O presidente Jair Bolsonaro, ao que parece cada vez mais, continua decidido a governar dentro de um ambiente de tensão permanente, por achar que o calor da fornalha é o que existe de melhor para ele. Pode pegar fogo? Então vamos lá.
No momento, ele não se mostra satisfeito com as cargas de TNT que rondam o Palácio pelos quatro cantos. Como se já não houvesse dinamite suficiente do lado fora, Bolsonaro faz questão de criar, a cada quinze minutos, focos de tensão dentro do seu próprio governo. Nessa espiral alucinada, acaba de demitir o ministro da Justiça, Sergio Moro — o homem mais popular do governo e do Brasil. A ideia, que vem de longe, andava esquecida com a Covid-19 e, aparentemente, tinha caído em exercício findo. Não tinha.
É coisa de homem-bomba do Exército Islâmico – que vá tudo para o espaço, comigo junto. O presidente, para forçar a saída, demitiu por decreto o diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, ocupante de um cargo que está diretamente subordinado ao Ministério da Justiça — sem dizer o que ele fez de errado, ou dar qualquer motivo razoável. Disse apenas que a exoneração foi a pedido” – o que não foi. Foi, isso sim, um ato de agressão a qualquer proposta de procurar um mínimo de serenidade e equilíbrio para o seu governo. Tomou a opção pelos grupos que querem ir “para o pau”.
A conta é a de sempre: a base de apoio de Bolsonaro, em sua cabeça e segundo rezam os algoritmos das redes sociais, gosta quanto ele diz “aqui quem manda sou eu”, e vai dar-lhe 100% de apoio ao botar no olho da rua um ministro que incomodava parte do entorno presidencial, por um monte de motivos. Era popular demais. “Se achava”. Queria ser independente. Atrapalhava a vida de certas pessoas que detestam a ação permanente de seu Ministério no combate à corrução.
Agora, com o ministro de fora, Bolsonaro e seus estrategistas imaginam que a população vai aplaudir, o “centrão” vai fechar com o governo, por se ver mais longe do camburão da Polícia Federal, e que ele acabará ganhando sabe lá mais que vantagens junto ao mundo político – com o qual está em guerra desde o começo do seu governo.
Para ficar só nos últimos dias, Bolsonaro se viu alvo de acusações indignadas de que estimula um golpe militar, por ter participado de um comício na frente do Quartel General do Exército, em Brasília, na qual faixas e gritos pediam o fechamento do Congresso e do STF. Está sob críticas pesadas, e não só dos inimigos habituais, por causa de suas posições agressivas contra a manutenção da quarentena trazida pelo coronavírus e por ter demitido o ministro da Saúde. O coro pedindo seu “impeachment já” engrossa a cada dia.
Importa cada vez menos, a essa altura, discutir se existem ou não, do ponto de vista técnico e jurídico, os motivos constitucionais para a deposição do presidente da República. O que interessa para os inimigos é insistir todo dia no “impeachment”. Qualquer coisa serve: falta de decoro, defesa da cloroquina, ofensa a mulheres jornalistas, incentivo a mortes em massa com a demissão do ministro da Saúde, apoio ao “golpe militar”.
A isso acaba de se juntar o STF, que mandou o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, explicar a dois advogados porque não aceita as denúncias de impeachment apresentadas por ambos – junto com a exigência de que seja feita uma estranhíssima divisão da autoridade legal do Poder Executivo entre o presidente e o seu vice.
Num momento de angústia nacional, como o que se vive hoje no Brasil, por causa da epidemia, da ruína para a produção e o emprego criada pelo confinamento e de toda a desgraceira que há por aí, imagina-se que o mais recomendável, para um presidente pressionado por inimigos de todos os lados, seria a busca da paz. Ele tem certeza que não é.
J.R. Guzzo
J.R.Guzzo é jornalista. Começou sua carreira como repórter em 1961, na Última Hora de São Paulo, passou cinco anos depois para o Jornal da Tarde e foi um dos integrantes da equipe fundadora da revista Veja, em 1968. Foi correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita pioneira do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Foi diretor de redação de Veja durante quinze anos, a partir de 1976, período em que a circulação da revista passou de 175.000 exemplares semanais para mais de 900.000. Nos últimos anos trabalhou como colunista em Veja e Exame. **Os textos do colunista não expressam, necessariamente, a opinião da Gazeta do Povo.
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