Ex-presidente poderá deixar a prisão em setembro. Petista é alvo de outros sete inquéritos, num dos quais foi condenado
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afastando as principais teses da defesa do petista. No entanto, a Corte, conhecida como a terceira instância do sistema jurídico brasileiro, alterou a dosimetria da pena aplicada a Lula, reduzindo-a para oito anos, 11 meses e 20 dias de prisão.
Preso em Curitiba desde abril do ano passado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP), investigado no âmbito da Operação Lava Jato, o ex-presidente terá cumprido um sexto da sua pena entre setembro e outubro deste ano – condição a partir da qual poderá pedir progressão de regime para semiaberto ou domiciliar, a depender do andamento de outros sete inquéritos nos quais ele é investigado.
Com o julgamento de ontem, a 5ª Turma do STJ reformou entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), cuja decisão, de fevereiro deste ano, havia majorado a sentença recebida por Lula na primeira instância (nove anos e seis meses), assinada pelo ex-juiz Sérgio Moro. Corte de apelação da Lava Jato, o TRF-4 elevou a pena para 12 anos e um mês.
À exceção do ministro Joel Paciornik, que não participou da sessão dessa terça-feira, os demais magistrados acompanharam o relator Felix Fischer, concordando em diminuir o tempo de reclusão de Lula e as multas que lhe haviam sido aplicadas, como a reparação de danos. Antes fixada em R$ 16 milhões, a quantia passou a R$ 2,4 milhões.
Apresentados pela defesa do petista no agravo regimental apreciado ontem, argumentos como o de suspeição de Moro e o da competência da Justiça Eleitoral como esfera natural para tramitação do inquérito não foram acolhidos pelos ministros Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro Dantas, que completam o colegiado. Os advogados de Lula ainda podem recorrer ao pleno do STJ, com embargos de declaração, ou ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A progressão de regime do fechado para o semiaberto ou domiciliar no caso de Lula, todavia, pode se inviabilizar porque o petista, réu em outros dois processos, foi condenado em primeira instância por corrupção e lavagem na apuração que investiga malfeitos relacionados ao sítio de Atibaia (SP).
A pena nesse processo foi a maior aplicada na Lava Jato na instância inicial: 12 anos e 11 meses. A previsão é que o TRF-4 se debruce sobre a apelação no início do segundo semestre. Caso preserve a condenação ou a amplie, os anos de prisão se somam.
DEFESA
Em nota, o advogado de Lula, Cristiano Zanin, afirmou: “Avaliamos que o STJ recorreu a formalidades inaplicáveis ao caso concreto e deixou de fazer um exame efetivo do mérito”
OUTROS INQUÉRITOS
O ex-presidente Lula é alvo de oito inquéritos. Conheça alguns deles
Caso triplex
Lula foi condenado pelo TRF-4 sob acusação de haver recebido propina da construtora OAS pela reforma de um tríplex em Guarujá (SP)
Instituto Lula
Ex-presidente é réu sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Acusação é de que petista recebeu dinheiro da Odebrecht por meio da compra de terreno para a sede do Instituto Lula, em São Paulo
Zelotes
Lula é acusado de lavagem de dinheiro e tráfico de influência por integrar esquema para beneficiar empresas na compra de caças
Sítio de Atibaia
Lula é réu acusado de corrupção e lavagem de dinheiro no caso de reforma financiada por OAS e Odebrecht. Foi condenado pelo TRF-4
Parlamentares pró e contra Lula criticam decisão do STJ
Senador pelo PT, Humberto Costa reconhece que a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve ontem a condenação do ex-presidente Lula e reduziu sua pena, não foi a que o partido desejava.
“Acreditávamos que seria possível anular (o julgamento) e começar um processo inteiramente novo”, disse em conversa com O POVO. O parlamentar afirmou, porém, que o resultado fortalece o movimento pela liberdade do petista.
“O fato de ter havido uma redução da pena mostra que houve vários tipos de abusos (na primeira instância)”, avalia. “Se essa turma do STJ chegou a esse ponto, há reconhecimento de que a pena é excessiva. Esperamos que seja possível anular no STF.”
Deputado federal pelo partido do presidente Jair Bolsonaro, o PSL, Heitor Freire também criticou o entendimento formulado pela 5ª Turma do STJ, mas por razões diversas das de Costa.
“Lamento a redução da pena”, declarou o parlamentar, que fez uma ressalva: “O tribunal confirmou mais uma vez que Lula é um criminoso e que deve continuar pagando pelo mal que fez ao nosso País”.
Membro do Partido Novo e do Instituto Democracia e Ética (IDE), Fred Bezerra também considera que o julgamento dessa terça-feira “reafirma as decisões anteriores (da primeira e segunda instâncias) e a condenação de Lula por corrupção e lavagem”.
De acordo com ele, entretanto, o STJ cedeu às pressões políticas ao atenuar a pena aplicada, reduzindo a sanção para oito anos e 11 meses.
Bezerra aguarda, agora, o desfecho do inquérito que apura o caso do sítio de Atibaia, no qual o petista já foi condenado em primeira instância. “As provas de Atibaia são ainda mais contundentes do triplex”, assegura.
(Henrique Araújo)
“Discurso de perseguição foi rechaçado”, diz pesquisador
Cientista social e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Rodrigo Prando avalia que a decisão dessa terça-feira do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é um golpe na retórica segundo a qual o ex-presidente Lula é perseguido pela Justiça.
“Não houve erro processual ou cerceamento em momento algum. Politicamente, continua aquilo decidido pelo ex-juiz Sérgio Moro e todas as outras instâncias. É um balde de água fria”, defende o pesquisador.
Ainda de acordo com Prando, “a manutenção da condenação mostra que, da primeira instância até agora, o discurso de perseguição e de que Lula não teve possibilidade de defesa foi rechaçado”.
Para ele, o entendimento do tribunal “foi um baque” para o petismo porque, além de confirmar a condenação, o colegiado do STJ não alterou o “mérito de que ele está condenado”.
O professor acrescenta ainda que, embora o resultado possa beneficiar o ex-presidente, que terá cumprido um sexto da pena até o final de setembro e poderá deixar o regime fechado, “não podemos esquecer que tem a condenação em primeira instância do caso do sítio de Atibaia”.
Advogado criminalista e professor de Direito, Waldir Xavier observa que “a 5ª Turma é a mais rigorosa do STJ e, mesmo assim, reconheceu que a dosimetria estava errada e excessiva”.
Xavier complementa: “O STJ adotou até uma postura mais tímida” na redução da pena de Lula. “A Lava Jato se transformou numa pauta maior do que o processo”, prossegue, “e virou uma tendência processual de punitivismo”.
Cientista social e membro do Conselho de Leitores do O POVO, Cleyton Monte acredita que, apesar de favorável a Lula, o desfecho do julgamento no STJ não representa “ganho político considerável para Lula e o PT”. Monte ressalva, no entanto, que a diminuição no tempo de reclusão do ex-presidente evidencia “a fragilidade nos autos do processo do triplex”. (Henrique Araújo)
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