Carlos Newton
É certo que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Sérgio Moro mal se suportam. Como o cinismo é forte componente da atividade política, as duas autoridades vivem a trocar elogios em público, mas nos bastidores a realidade é bem diferente.
No começo tudo eram flores. A luta contra a corrupção era o traço que os unia. Mas acontece que nenhum presidente consegue governar sem apoio do Congresso, e assim Bolsnaro teve de ir caindo na real.
BANCADA DA CORRUPÇÃO – Dos 513 integrantes da Câmara, pelo menos 178 respondem na Justiça a processos ou inquéritos. No Senado, 44 parlamentares estão em idêntica situação e representam a maioria absoluta da casa legislativa. Ou seja, mais de um terço dos integrantes do Congresso tem problemas com a Justiça.
O resultado dessa equação política foi que Bolsonaro passou a ter dois papéis. Pela frente, apoiava o pacote anticrime criado por Moro, mas por trás deixava tudo por conta dos parlamentares, sob alegação de que o Congresso é independente e soberano. Ao mesmo tempo, passou a enfraquecer Moro.
O ministro da Justiça foi recebendo esses golpes abaixo da linha de cintura, sem reagir, e conseguiu assimilá-los, porque viu que só teria saída se começasse a fazer o jogo do cinismo político.
GOLPE DO COAF – Para agradar ao Congresso e ao Supremo (leia-se Dias Toffoli e Gilmar Mendes, cujas mulheres estão na lista de sonegadores), Bolsonaro tirou do ministério de Moro o importantíssimo controle do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Moro chegou a esboçar reação, mas logo percebeu que era impossível evitar o golpe.
Depois, veio uma pancada ainda mais forte, com a proibição de prender réus condenados em segunda instância. E para libertar Lula, o presidente do Supremo passou por cima da terceira instância e tornou o Brasil o único país do mundo a prender criminoso somente após julgamento na quarta instância, uma circunstância que remete o país de volta à era medieval.
ALGUNS AVANÇOS – Mas nem tudo corria sempre a contento para a bancada da corrupção, porque Moro conseguiu manter o diretor da Polícia Federal e logo depois o Supremo teve uma crise de sensatez e derrubou aquela estranha liminar do ministro Dias Toffoli, que inviabilizava as investigações de corrupção, lavagem de dinheiro, improbidade administrativa e sonegação fiscal.
Aleluia, irmão! Moro deu uma respirada, mas na sequência houve a armação palaciana para recriar o Ministério da Segurança e enfraquecer o ministro. Foi a gota d’água, e Moro ameaçou sair do governo.
Bolsonaro caiu em si e percebeu que não poderia demiti-lo, caso contrário obrigaria Moro a ser candidato à Presidência em 2022, com boas chances de vitória e roubando preciosos votos do atual chefe do governo.
MORO NO SUPREMO – Hoje, Bolsonaro é refém de Moro e só tem um caminho. Indicá-lo para o Supremo, de modo a afastá-lo da política. Portanto, quem sonhava votar em Moro para presidente já pode tirar o cavalo da chuva, como se dizia antigamente.
Ao que parece, Moro está destinado a mudar o rumo do STF e se tornar o mais importante ministro da História Republicana. Com toda certeza, formará maioria e vai colocar em seu devido lugar os ministros garantistas (Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber), para que o Brasil então volte ter segurança jurídica e institucional.
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Posso estar enganado, é claro, porque Bolsonaro tem um parafuso frouxo e em novembro resolva nomear um ministro terrivelmente evangélico e escantear Moro. Se o fizer, estará rasgando o bilhete premiado e obrigando Moro a ser candidato, para felicidade geral desta nação, que desde o governo de Itamar Franco não sabe o que é ter um presidente de verdade. Então, que assim seja. (C.N.)
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