Apoiadores do Governo Bolsonaro destacam os esforços para equilibrar as contas públicas, enquanto críticos expressam preocupação com os efeitos das medidas nos estados e municípios. Aprece ouvirá ministro na próxima sexta
O pacote de propostas elaboradas pela equipe econômica do Governo Bolsonaro para reformar o Estado brasileiro, entregue ontem ao Congresso, gerou reações distintas no meio político. Apoiadores do presidente elogiaram os esforços para equilibrar as contas públicas, enquanto os críticos da administração federal receberam o anúncio com ceticismo.
Como trará impactos para o futuro dos Estados e municípios, o pacote despertou dúvidas no Ceará. Por isso, na próxima sexta, a Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece) deve receber, em Fortaleza, o general Luiz Eduardo Ramos, titular da Secretaria de Governo, que deve detalhar as propostas em uma reunião com 60 prefeitos.
Na avaliação do deputado federal Heitor Freire (PSL), as medidas do Governo são importantes para equilibrar as contas públicas, mesmo “que gere consequências e não agrade a todos”. “É necessário fazer concessões, contingenciamentos, reduzir custos e enxugar a máquina pública. Precisamos ser mais racionais e aceitar que se não houver reformas, o Brasil não avança economicamente”, analisou.
Sobre as mudanças no funcionalismo público, Heitor informou que o setor precisa passar por adequações, devido aos “gastos exorbitantes”. “Precisa ser melhorado, para deixar de oferecer regalias que são incompatíveis com a situação financeira do País”.
Saúde e Educação
Já o deputado federal Idilvan Alencar (PDT) criticou a proposta do Governo de querer unificar pisos de gastos de Saúde e Educação, e revelou que os parlamentares “vão examinar cada medida e propor alternativas”. “Defendemos mais recursos para Estados e municípios, mas de forma alguma abrimos mão de defender a vinculação do teto social que tem que ser mantido, ainda mais pra educação que tem tantos desafios”, ressaltou.
Atualmente, a Constituição determina que estados devem destinar 12% da receita à Saúde e 25% à Educação. O Governo propõe unificar esse porcentual em 37%. Com isso, caberia ao Governo do estado decidir onde alocar mais recursos. Já municípios devem gastar 15% receita com Saúde e 25% da com Educação. O novo porcentual proposto, também único, seria de 40%.
“Defendemos mais recursos para estados e municípios, mas de forma alguma abrimos mão de defender a vinculação do teto social que tem que ser mantido, ainda mais pra educação que tem tantos desafios”, ressaltou.
Houve quem evitasse bater o martelo sobre as propostas, alegando a necessidade de estudar o pacote.
“Temos que analisar a proposta ainda”, informou o deputado José Guimarães (PT). Já o deputado Pedro Bezerra (PTB) informou que “ainda é cedo para se posicionar” e precisa analisar as propostas com cuidado”. Bezerra avaliou ainda que “o Governo demorou muito para preparar a proposta”, com a proximidade do fim do ano.
Extinção de municípios
Já a proposta do Governo de extinguir municípios com menos de 5.000 habitantes que tenham arrecadação própria menor que 10% da receita total foi criticada por entidades que representam os prefeitos.
O presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Glademir Aroldi, afirmou que o Governo se equivoca ao afirmar que os recursos repassados aos municípios como parte da arrecadação de Imposto de Renda e Imposto sobre Produtos Industriais (IPI), por exemplo, não são receitas próprias.
“Transferência obrigatória constitucional não é arrecadação própria? A competência de arrecadação é da União, mas a Constituição diz que parte do recurso é do município. Os municípios produzem, e quem arrecada nas costas deles são os estados e a União”, afirma Aroldi.
