O mundo relembra neste sábado (9) os 30 anos da Queda do Muro de Berlim, um dos fatos mais importantes do século 20.
9 de novembro de 1989. Há exatos 30 anos, o mundo assistia ao que seria um dos principais eventos do século 20. A queda do Muro de Berlim foi mais do que o fim de uma barreira que separou famílias alemãs por décadas. Foi a fagulha que deu início ao fim da Guerra Fria, mostrando que o regime soviético não tinha mais forças para se sustentar.
Talvez seja difícil para as gerações mais novas imaginar como um muro pode ser capaz de dividir uma cidade do porte de Berlim. No entanto, para quem viveu aquela época, a memória do mundo dividido em duas realidades tão diferentes ainda é bastante viva. E é por essa razão que as imagens dos alemães ocupando o símbolo máximo desse mundo divido são tão fortes até hoje.
Só que o que pouca gente lembra é que a Queda do Muro começa de uma forma muito mais simbólica do que literal. Foi uma frase errada que levou milhares de pessoas para a fronteira ainda fechada entre a Alemanha Ocidental e Oriental, fazendo com que os ânimos já exaltados entrassem em ebulição e dando início a uma série de manifestações. Com a abertura da fronteira, o muro perdeu a sua função e tudo aquilo que ele representava começou a ruir. A partir daí, era questão de tempo para que ele começasse a cair de verdade.
870 Milhões de marcos
é o preço estimado que o governo da Alemanha Oriental precisou desembolsar para construir o Muro na fronteira com a Alemanha Ocidental. O valor seria equivalente a US$500 milhões sem levar em conta a correção monetária.
Uma ilha no mar do comunismo
Ao contrário do que pode levar a crer, não era o Muro de Berlim que dividia as partes comunistas e capitalistas da Alemanha. Na verdade, a capital estava inteiramente dentro do território soviético, o que fazia da Berlim Ocidental uma pequena ilha isolada em um mar vermelho comunista.
Em termos práticos, era basicamente uma fortaleza. O Muro de Berlim não apenas separava as duas metades da capital, mas isolava a parte ocidental do restante da própria Alemanha. Eram 155 quilômetros de muro no entorno de toda a parte capitalista da cidade construídos para evitar que as pessoas tentassem escapar da parte Oriental.
483 mortos
Pesquisa feita pelo museu alemão Charlie Checkpoint concluiu que 483 pessoas morreram ou foram mortas no muro que separava a Berlim Ocidental da Alemanha Oriental comunista. Estimativas oficiais colocam o número de mortos em 136 pessoas. Em fevereiro de 1989, Chris Gueffroy, de 20 anos, foi morto a tiros por um soldado da Alemanha Oriental, que patrulhava a fronteira. Ele foi a última pessoa assassinada quando tentava pular o Muro de Berlim.
Faixa da Morte
Tentar fugir da Alemanha Oriental era um crime e quem tentava fazer isso era tratado como traidor. E quando o Muro foi construído, em 1961, o número de pessoas condenadas por esse crime saltou de cerca de 4 mil pessoas para mais de 18 mil em apenas seis meses.
Para dificultar essa fuga, havia um trecho de 100 metros que separava a Alemanha Oriental da Ocidental — a chamada Faixa da Morte. Era uma área repleta de obstáculos feitos justamente para dificultar a travessia desses desertores. E quem conseguisse chegar a essa faixa podia ser alvejado pelos guardas que protegiam a fronteira ou mesmo explodir ao pisar em uma mina terrestre.
Para tentar driblar essa vigilância mortal, os alemães abusaram da criatividade. Foram diversas tentativas de fuga bastante cinematográficas, seja de gente tentando arrebentar o bloqueio com um caminhão, cavando túnel por baixo da estrutura ou tentando voar sobe ela. Tinha gente que arriscava usar documentos falsos, enquanto outros embarcavam em veículos com fundos falsos para tentar cruzar a fronteira.
