Acordos têm de ser cumpridos

Acordos têm de ser cumpridos

Ao descumprir as obrigações assumidas por força de seu ingresso no RRF, o Rio de Janeiro expõe sua população a risco mais uma vez e zomba dos contribuintes brasileiros

Há dois anos, no exercício interino da Presidência da República – o então presidente Michel Temer estava em missão oficial na China -, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chorou ao assinar o acordo de recuperação fiscal celebrado entre a União e o Rio de Janeiro. Pareceu o choro sincero de alguém que assistia à concretização de um árduo trabalho, ao qual havia se dedicado com notável afinco. A debacle econômica do Estado impunha severas consequências à população e era compreensível o alívio pela assinatura daquele acordo.

Se houve muitos estudos e negociações até o momento da inclusão do Rio de Janeiro no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), o que envolveu o trabalho de técnicos, servidores e agentes políticos dos mais variados escalões, a bem da verdade não se pode dizer que houve a mesma disciplina e empenho por parte do governo do Estado para honrar os compromissos firmados em 2017.

No início de setembro, o Conselho de Supervisão do RRF notificou o Palácio Guanabara de que o Estado não está cumprindo as suas obrigações e tem até o dia 3 de outubro para apresentar uma solução. Caso contrário, o colegiado recomendará ao Ministério da Economia a exclusão do Rio de Janeiro do RRF. Se a recomendação for acatada, o Estado terá de pagar em seguida sua dívida de R$ 32,5 bilhões com a União.

O RRF, aprovado pela Lei Complementar (LC) 159/2017, é generoso nas concessões aos entes interessados em aderir ao plano de recuperação. Autoriza a suspensão da dívida com o Tesouro Nacional por até 36 meses e estabelece condições de pagamento facilitadas.

No entanto, à generosidade da União correspondem compromissos que precisam ser aceitos pelo devedor e, obviamente, cumpridos. Entre eles, a estrita observância às vedações para concessão de reajustes a servidores públicos civis e militares, além da revisão anual assegurada pela Constituição, criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa, realização de concursos públicos e criação ou majoração de auxílios, vantagens e bônus.

O Rio, segundo o Conselho de Supervisão do RRF, não conseguiu explicar uma reestruturação da carreira dos servidores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), que teria implicado aumento das despesas, o que é proibido pelo acordo de recuperação.

O Estado também não foi capaz de esclarecer uma inscrição, feita entre 2017 e 2018, de R$ 19,3 bilhões nos chamados restos a pagar, dívidas que passam de um ano parao outro. O acordo proíbe a prática. Além disso, o conselho alega dificuldades em receber informações sobre a privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), uma das principais condições para a assinatura do acordo de recuperação há dois anos.

“As informações (sobre a Cedae) são enviadas com constantes atrasos e quase sempre de forma parcial”, diz a notificação emitida pelo Conselho de Supervisão do RRF. O que se depreende é que os membros do colegiado se sentem ludibriados.

A Secretaria da Fazenda do Estado do Rio de Janeiro informou ao Estadão/Broadcast “estar ciente das observações realizadas pelo Conselho” e garantiu que “todos os questionamentos serão respondidos” no prazo estipulado. É preciso mais do que isso. É preciso que o acordo seja respeitado – só isso.

Deveria ser desnecessário dizer, mas acordos dignos do nome são cumpridos por todos os seus signatários. É esse compromisso que traz estabilidade para as relações entre cidadãos, entre estes e o Estado e entre nações.

Ao descumprir as obrigações assumidas por força de seu ingresso no RRF, o Rio de Janeiro expõe sua população a risco mais uma vez – na medida em que age para acelerar a deterioração de suas finanças e, consequentemente, a oferta de serviços públicos – e zomba dos contribuintes brasileiros, que têm bancado a irresponsabilidade fiscal de sucessivos governos fluminenses.

Confira matéria do site Estadão.

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