemia de coronavírus, templos religiosos tiveram de ser temporariamente fechados em todos os países do mundo. Até a Igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém, foi fechada pela primeira vez após a peste negra de 1349. A diferença na China é que o governo decidiu demolir algumas igrejas e prender sacerdotes.
Há inúmeras ONGs que denunciam, pelas redes sociais, as sistemáticas violações de direitos religiosos na China e, com a pandemia, elas se tornaram mais frequentes. Os cidadãos têm dificuldades em fazer com que suas denúncias atravessem fronteiras porque o governo controla as redes sociais e vários sites usados no ocidente não funcionam no território chinês. Mesmo assim, as imagens chegam.
Com o fechamento de igrejas no início do ano, várias igrejas decidiram fazer cultos online e o governo chinês decidiu se meter nisso também porque igrejas ilegais começaram a se reunir. Na província de Shandong, no leste da China, o departamento estatal cristã decidiu suspender todos os cultos online e punir com o fechamento da igreja quem desobedecesse a ordem. Isso pode ter se repetido pelo país.
Outro tema que voltou a gerar perseguição religiosa é a polêmica sobre o uso das cruzes em templos cristãos. O Partido Comunista Chinês considera ilegal, mas muitas igrejas legalizadas resolveram adotar. A partir de março, alguns templos com cruzes começaram a ser demolidos sem aviso prévio.
Esta semana, entidades cristãs denunciaram o sequestro pelo governo do bispo católico Cui Tai, de 70 anos de idade. Ele continua fiel ao vaticano e se recusa a aceitar a igreja católica do Partido Comunista Chinês.
Reconhecido pela Santa Sé, o bispo Augustine Cui Tai é da diocese de Xuanhua, província de Hebei, a 180 km da capital chinesa, Beijing. Ele havia saído de mais uma longa detenção pelo governo chinês e mandado para casa por alguns dias durante o festival do Ano Novo Lunar. De acordo com os fiéis da paróquia, no último dia 19 ele foi levado a um local desconhecido e não apareceu mais.
Há 27 anos, o bispo é um símbolo da resistência cristã contra a opressão do Partido Comunista Chinês. Por continuar fiel à Santa Sé, já foi submetido a prisão domiciliar, prisão comum e até a campo de trabalhos forçados. Desde 1993, passa longos períodos na punição para “reeducação” e é liberado para alguns feriados em casa.
A situação ficou ainda pior desde 2007, quando as punições foram praticamente ininterruptas. Não há acusações formais de crimes contra o bispo. Fala-se em atividades missionárias ilegais ou em reuniões religiosas ilegais. Nesta última prisão, não há nenhuma acusação formal e nenhuma informação do paradeiro do sacerdote. Durante os últimos anos, ele foi mantido em centros secretos de detenção e às vezes em hotéis com a escolta de oficiais chineses.
A liberdade religiosa é um princípio de vida para o bispo Cui Tai, mas o Partido Comunista Chinês tenta convencê-lo a renegar a Santa Sé e aceitar a liderança da Associação Patriótica Católica Chinesa, o órgão governamental que quer construir uma igreja “cristã” sob o controle do Partido Comunista Chinês. Nos últimos anos, o religioso desenvolveu diversos problemas de saúde, como neurastenia, vertigem e gastrite grave.
Mais uma vez, a Comissão de Justiça e Paz de Hong Kong lança uma campanha denunciando a violação de direitos humanos do bispo Cui Tai e pedindo que ele retorne ao seu lar. Desta vez, os religiosos apontam ainda que a perseguição piorou durante a pandemia de coronavírus.
Madeleine Lacsko
Madeleine Lacsko é jornalista desde a década de 90. Foi Consultora Internacional do Unicef Angola, diretora de comunicação da Change.org, assessora no Supremo Tribunal Federal e do presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alesp. É ativista na defesa dos direitos da criança e da mulher. **Os textos da colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.veja + em Madeleine Lacsko
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