Quando as artes tentaram derrubar o Muro
As imagens de milhares de pessoas protestando em frente ao Muro são icônicas, mas a insatisfação dos cidadãos da Alemanha Oriental com a divisão de Berlim era algo que vinha de muito antes. E, nesse sentido, a música, o cinema e até mesmo as artes visuais tiveram papel fundamental na hora de traduzir o sentimento da população.
Antes mesmo da fala de Günter Schabowski, shows de rock realizados no lado comunista da Alemanha plantavam a mensagem de um país sem barreiras e traziam músicas que falavam sobre os ventos da mudança. A mesma mensagem ecoava em filmes e alimentava o imaginário de milhares de pessoas que já estavam cansadas de viver em mundo dividido por um muro.
Sem reformas, o Muro cai
O descontentamento com a divisão de Berlim era algo que já borbulhava na sociedade alemã desde muito antes da queda do Muro, em 9 de novembro. Meses antes da abertura das fronteiras, manifestações eram realizadas no lado oriental da capital pedindo por reformas políticas. Era o primeiro sinal de que o regime soviético estava prestes a entrar em colapso.
Em Moscou, essa necessidade de mudança já havia sido percebida pela cúpula do partido comunista. Desde 1985, o secretário-geral do partido, Mikhail Gorbatchev, tentava emplacar mudanças na estrutura do regime, acabando com a centralização econômica do Estado e flexibilizando algumas políticas para oferecer mais transparências e liberdade.
No entanto, em Berlim, o governo local não estava disposto a fazer essas reformas e bloqueou algumas dessas mudanças, o que elevou os ânimos já exaltados da Alemanha Oriental.
Tanto que, em 4 de novembro — cinco dias antes da declaração de Schabowski —, uma manifestação pedindo por reformas no país reuniu cerca de 500 mil pessoas, sendo que muitas delas já pediam pela reunificação com a Alemanha Ocidental. Era o sinal de que a situação beirava o insustentável.
O Muro caiu, e agora?
O colunista da Gazeta do Povo Filipe Figueredo explica quais foram as consequências, para os alemães e o mundo, desse símbolo da divisão ideológica que ruiu há 30 anos. Figueiredo é graduado em história pela USP, professor de política internacional, roteirista do canal Nerdologia e criador dos podcasts Xadrez Verbal e Fronteiras Invisíveis do Futebol, sobre política internacional e história.
É fácil imaginar que a queda do Muro de Berlim foi um evento fechado em si próprio, de que bastou ele cair para que a reunificação da Alemanha acontecesse. No entanto, o que as aulas de História não falam é que esse processo de reaproximação de um país dividido por 28 anos não foi tão simples assim.
Com realidades tão diferentes por décadas, o contato da Berlim ocidental e oriental gerou grandes impactos socioeconômicos que perduram até hoje.
O que restou
Dos mais de cem quilômetros de Muro que dividiam a capital Berlim, apenas alguns poucos trechos permanecem em pé e se transformaram em pontos turísticos. O mais famoso deles é o chamado East Side Gallery, que se transformou em uma galeria de arte a céu aberto e que reúne uma série de grafites, pinturas e ilustrações feitas por artistas do mundo inteiro.
Outra parte que permaneceu intacta é na Bernauer Straße, onde se encontra o Memorial do Muro de Berlim. Os restos da construção ali mantêm a dinâmica da faixa da morte e conta histórias do que aconteceu ali.
Além disso, é possível encontrar em algumas lojas de souvenires pedaços do Muro à venda. São fragmentos do que restou depois que a estrutura foi derrubada e passaram a ser vendidos para turistas.
Fotos históricas
Expediente
Textos: Durval Ramos. Apresentação e produção de podcast: Márcio Miranda. Apresentação e produção de vídeo: Durval Ramos. Ilustração: Osvalter Urbinati. Infografia: Chantal Wagner. Pesquisa: Jenifer Ribeiro. Diagramação e Web Design: Marcos Jaski.
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