Em Aracati, no Litoral Leste, a preocupação é com as áreas de manguezal. Há uma foz do rio encontrando o mar, se o óleo atingir o mangue a remoção será difícil. Os prejuízos ambientais e econômicos serão incalculáveis
O número de praias do Ceará já atingidas pelo vazamento de petróleo cru subiu para 21 na noite de ontem (24) depois que os resíduos chegaram a mais três áreas do litoral. A contaminação mais recente foi vista na Praia de Parajuru, em Beberibe; Canoa Quebrada e Melancias, em Icapuí, quando moradores confirmaram a presença de manchas de óleo em alto mar.
Na manhã dessa quinta-feira, uma ação emergencial realizada pela Prefeitura de Icapuí, em conjunto com a Marinha do Brasil e auxílio de voluntários, retirou 700 kg da substância do mar e da faixa de areia. Todo o material recolhido foi levado para análise em Fortaleza. A proposta é que os resíduos retirados dos nove estados nordestinos sejam direcionados para indústria do cimento, no Ceará, além da Bahia, Sergipe e Paraíba.
De acordo com a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), cerca de 1.350 litros de óleo já foram encaminhados para uma fábrica de cimento, em Sobral, na região Norte do Estado. A Pasta espera ainda receber mais 1,5 mil litros da substância que foi recolhida pela Prefeitura de Aracati na última quarta-feira (23) para ter a mesma destinação.
O óleo se aproximou do litoral de Aracati ainda no fim da tarde da última terça-feira (22). No dia seguinte, o cenário na orla foi completamente alterado. O guia Aislan da Silva estava fazendo um passeio turístico pela praia de Canoa Quebrada quando identificou pequenos pedaços de óleo. “À medida que fomos avançando, as manchas iam se intensificando. Tive que interromper o roteiro devido a grande quantidade de petróleo na praia. A gente vinha acompanhando as notícias de invasão nas outras praias, mas não esperávamos que fosse atingir Canoa Quebrada”, relata.
Uma força-tarefa foi montada e, em dois dias, todo material foi removido da orla. O tempo de remoção, segundo a superintendente do Instituto de Qualidade do Meio Ambiente de Aracati (Iquama), Mirela Holanda, foi dilatado devido a grande quantidade de óleo. “Entramos em estado de alerta ainda na semana passada quando foram encontrados vestígios se aproximando da costa. Montamos uma operação de monitoramento, mas o óleo só chegou no fim da tarde de terça-feira. Iniciamos então o processo de remoção mas, por conta do horário e da maré alta, tivemos que paralisar as atividades. O material foi colocado o mais distante possível da água e pela manhã (de ontem) mobilizamos novamente a equipe”, detalha Mirela Holanda.
Preocupação
As areias limpas não significam, no entanto, tranquilidade para quem mora e frequenta o litoral de Aracati. Eles temem duas situações. A primeira delas é referente à tábua de marés. De acordo com Edson Santos Pereira, que mora em Canoa Quebrada há 36 anos, “quando a maré secar, pode ser que apareça mais manchas que hoje estão invisíveis”. O processo inverso também é preocupante, segundo o bugueiro Davi Maia Monteiro. “Quando a maré estiver alta, pode ser que ela leve o óleo até o mangue, aí o estrago e prejuízo seriam grandes”, pontuou.
O receio de ambos é justificado pelo impacto que essa substância causaria na área de manguezal. “Temos uma foz do rio que encontra com o mar e, se essa mancha invadir aquele espaço, vai ser muito difícil de remover. O local abriga ostras, caranguejos, enfim, são animais que estariam sentenciados a morte caso o óleo invada seu habitat”, acrescenta Davi, ao recordar que muitas famílias dependem da malacocultura e piscicultura em Aracati. “Todas essas pessoas ficariam sem fonte de renda, sem contar com os prejuízos ambientais”, pondera o guia turístico Geison Vieira.
O mesmo sentimento de preocupação é vivenciado pelos moradores de Icapuí. Próximo à Praia de Requenguela, que não foi atingida pelo óleo, está situado o mangue de onde dezenas de famílias tiram o sustento. “Rezar a Deus para não chegar até aqui”, torce a autônoma Maria das Graças Oliveira. “É daqui que sai, com muito suor, nosso dinheiro. Se essa mancha preta invadir o mangue, tudo morre”.
Para tentar evitar que esse resíduo, que ainda não teve sua origem descoberta pelas autoridades brasileiras, chegue ao mangue ou a outras praias do litoral leste do Estado, voluntários estão fazendo o monitoramento da orla quase que em tempo integral. O bugueiro Olavo da Rocha Granjeiro conta que a categoria se uniu para, ao longo do dia, percorrer a faixa de areia do litoral “em busca de sinais da aproximação do óleo”.
O objetivo, segundo ele, é evitar que esse resíduo chegue à orla. “A gente faz o percurso até Retiro Grande, que é a primeira praia de Icapuí, são cerca de 35km. Se avistarmos algum sinal, já comunicamos as autoridades para fazer a contenção do óleo e a limpeza”, explicou.
Mais locais afetados
Foi esse trabalho de união entre voluntários e os órgãos públicos que possibilitou a limpeza imediata da Praia de Melancias, a sexta atingida em Icapuí. A mancha foi detectada por volta das 10 horas de ontem e, poucas horas depois, os resíduos da faixa de areia já haviam sido retirados por oficiais da Marinha e membros do Comitê de Emergências para a Limpeza das Praias.
Conforme o último balanço do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), 200 locais em 78 municípios de nove estados (Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe) já foram atingidos com os resíduos.
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