O governo federal batalha para fechar o ano sem aumentar o buraco de suas contas. A ideia é catar dinheiro onde for possível, mas está difícil
Sem dinheiro para o essencial e economizando até em serviços de pronto-socorro, o governo federal batalha para fechar o ano sem aumentar o buraco de suas contas. A ideia é catar dinheiro onde for possível para evitar uma paralisia maior da administração. Mas está difícil. O próprio Ministério da Economia corta a luz às 18 horas e quem não concluiu seu trabalho, que o faça à luz de lanternas. O novo lance do ministro da Economia, Paulo Guedes, é conseguir R$ 13 bilhões da Caixa e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em poucas semanas, como antecipação de dividendos. Com isso, calcula-se, o Tesouro poderá soltar alguns trocados para manter a máquina em funcionamento. Sem receita extra, será preciso pedir ao Congresso a alteração da meta fiscal: não haverá como respeitar o limite de R$ 139 bilhões para o déficit primário de 2019. Esse déficit é calculado sem a conta dos juros vencidos.
Zerar o déficit primário no primeiro ano de governo foi uma das promessas do economista Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, durante a campanha eleitoral do candidato Jair Bolsonaro. A promessa ainda foi repetida nos primeiros dias de governo. Dificilmente uma pessoa informada levaria a sério essa ideia, uma evidente bravata. No mercado, economistas do setor financeiro e das principais consultorias nunca deixaram de projetar déficit primário neste ano e mesmo em anos seguintes.
No começo de julho, num balanço aparentemente realista, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, apresentou uma previsão muito mais modesta que qualquer promessa de campanha. Mesmo com “tudo dando certo”, o superávit primário só deverá ocorrer de novo em 2023. Se essa estimativa se confirmar, o atual mandato presidencial será encerrado com as contas primárias ainda em vermelho.
Dar “tudo certo” inclui, obviamente, aprovação da reforma da Previdência em 2019 e algum avanço adicional no programa de ajustes e reformas. Sem se aprofundar nesses detalhes, o secretário do Tesouro adiantou: “Mesmo com a reforma da Previdência e com o ajuste fiscal, não teremos espaço para investimento público ou para reduzir a carga tributária em três ou quatro anos”.
Na primeira semana de julho as perspectivas já eram bem piores do que no começo do ano, quando o presidente e sua equipe ocuparam seus postos. O quadro continua muito feio, apesar de alguns sinais, ainda fracos, de reação dos negócios. Com a economia muito fraca, a receita ficou longe do volume previsto na programação financeira. Algum avanço na arrecadação tem ocorrido, mas decorre principalmente de fatores fora da rotina.
O governo continua apostando em eventos excepcionais, como receitas de licitações e de privatizações para reforçar suas finanças. Se houve algum ajuste, foi muito limitado. A maior parte da contenção de gastos foi emergencial. No primeiro semestre os gastos – incluídos custeio e investimentos – foram 23,6% menores que em igual período de 2018. Até despesas de manutenção de unidades de saúde e de serviços de atendimento do Samu foram podadas. Nos últimos dias o presidente falou de falta de recursos até para combate a incêndios na Amazônia.
Uma economia mais viva teria reduzido o aperto. Mas o governo desprezou, até há pouco, a ideia de estímulos de curto prazo. Esses estímulos são, de fato, insuficientes para um crescimento maior e sustentável. Mas isso de nenhum modo justifica a inércia quando há 13 milhões de desempregados e se projeta crescimento econômico próximo de 1% pelo terceiro ano ou até menor.
O governo parece ter descoberto seu erro. Se tivesse agido bem antes, a travessia de 2019 seria muito menos penosa. Seria mais fácil atingir um déficit primário menor e, como consequência, controlar um pouco mais a expansão da enorme e muito custosa dívida pública.
A aprovação da reforma da Previdência, muito importante, será provavelmente o único avanço no rumo do ajuste, neste ano. O resto é só esforço para fechar as contas sem superar R$ 139 bilhões de déficit primário. O governo deve ter descoberto o irrealismo da promessa inicial de zerar o déficit primário. Mas foi irrealista em todo o resto, com enorme custo para quem depende de emprego para comprar comida.
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