Plano do MEC para financiamento privado de universidades prevê aporte de R$ 102,6 bi

O ministro da Educação, Abraham Weintraub Foto: Gabriel Jabur/MEC (18/6/2019)

Principal aposta do Future-se é a formação de um fundo com o patrimônio da União, incentivos fiscais e até investimento imobiliário

BRASÍLIA e SÃO PAULO – O Ministério da Educação (MEC) anunciou nesta quarta-feira, 17, um plano que prevê aporte de R$ 102,6 bilhões para as universidades federais, usando por exemplo bens imobiliários, incentivos fiscais e recursos de cultura, como os da Lei Rouanet. O programa, batizado de Future-se, amplia a participação de verbas privadas no orçamento universitário.

O programa prevê a formação de um “fundo soberano do conhecimento” – ou seja, o capital privado, além do investimento direto em cada instituição (o que hoje já ocorre), poderá entrar nesse fundo e ser redistribuído às universidades.

O ministro Abraham Weintraub resumiu que a proposta prevê quatro formas de obtenção de recursos: “patrocínio, patrocinador, aluguel e parceria”. Ele também disse que o programa é “prêt-à-porter”, ou seja, não será adaptado para as especificidades de cada universidade. “Não vamos fazer para cada uma delas, é preciso entrar no padrão”, disse.

O fundo será constituído por várias frentes, a maior delas envolve o patrimônio da União – o MEC avalia ter R$ 50 bilhões de bens em imóveis e lotes ociosos que podem ser vendidos ou concedidos à iniciativa privada. Outras frentes são fundos constitucionais, leis de incentivos fiscais, recursos de cultura (como a Lei Rouanet), participação de Organizações Sociais na gestão de parte dos gastos e o aumento da captação de recursos do setor privado para financiar projetos —como o uso econômico do espaço público.

O recurso para o programa virá de quatro fontes, segundo o MEC. Com um modelo baseado em uma série de dispositivos do mercado financeiro, a “carteira de ações” para o plano R$ 33 bilhões de fundos constitucionais, R$ 17,7 bilhões de leis de incentivos fiscais e depósitos à vista, R$ 1,2 bilhão de recursos da cultura, R$ 700 milhões da utilização do espaço público, além dos R$ 50 bilhões do fundo de patrimônio imobiliário (a União concedeu lotes e imóveis ao ministério para que sejam cedidos à iniciativa privada e o recurso adquirido, convertido ao fundo).

O programa foi apresentado nesta manhã pelo secretário de Educação Superior, Arnaldo Barbosa de Lima Junior, e por Weintraub. O anúncio ocorre em meio ao contingenciamento de verbas das universidades federais, que começam a ter dificuldades para pagar até mesmo contas básicas, como de luz.

Com um vídeo com efeitos especiais e uma apresentação com uma linguagem muito próxima do mercado financeiro, Lima Junior falou por cerca de uma hora sobre o projeto que ele considera inédito. “As pessoas vão falar que é privatização, completamente errado”, disse no início de sua fala.

“As universidades continuam sendo do povo, pública não estamos privatizando nem dando para os professores”, disse Weintraub. Outra medida anunciada é a criação de um ranking com indicadores de desempenho para avaliar quais universidades foram mais eficientes na gestão dos gastos. O ministério não explicou ou apresentou dados de como será feita essa avaliação.

Protesto
Antes, no entanto, Lima Junior e Weitraunb foram interrompidos pelo presidente nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, que estava na plateia. “Quero saber onde está o dinheiro das universidades, ministro?”, perguntou ele do alto das cadeiras do auditório. Ao final de sua fala, Montalvão foi convidado a se sentar nas primeiras fileiras da sala para acompanhar a apresentação.

Do lado de fora de onde ocorria a apresentação, um grupo de estudantes manifestava contra os cortes nas universidades.

Consulta
O governo destacou que, antes da implementação do programa, a proposta passará por consulta pública por um mês. “O MEC não vai impor nada”, diz nota enviada pelo ministério. A adesão das universidades também será voluntária, já que elas continuarão a ter um orçamento anual, definido pela União. Conforme o Estado antecipou nesta quarta, não há previsão de cobrança de mensalidades.

Apesar do tempo para a consulta, o ministro afirmou que tem pressa na aprovação do programa. “Existe urgência para se fazer isso o mais rápido possível, tem todo contexto. Estamos conversando com a Casa Civil para entrar em vigor esse ano, muitas ações já têm autorização legal”, diz o MEC.

Com o programa, o MEC pretende que as universidades passem a celebrar contratos com empresas para a gestão compartilhada do patrimônio imobiliário da universidade (comodato ou cessão dos imóveis serão liberados), criar fundos patrimoniais (com doação de empresas ou ex-alunos) e ceder os “naming rights” de seus campus ou edifício (como ocorre, por exemplo, em estádios de futebol ou cinemas).

Experiência
A maior parte das universidades federais já tem ações como as que o MEC diz pretender estimular. No entanto, desde a Lei do Teto de Gastos, elas não podem fazer o uso integral dos recursos que arrecadam por conta própria, já que qualquer “excesso” de arrecadação deve ser usado para abater a dívida pública e a universidade não fica com a verba.

No ano passado, por exemplo, a Universidade de Brasília (Unb) foi a que teve o maior valor de arrecadação própria bloqueado. A instituição tinha R$ 98 milhões poupados nos últimos dez anos com recursos próprios, a maior parte de aluguel de imóveis.

A verba era poupada para que a universidade construísse um prédio e investisse em infraestrutura (troca de computadores, renovação dos livros da biblioteca, etc). No entanto, o recurso foi congelado e só parte dele – R$ 65 milhões -, liberado em 2018. E a União descontou esse valor do repasse anual previsto. Ou seja, o dinheiro da arrecadação própria teve de ser usado para o pagamento de servidores e não para os investimentos aguardados por anos pela instituição.

O ministro explicou que pretende alterar a lei que hoje trava esse recurso de arrecadação própria. A ideia é enviar o projeto para o Congresso até o fim de agosto. Entre outras leis que precisam ser alteradas, estão a lei de fundos constitucionais e de incentivos fiscais.

Confira matéria do site Estadão.

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