Isolamento aumenta preocupação sobre violência de gênero

Juizado da Mulher recebe 65 pedidos de medidas protetivas, em Fortaleza, durante isolamento social. Um relatório da ONU destacou possíveis impactos a serem enfrentados pelas mulheres durante o período de isolamento

Mais tempo em casa e junto à família. Para algumas mulheres, o isolamento domiciliar também pode significar uma maior propensão a ser vítima da violência doméstica. Do dia 23 deste mês de março até a manhã da última sexta-feira (27), o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) contabilizou, por meio do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Fortaleza, recebimento de 65 pedidos de medidas protetivas de urgência. Devido aos pedidos serem sigilosos, não é possível informar quantos deles foram deferidos pela Justiça.

Até então, quando comparado a outros períodos, sem a existência da quarentena, o Juizado não percebeu aumento ou redução no número de solicitações de medidas protetivas. Para a Justiça, isto “demonstra que o fluxo de demandas continua igual”.

Mesmo sem que os dados demonstrem uma maior exposição, as autoridades estão em alerta para uma possível crescente da violência contra a mulher. Na semana passada, a Organização das Nações Unidas (ONU) elaborou relatório pontuando possíveis impactos para as mulheres durante a crise relacionada à pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

A ONU Mulheres alertou para o risco de aumento da violência contra mulheres e meninas, principalmente na América Latina e no Caribe, devido ao contexto de isolamento necessário para conter o avanço da Covid-19. Conforme o documento da instituição, a tensão dentro de casa aumenta e “as sobreviventes da violência podem enfrentar obstáculos adicionais para fugir de situações violentas ou acessar ordens de proteção que salvam vidas e/ou serviços essenciais devido a fatores como restrições ao movimento em quarentena. O impacto econômico da pandemia pode criar barreiras adicionais para deixar um parceiro violento, além de mais risco à exploração sexual com fins comerciais”.

Atendimento

Como garantir a proteção destas mulheres em meio a uma pandemia? Quem socorre as vítimas maltratadas, na maioria das vezes, pelos próprios companheiros e em frente outros familiares? A Defensoria Pública do Ceará divulgou ter colocado de forma remota a equipe multidisciplinar, com psicóloga e assistente social, à disposição para atender a assistidas pelo Núcleo de Enfrentamento à Violência Contea a Mulher (Nudem).

A defensora pública e supervisora do Nudem, Jeritza Braga, afirma que desde o início da quarentena o Núcleo vem atendendo a algumas assistidas que já tinham demandas anteriores. Em um dia de isolamento, o Núcleo recebeu duas novas demandas de atendimento. A expectativa da defensora é que nas próximas semanas existam mais chamados. “Nesse período de quarentena surgiram também outras demandas. A questão da ansiedade, da síndrome do pânico. Sabemos que com esse isolamento os números da violência tendem a aumentar. Nós tínhamos dados que a violência doméstica ocorria mais no período noturno, quando homem e mulher estavam em casa e se encontravam. Nesse período do isolamento, esse contato é bem maior. Já temos números de outros estados apontando que a violência doméstica cresceu até 50%”, disse Jeritza.

No intuito de evitar que os casos aumentem e intimidar a ação dos agressores, o TJCE garante que o atendimento às vítimas de violência doméstica não para durante o período de quarentena. A continuidade da apreciação e cumprimento destas medidas é determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e, segundo a titular do Juizado de Violência Doméstica Familiar contra a Mulher de Fortaleza, Rosa Mendonça, há preocupação por parte do Judiciário cearense em dar esta continuidade.

“Nós nos preocupamos desde o começo do confinamento e estamos tomando todas as providências para garantir que as mulheres tenham tranquilidade e segurança nesse período, no qual já constata-se aumento das ocorrências de violência contra as mulheres. O programa Ronda Maria da Penha também está em atuação intensiva”, afirmou a magistrada.

De acordo com Rosa Mendonça, foi reforçado o pedido, junto à Delegacia da Mulher, para que os profissionais que atendam às vítimas anotem o número de telefone, e-mail e Whatsapp delas. A ideia é que o Juizado possa fazer intimações por meio destes canais de comunicação. “Os oficiais de Justiça também estão empenhados em cumprir as medidas cautelares que forem determinadas, considerando todas as recomendações estabelecidas tanto pelo CNJ, como Ministério da Saúde”.

A reportagem entrou em contato com a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) buscando informações de quantas ocorrências envolvendo violência doméstica contra a mulher foram registradas no Ceará desde o início da quarentena. Em nota, a Pasta respondeu que os números só poderiam ser disponibilizados após o fim de março “devido à tecnologia de consolidação das bases de dados ser realizada de forma mensal”.

Orientações

Os atendimentos por parte do Juizado e informações sobre processos podem ser consultados na Central de Atendimento Judicial, pelo cajfortaleza@tjce.Jus.Br ou número do WhatsApp (85) 988691236, para atender os casos de urgência. Está disponível o contato da Assessoria da Polícia Comunitária (PMC) no (85) 8902-3372. A Delegacia da Mulher de Fortaleza permanece funcionando 24 horas.

Em quatro dias durante a quarentena, o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Fortaleza recebeu 65 pedidos de medidas protetivas de urgência. As autoridades se preparam para enfrentar o possível aumento nos casos.

Confira matéria do Site Diário do Nordeste

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