Não existe crise econômica de verdade num país com esse desempenho no seu agronegócio

Agronegócio teve produção recorde no Brasil| Foto: Michel Willian/Gazeta do Povo

O Brasil da política, dos grandes “meios de comunicação” e das classes intelectuais-civilizadas mais uma vez não está prestando atenção, mas isso não muda em nada um elemento crucial das realidades brasileiras. Enquanto esse Brasil da bolha urbana se aflige com “o Queiroz” e prevê só Deus sabe que novas hecatombes para soterrar o país nas próximas horas, o Brasil de verdade, que gira em torno de um eixo separado, está bombando como nunca: acaba de bater, mais uma vez, todos os recordes nacionais na produção agrícola.

Serão 247 milhões de toneladas de grãos, segundo o IBGE – ou mais de 250 milhões, segundo a Conab, do Ministério da Agricultura. A diferença se deve aos critérios que são utilizados para contabilizar a safra brasileira: o IBGE considera a produção durante os doze meses do ano e a Conab segue o calendário da safra , que vai de julho ao mês de junho seguinte. Seja como for, é um número extraordinário.

Essa safra, somada a produção da pecuária, é suficiente para alimentar entre 1 bilhão e 1,5 bilhão de pessoas – cinco ou seis vezes o total da população brasileira, o que dá ao Brasil, como se diz, uma “segurança alimentar” completa e permitirá ao país vender para o resto do mundo, neste ano de 2020, cerca de 205 bilhões de dólares.

Não existe possibilidade de “crise cambial”, essa doença inseparável das economias subdesenvolvidas, com mais de 200 bi de exportação agrícola – só aí haverá um saldo de quase 40 bi que vai direto para as reservas de divisas. Na verdade, de um modo mais amplo, não existe crise econômica de verdade num país com esse desempenho no seu agronegócio.

O coronavírus, que deixa as cidades e as elites governamentais em pânico, não teve efeito nenhum da produção do campo brasileiro. É uma má notícia para o bloco político que no momento joga todas as suas fichas na destruição da economia, do trabalho e dos sistemas produtivos do país – a maneira mais eficaz (ou até a única), segundo se imagina, para substituir esse governo por outro nas eleições de 2020 – ou mesmo antes disso, no submundo dos tribunais de Brasília.

O Brasil não quebra com mais uma safra dessas e os seus bilhões de dólares – dinheiro que não interessa apenas ao Banco Central e à população do interior, mas mantém viva, com empregos, lucro e investimentos, toda a vasta indústria ligada a produção do campo – de alimentos a máquinas agrícolas, de equipamentos a insumos tecnológicos, de defensivos agrícolas a fertilizantes e vacinas, sem contar a área de serviços que cresce a cada ano em função do agronegócio.

Não são apenas o Mato Grosso e o Paraná, os dois maiores produtores do maior produto da pauta brasileira de exportações – a soja – que se reforçam com o sucesso do agro. É todo o Brasil que hoje trabalha para o campo e em função dele. Também não são apenas os produtores de soja que estão ganhando. O Brasil é hoje o maior exportador mundial de açúcar, café, suco de laranja, carnes e frangos – e vem logo em seguida em milho, algodão e outros produtos. É esse o país que conta. É ele que vai segurar o resto.

J.R. Guzzo

J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame. **Os textos do colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.

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