Guedes quer ajustar relatório da reforma

Ministro da Economia Paulo Guedes, que passou a concordar com a retirada das mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC)

Equipe do ministro vê ‘pegadinha’ em cálculo; relator Samuel Moreira diz que está aberto ao diálogo, mas que não vai abandonar seu relatório

A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, vai buscar negociar ajustes no relatório da reforma da Previdência com o relator da proposta, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP). O relator e o secretário Especial de Previdência, Rogerio Marinho, já conversaram informalmente neste fim de semana, depois das duras críticas ao parecer feitas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

Ao Estado, Samuel disse ontem que está aberto ao diálogo. “Meu relatório está sujeito a mudanças. Não é um decreto. Preciso proteger o relatório e não vou abandoná-lo. Mas vou para o diálogo novamente”, disse. Nesta segunda-feira, o relator se reúne com sua equipe para fazer um balanço.

Segundo apurou o Estado, Marinho se reuniu ontem com técnicos para uma análise dos pontos que poderão sofrer ajustes. A preocupação agora, de acordo com uma fonte, é evitar um desgaste maior.

Guedes passou a concordar com a retirada das mudanças do BPC, benefício pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, depois que percebeu a importância dessa assistência nas regiões mais pobres do País. Ele foi contra a exclusão das regras que abrangiam Estados e municípios – pois muitos estão quebrados e é “lá onde o povo vive” – e às mudanças nas regras para servidores, que possibilitam antecipar os privilégios de se aposentar com o último salário da carreira aos servidores mais antigos.

O que desagradou à equipe econômica e pegou os técnicos de surpresa foram outros pontos que, mesmo fora da mira dos partidos que compõem o Centrão (hoje os principais fiadores na negociação pela aprovação da reforma), foram alterados na versão do texto apresentada na última quinta-feira.

Embora a criação de um regime capitalizado, segundo o qual os novos trabalhadores contribuiriam para contas individuais e poupariam para suas aposentadorias futuras, fosse uma das principais bandeiras de Guedes, a sinalização de Maia de que a discussão poderia ficar para o segundo semestre já havia dado o tom do desfecho para esse ponto.

Mas o parecer inseriu uma “pegadinha” na regra de cálculo que pode comprometer boa parte – se não integralmente – da economia obtida com a reforma da Previdência, na visão da área econômica. O texto prevê a possibilidade de excluir da base de cálculo do benefício os salários que resultarem em prejuízo ao valor da aposentadoria. Na visão da área econômica, esse trecho abre um ralo sem precedentes para os recursos da Previdência.

A equipe de Moreira argumenta que essa mudança terá pouco impacto porque, ao excluir um ano de baixos salários da base de cálculo, o segurado também perderá o direito a contar com esse tempo para o cálculo do benefício. Por exemplo: se um segurado contribuiu por 40 anos mas quer que os 10 primeiros anos não contem para o cálculo do benefício porque teve nesse período salários mais baixos, ficaria com 80% da média da remunerações obtidas nos 30 anos. Ou seja: os 20% seriam descartados porque corresponderiam aos 10 primeiros anos.

Brechas
Na visão do governo, porém, a redação deixa brechas para uma interpretação mais ampla e, na prática, o beneficiário poderia levar 100% apenas das maiores remunerações. Essa seria uma regra mais danosa às contas públicas do que a forma de cálculo atual, que observa a média das 80% maiores remunerações obtidas ao longo da carreira.

O parecer também retirou o chamado “gatilho” que elevaria a idade mínima de aposentadoria no Brasil periodicamente, à medida que houvesse elevação da expectativa de sobrevida aos 65 anos. Na prática, esse mecanismo diminuiria a necessidade de novas reformas no futuro. Na proposta do governo Temer, o então relator, deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA), manteve o instrumento.

O texto de Moreira também acabou com a previsão, na Constituição, de possibilidade de criação de uma alíquota extraordinária de contribuição previdenciária – que daria o respaldo necessário a governos que precisassem recorrer a esse expediente para reequilibrar as contas. Sem isso, governos estaduais que tentem implementar a medida (como já foi ensaiado pelo Estado do Rio) podem ser facilmente questionados no Supremo Tribunal Federal (STF).

Estados
Embora tenha retirado os Estados e municípios do alcance da mudança de regras para pedir aposentadoria (como idade mínima e transição), Moreira manteve a regra que eleva as alíquotas cobradas atualmente pelos governos regionais a 14%, a partir do momento da aprovação de uma lei local para isso. Por isso, a área econômica não esperava que a previsão da alíquota extraordinária fosse cair.

A área econômica também identificou mudanças na redação feitas pelo governo para tentar diminuir “zonas cinzentas” que usualmente levam à judicialização. O governo pretendia deixar claro qual é o critério para ter direito ao BPC, uma vez que hoje o critério de “miserabilidade” abre margem a interpretações e resulta num índice de quase 30% das concessões por meio da Justiça. Mas a definição mais objetiva desse critério foi retirada da proposta.

Confira matéria do site Estadão.

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