Entre 2017 e 2018, o Estado teve a segunda maior redução na cobertura da modalidade em todo o Brasil. Especialistas atribuem o fato à descontinuidade nos investimentos de programas de fomento das unidades de ensino do tipo
Entendida como uma modalidade que permite avanços expressivos, a educação em tempo integral apresentou, no Ceará, a segunda maior redução de cobertura do Brasil, entre 2017 e 2018. Ao todo, 1.138 escolas públicas da Educação Básica deixaram de ter, pelo menos, uma matrícula em tempo integral, conforme dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica, elaborado pelo Movimento Todos Pela Educação, com base nos microdados do Censo Escolar realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
São consideradas não apenas as Escolas Regulares de Tempo Integral (ETIs), mas todos os equipamentos e ações que ofertam atividades numa jornada igual ou superior a 7 horas diárias. Há dois anos, 3.527 estabelecimentos de ensino – o correspondente a 56,6% das escolas cearenses – ofertavam matrículas em tempo integral. Naquele ano, o Ceará estava, proporcionalmente, na liderança do País. Já em 2018, o número decresceu para 2.389, correspondente a 39,3% das escolas. A queda entre um ano e outro foi de 17,3%, inferior apenas à ocorrida em Pernambuco, que teve 18,5% de recuo. As mudanças, porém, não são exclusividade do Ceará. Todos os estados e o Distrito Federal foram afetados pelo fenômeno, impulsionado pelas variações do Ensino Fundamental, cuja responsabilidade é dos municípios. Em todo o Ceará, as matrículas nos anos iniciais desta etapa caíram de quase 203 mil para cerca de 113 mil – diminuição de 44%. Já nos anos finais, passaram de quase 150 mil para 98,7 mil, queda de 34%.
Na análise de Thaiane Pereira, coordenadora de Projetos do Todos Pela Educação, a retração da modalidade de ensino tem a ver com a descontinuidade de investimentos no programa Mais Educação, ocorrida no ano passado. A iniciativa propunha atividades no contraturno, como reforço em Língua Portuguesa e Matemática, ou outras ações de cultura e jogos.
“Fica claro que a escola de tempo integral depende bastante do fomento para a manutenção das atividades. Ela demanda mais recursos do que a escola em tempo parcial porque precisa de mais professores, mais merenda, mais material. Os números vão de acordo com o estímulo dos programas”, observa, ressaltando que a modalidade não significa apenas mais tempo na escola, mas o desenvolvimento dos alunos “em conteúdo e para a vida em sociedade”.
No Ceará, o recuo foi impulsionado pela redução da oferta do tempo integral no Ensino Fundamental em escolas do interior do Estado, fato confirmado pela análise das matrículas do Censo Escolar. Conforme levantamento do Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares, 137 municípios cearenses diminuíram a oferta – 40 deles chegaram a zerar matrículas. Outros 10 municípios não ofertaram a modalidade nem em 2017 e nem em 2018.
Marco Aurélio de Patrício, doutor em Educação e especialista em Gestão Escolar, reitera que o problema do tempo integral “é que ele é caro”, mas lembra que o Plano Nacional de Educação (PNE) de 2014 previa o aumento gradativo dos investimentos em educação até chegar a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do País, em 2024. No entanto, o setor sofre cortes de verbas, e o PIB oscila para baixo, desde o ano passado.
“As escolas de tempo integral são excelentes, mas não estão abrindo novas escolas. A verba não vai dar ou nem chega mais. Na hora que falta dinheiro, diminui o investimento. Muitas escolas voltam para o tempo regular, que é mais econômico”, avalia.
Tanto Thaiane quanto Marco Aurélio lamentam o fenômeno e defendem a ampliação dos recursos financeiros para a manutenção do modelo. “A questão é menos pedagógica e muito mais administrativa e de vontade política”, frisa o professor. Já a coordenadora explica que “esse retrocesso liga um sinal de alerta para uma política que tem evidências de que dá certo e de que precisa ter continuidade. Normalmente, essas escolas têm resultados melhores não só na questão da aprendizagem, mas na redução da evasão”, diz.
Contramão
Por outro lado, 37 cidades cearenses apresentaram aumento de vagas, incluindo a rede municipal de ensino de Fortaleza. O total de matrículas em Escolas de Tempo Integral (ETIs), da Capital, teve crescimento de 20,2%, passando de 56.065, em 2017, para 67.417, em 2018, o que representou acréscimo de mais de 11 mil estudantes.
Iguatu é outro município que registrou aumento no número de alunos em tempo integral no Ensino Fundamental. “Houve uma campanha bem-sucedida de matrículas em 2017, que resultou no crescimento do número de alunos”, observou a técnica da Secretaria de Educação do Município, Daniele Araújo.
A ampliação da oferta tem ocorrido com maior foco nas unidades de educação infantil. “Proporcionamos aos pais a possibilidade de trabalharem sem preocupação”, pontuou. Na Escola Clara Alves, Maria Luíza Gomes é uma das alunas atendidas em sala de tempo integral. “É bem melhor porque a gente passa o dia estudando e tem reforço”. Outra exceção é a rede educacional do Estado, responsável pelo oferta no Ensino Médio. As matrículas passaram de 62 mil para mais de 75 mil, no mesmo intervalo. Atualmente, 89 mil alunos são alcançados, segundo a Secretaria Estadual da Educação (Seduc), num parque composto por 252 escolas de tempo integral: são 130 regulares, em 50 municípios, e 122 de Educação Profissional, em 98 cidades. A Pasta reforça que “cabe aos municípios a implantação do tempo integral nas suas respectivas escolas”, embora realize o acompanhamento das unidades, a formação de professores e a elaboração e a utilização de material didático do Programa Aprendizagem na Idade Certa (Mais Paic).
“Essa medida tem como finalidade ampliar o trabalho de cooperação já existente com os 184 municípios”, atendendo estudantes da Educação Infantil ao 9º ano do Ensino Fundamental.
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