Segundo ele, se for computada como arrecadação própria só as receitas com IPTU, ITBI e ISS, praticamente nenhum município com até 5.000 habitantes poderá continuar existindo. “A Constituição deu a competência da arrecadação de imposto urbanos aos municípios, mas a maioria tem pequena área urbana. Os municípios não têm espaço para aumentar a arrecadação desses três tributos. Então vamos fechar todas as propriedades rurais e vai todo mundo viver nas capitais”, diz o presidente da CNM.
Fusão
O presidente da Associação Brasileira dos Municípios (ABM) e prefeito de São Leopoldo (RS), Ary Vanazzi, afirma que a fusão de municípios não deve passar no Congresso. “Essa questão de incorporação de municípios é um bode na sala, isso não se sustenta politicamente nem tecnicamente. Principalmente num ano eleitoral”, afirmou Vanazzi. Ele também criticou outra proposta do pacote, que impede o Tesouro Nacional de atuar como avalista de operações de crédito a estados e municípios. A União só dará, a partir de 2026, garantias a empréstimos contratados junto a organismos internacionais.
Segundo o presidente da ABM, a maioria das prefeituras tem hoje capacidade para aumentar seu endividamento. “Isso vai limitar os municípios de fazer investimento”.
Hoje, o Brasil tem 5.570 cidades. As 1.200 prefeituras possivelmente impactadas no País, portanto, representariam cerca de 21% do total dos municípios. A regra prevê ainda que cada município poderá incorporar até três cidades vizinhas nesse processo. O número de habitantes será medido pelo Censo 2020. Para o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), a PEC representará a refundação dos municípios.
Mudanças no Senado
Senadores de diversos partidos disseram que farão mudanças no pacote Mais Brasil, conjunto de três Propostas de Emenda à Constituição (PECs) de reestruturação do Estado brasileiro entregue pelo presidente, ontem.
Março de 2020
“Se o Governo sair daqui com 50%, 60% do seu pacote aprovado no Congresso até março, já é uma grande vitória para o País”, disse a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS).
Calendário eleitoral
Para o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), o discurso do Governo que ele entende como de demonização do servidor dificulta a situação do pacote. Ele diz ainda que Bolsonaro já não pode mais contar integralmente com o PSL, partido do qual pretende sair, e que o calendário eleitoral inviabiliza o Legislativo em 2020.
Efeito de PECs preocupa prefeitos cearenses
O presidente da Aprece, Nilson Diniz (PDT), afirmou que o pacote de PECs entregues pelo presidente Jair Bolsonaro, ontem, ao Congresso preocupa os prefeitos cearenses quanto ao risco de redução de repasses federais aos municípios.
Segundo Diniz, que também é prefeito de Cedro, a principal proposta que aflige os gestores é a PEC da Emergência Fiscal, por estabelecer gatilhos de contenção dos gastos públicos em caso de crise financeira na União, estados e municípios. Com ela, várias cidades correm risco de receber menos repasses do Governo Federal. “Nós já temos 96% dos municípios cearenses que não conseguem pagar nem 10% das despesas com arrecadação própria. Com menos recursos, como que vai ser possível pagar despesas da Saúde, Educação, Assistência Social, que só aumentam?”, indaga.
Para ele, a PEC traz medidas que desconsideram as obrigações impostas aos gestores municipais, já difíceis de serem cumpridas sem a ajuda do Estado e da União, como destinação de recursos para a Saúde e Educação. “O Governo impõe várias obrigações, Saúde, Educação, municipalização do trânsito, entre outras coisas. Eles lhe colocam uma obrigação, mas não lhe dão as condições necessárias para cumpri-las”, destaca.
Quanto à proposta (que ainda depende do aval do Congresso) de extinguir municípios com menos de 5 mil habitantes e receita própria inferior a 10% dos gastos, a medida pode afetar, no Ceará, dois municípios, conforme dados de população do último censo do IBGE e auditoria do Tribunal de Contas do Estado: Granjeiro (ex-distrito de Caririaçu) e Guaramiranga (Maciço de Baturité).
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